SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) começou nesta segunda-feira (12) a demolir casas desocupadas na favela do Moinho, na região central de São Paulo. Alvo de um processo de reassentamento do estado, o local já teve mais de cem famílias retiradas nas últimas semanas.
A ideia do governo é descaracterizar os imóveis de forma a impedir que eles sejam reocupados.
No início do dia, Polícia Militar e Guarda Civil Metropolitana tentaram escoltar um trator para dentro da favela. A ação gerou protestos de moradores. O equipamento acabou ficando de fora, e o trabalho se restringiu à demolição manual, com martelos, pés de cabra e uma marreta, além do uso de madeiras das próprias construções.
A comunidade fica em um terreno que pertence à União, entre duas linhas de trens metropolitanos, e a gestão estadual alega que o local não reúne condições adequadas para que as pessoas morem.
Oficialmente, a SPU (Secretaria de Patrimônio da União) desautoriza demolições enquanto todos os moradores não estiverem em novas moradias. O governo estadual, por meio da sua Secretaria de Habitação, alega que precisa ao menos descaracterizar os imóveis desocupados por que estão ocorrendo tentativas de invasão dessas casas, atualmente lacradas com tijolos.
Segundo a Secretaria de Habitação, além de evitar reocupações, o “desfazimento” das casas está sendo realizado por questão de segurança. Só pelo fato de estarem em uma favela já torna os imóveis áreas de risco, e a prefeitura tem autonomia para interceder nesses casos. Assim, a subprefeitura da Sé deu a autorização para o serviço, afirma a pasta.
Em nota à Folha de S.Paulo, a prefeitura informou que a subprefeitura prestou apoio com serviços de zeladoria na favela do Moinho. “A autorização para o desfazimento dos imóveis foi concedida em razão dos riscos para moradores e estruturas, uma vez que a comunidade possui um histórico de incêndios, desabamentos e construções irregulares”, completou a nota.
Representante legal da associação de moradores do Moinho, o Escritório Modelo da PUC-SP admite que tentativas pontuais de acesso aos imóveis ocorreram, mas diz que as casas não foram reocupadas. Além disso, o escritório enviou um documento à CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) questionando o uso do trator, que, segundo o escritório, deixou os moradores temerários de que demolições poderiam provocar desmoronamentos em imóveis ainda ocupados.
A CDHU, no entanto, afirmou que o trator não era dela e sim da subprefeitura, que teria sido levado para retirar lixo do lado de fora da comunidade no início da manhã. A proposta, diz a pasta, continua sendo fazer o desmonte das casas de forma manual, o que continuará nos próximos dias.
Um grupo de moradores da favela expulsou os funcionários da CDHU que faziam a demolição dos barracos por volta das 15h desta segunda. Até aquele momento haviam sido destruídos seis barracos com a maior parte da edificação em madeira.
A manifestação aumentou e os moradores chegaram a bloquear os trilhos da linha 7-rubi da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) por volta das 16h10, interrompendo o tráfego de trens no local. A paralisação durou de pouco mais de uma hora.
Junto com as demolições, a retirada das famílias continuou sendo feita. Não houve problemas com o caminhão de mudança , que saiu uma hora depois da expulsão dos funcionários da CDHU. Após a saída do último carreto, os moradores montaram uma barricada na entrada da favela
Os moradores disseram que o governo do estado descumpriu o acordo de só iniciar as demolições depois da retirada das famílias.
O governo alega que quase 90% dos moradores da área aderiram à oferta do estado para deixarem a favela. Ao menos uma parte dessas pessoas, porém, diz ter sido pressionada a aceitar entrar no financiamento e que teme não ter condição de pagar.
Por meio da CDHU, o estado oferece um financiamento subsidiado de até R$ 250 mil para compra de unidades produzidas pelo mercado privado. O adquirente pagará essa carta de crédito em parcelas fixadas em 20% da renda familiar.
Na prática, o valor financiado ficaria abaixo do valor total, sobretudo para as famílias que declaram a renda mínima para entrar no programa, que é de um salário mínimo. Cerca de 30% das famílias do Moinho nem sequer têm renda de um salário mínimo, o que inviabiliza o acesso ao programa da CDHU.
Estado e o Ministério das Cidades do governo Lula (PT) iniciaram diálogo para tentar redesenhar uma proposta que contemple as famílias mais vulneráveis.
Existem outros pontos que emperram a negociação com as famílias, e uma das principais é a falta de imóveis disponíveis na região central.
O estado informou à SPU possuir 788 unidades na área, mas apenas aproximadamente 100 estão prontas. Parte dos novos imóveis levará dois anos para ser entregue.
Nos bastidores, a União avalia que a descaracterização dos imóveis pode ser importante para evitar a reocupação, mas discorda da pressa da gestão Tarcísio em destruir as casas enquanto não há solução para reassentar todas as famílias.
Já o governo estadual diz que outras questões relacionadas à segurança pública, risco à operação dos trens e sanitárias motivam a urgência de remoção da favela.
A União também discute ceder a área para o estado, cujo projeto é fazer da área do Moinho um parque.
A gestão Tarcísio tem um amplo plano de requalificação do bairro Campos Elíseos, cujo Moinho esta na borda, na divisa com o bairro Bom Retiro.
Um concurso de arquitetura aprovou recentemente um projeto para a construção da nova sede administrativa do governo paulista na região. O bairro também tem despertado o interesse do setor imobiliário devido à perspectiva de revitalização.
É também nessa região que está o berço da cracolândia, a cena aberta de consumo de drogas que vem diminuindo em volume, ao mesmo tempo que usuários têm se espalhado por outras áreas do centro e da cidade.