SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Museu da Língua Portuguesa e o Museu de Arte Sacra têm hoje, em comum, um elo para além da localização na Luz, no centro de São Paulo, a dois quarteirões um do outro. Linguagem, palavra e identidade, afinal, são centrais nas suas atuais exposições, seja pensando a transformação da fala, seja retomando o valor do livro como suporte para a informação.
No Museu da Língua Portuguesa, as variações da fala refletem o pertencimento e a preservação das culturas regionais e tudo começa pelo corpo. Na primeira sala da exposição “Fala Falar Falares”, um vídeo de uma máquina de ressonância magnética mostra o aparelho fonador humano em ação.
Língua e palato se movimentam em conjunto para declamar canções brasileiras como “Drão”, de Gilberto Gil, e “A Noite do Meu Bem”, de Dolores Duran.
Materiais como esses, usados como pesquisa na linguística, já haviam sido estudados em relação à língua inglesa, mas nunca ao nosso português. Segundo Caetano Galindo, linguista e curador da mostra, a instalação tenta conscientizar o público da sua própria fala e, assim, também fugir dos preconceitos linguísticos.
No ambiente seguinte, um mapa-múndi interativo mostra o roteiro percorrido por palavras comuns cochilo, chocolate, karaokê, fetiche até chegarem ao Brasil. Muitas vieram à São Paulo pela estação da Luz, porta de entrada de imigrantes durante o século 20.
Uma vez no país, as palavras se transformaram. Ao fim da exposição, telas mostram uma conversa entre 12 pessoas de estados diferentes. Os participantes refletem sobre a relação com os próprios sotaques e compartilham os “xiboletes” de cada região marcas linguísticas que revelam a origem de quem fala.
Fruto de parceria entre Galindo e a cineasta e cenógrafa Daniela Thomas, a exposição propõe a linguagem como uma das mediadoras da identidade brasileira. “A mostra faz parte de um projeto de ajudar os brasileiros em seu longo e lento processo de tomar posse da própria realidade linguística”, afirma Galindo.
Para Thomas, o objetivo está relacionado a liberdade e autonomia. “A língua é constitutiva dos principais aspectos da identidade de alguém, é o que o distingue, o apresenta ao mundo. A língua é sua para usar”, diz. “Se as pessoas estiverem disponíveis para a exposição, elas deverão sair daqui alteradas no sentido de autoentendimento.”
O Museu de Arte Sacra, por sua vez, contribui ao debate pela perspectiva histórica. A partir de manuscritos dos séculos 15 ao 19, a exposição “Livro-Objeto: A Arte da Encadernação a Partir do Acervo do MAS” narra a história do livro tanto como meio de informação, como objeto artístico.
Yasmine Machado, mestre em artes visuais e responsável pela expografia, conta que “Livro-Objeto” em cartaz na sala expositiva do museu dentro da estação Tiradentes, até 8 de junho nasceu de uma pesquisa dentro dos próprios arquivos da instituição.
Ao pôr o público em contato direto com os textos, a mostra propõe uma reflexão sobre a relação humana e a informação em meios físicos. “A organização do livro interfere diretamente no nosso contato com o conhecimento. Hoje, temos acesso à informação, mas não ao livro como objeto”, diz Machado.
Entre os destaques, estão os 21 volumes de sermões do Padre Vieira, que datam do século 17. Um dos primeiros missionários a vir ao Brasil, Vieira defendia a abolição da escravidão indígena por meio de seus discursos religiosos apesar de hoje ser considerado um grande pensador, parte dos textos foram tidos como heresia pela Igreja Católica.
“A escrita foi utilizada no Brasil, por muito tempo, como forma de imposição, de controle social pelo Estado. As culturas dignas de sobreviver eram aquelas que registravam fisicamente sua história”, afirma Machado.
Para ela, essa maneira de documentar as informações está ligada a uma noção ocidental de tempo, que prioriza o registro. “Em outras culturas, como a indígena no Brasil, há uma relação mais próxima com o presente, e por isso, com a cultura oral”, diz.
FALA FALAR FALARES
– Quando Terça a domingo, das 9h às 16h30
– Onde Museu da Língua Portuguesa pça. da Luz, s/nº, São Paulo
– Preço R$ 24, de terça à sexta; grátis aos sábados e domingos
– Link: https://bileto.sympla.com.br/event/90834/
LIVRO-OBJETO: A ARTE DA ENCADERNAÇÃO A PARTIR DO ACERVO DO MUSEU DE ARTE SACRA
– Quando Terça a domingo, das 9h às 17h
– Onde Sala do Museu de Arte Sacra no metrô Tiradentes da Linha 1, Azul av. Tiradentes 551, São Paulo
– Preço Grátis; necessário bilhete de acesso ao metrô