Foto Ibovespa

LUCAS BOMBANA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A expectativa de queda da taxa básica de juros (Selic) prevista para o segundo semestre do ano, que parece se consolidar com a aprovação do arcabouço fiscal na Câmara e o recuo da inflação, deve abrir algumas oportunidades no mercado aos investidores.

Ações de empresas de menor porte mais relacionadas à economia doméstica, títulos prefixados na renda fixa e a moeda brasileira são apontadas por especialistas como candidatas com alto potencial de se destacarem em um cenário de redução dos juros.

Gestora de renda variável da FAR (Fator Administração de Recursos), Isabel Lemos afirma que a queda dos juros reflete a redução das incertezas relacionadas à inflação, mas também sobre o mercado de crédito e em relação à condução da política econômica no país, bem como relativas ao setor bancário global e às políticas de aumento de juros nas economias desenvolvidas.

Segundo a especialista, nesse cenário menos incerto e com juros menores à frente, ações de empresas de consumo, do setor imobiliário e de bens de capital, mais sensíveis à oscilação da Selic e que tiveram um desempenho abaixo da média de mercado ao longo dos últimos meses, tendem a se destacar positivamente.

“São setores que devem começar a apresentar uma melhora dos resultados”, afirma Isabel. “Com as incertezas diminuindo, começamos a ver uma luz no fim do túnel.” A varejista Renner e a fabricante de peças para o setor automotivo Randon são nomes que a gestora enxerga com bons olhos.

Ela acrescenta que ações conhecidas no mercado como “small caps”, com um valor de mercado inferior às maiores empresas da Bolsa, também devem apresentar uma performance destacada na esteira da redução da Selic.

As “small caps” são ações de empresas mais relacionadas com a economia doméstica, e costumam andar mais do que os pares quando a direção dos juros é para baixo, diz Fernando Siqueira, chefe de pesquisa da Guide Investimentos.

“As ‘small caps’ costumam ser ações de empresas de menor porte de consumo e do setor imobiliário, que sentem mais as variações dos juros em comparação com nomes como Vale e Petrobras”, afirma Siqueira.

Segundo cálculos do especialista, em anos nos quais o BC (Banco Central) promoveu cortes na Selic, as “small caps” tiveram valorização média de 44%, em comparação com ganhos de 34% do Ibovespa.

Em maio, até o dia 26, o índice de “small caps” da Bolsa sobe 14%, enquanto o Ibovespa tem alta de 6%. Mesmo com os juros ainda inalterados, apenas a perspectiva de que eles devem começar a cair já tem trazido impacto para os papéis do segmento, afirma Siqueira.

A rede de farmácias Panvel, a imobiliária Direcional, a Oncoclínas, de saúde, e a concessionária EcoRodovias estão entre as “small caps” na carteira recomendada da Guide para o mês de maio.

Werner Roger, sócio-fundador e diretor de investimentos da Trígono Capital, gestora focada em “small caps”, cita Kepler Weber e Mahle Metal Leve entre as principais posições nas carteiras dos fundos.

Ele explica que a primeira é uma das principais empresas de armazenagem de produção agrícola do país e vai se beneficiar da safra recorde prevista para este ano, enquanto a Metal Leve atua na fabricação de componentes para veículos e tende a surfar a política de redução de preços e consequente aumento de venda dos carros promovida pelo governo.

“As ‘small caps’ estão se recuperando rapidamente, e quem está fora do mercado vai perder o rally”, afirma o gestor da Trígono.

Prefixados de médio prazo para garantir retorno acima da Selic

Na renda fixa, Siqueira, da Guide, afirma que, com a perspectiva de queda da Selic, os prefixados se tornam uma opção atraente para compor a carteira.

Ao investir em um papel prefixado hoje, o investidor garante uma rentabilidade elevada na casa dos dois dígitos para os próximos anos, conforme o prazo de vencimento do título, enquanto os pós-fixados, que estiveram entre os preferidos de especialistas nos últimos meses, vão reduzir o retorno de acordo com a trajetória da Selic, explica Siqueira.

“Quando o BC começar a cortar os juros, devemos ter uma migração dos pós-fixados para os prefixados. É uma dinâmica natural que o mercado faz”, diz Rodrigo Jolig, co-CEO e diretor de investimentos da gestora Alphatree Capital.

Gestor de fundos da Empiricus Investimentos, Rodrigo Knudsen diz que os investidores deveriam voltar as atenções para títulos prefixados de médio prazo, com vencimento ao redor de 2026. No Tesouro, os papéis pagavam um juro nominal de 10,98% na sexta-feira (26).

São papéis que oferecem um retorno ainda atraente de dois dígitos e que se encontram em patamar acima do que deve ser a taxa de juros vigente no vencimento do título, diz Knudsen.

Além disso, eles não são tão arriscados como os títulos de mais longo prazo, que vencem depois de 2030 e estão mais sujeitos à volatilidade do mercado a depender da condução da política econômica do governo, afirma o gestor da Empiricus.

Já Marcos Papaterra, sócio e diretor comercial da Tag Investimentos, diz que, mesmo com a queda da Selic, a expectativa do mercado é de que os juros seguirão em patamares altos ainda por um bom tempo -no boletim Focus, a mediana das estimativas dos economistas consultados pelo BC aponta para uma taxa de 12,50% no final deste ano e de 10% em dezembro de 2024.

Por isso, prossegue Papaterra, o investimento em títulos pós-fixados de crédito privado que pagam o CDI mais uma taxa prefixada entre 1,5% e 2% continuam sendo uma boa pedida para os portfólios dos clientes. “Continuamos apostando na renda fixa como um dos grandes cavalos de investimento.”

O sócio da Tag acrescenta que o episódio da Americanas no início do ano, e mais recentemente da Light, denotam a importância de se fazer uma análise bastante minuciosa dos emissores dos títulos e da saúde financeira das empresas.

**REAL DEVE SE BENEFICIAR DE FLUXO ESTRANGEIRO PARA BOLSA COM REDUÇÃO DOS JUROS**

Jolig, da Alphatree, diz ainda que o fortalecimento recente da moeda brasileira frente ao dólar, que vem testando patamares abaixo dos R$ 5, é uma tendência que ele acredita que deve prosseguir com a queda da Selic.

Os juros no patamar atual contribuem para a entrada de investidores estrangeiros atraídos pelo retorno acima da média em comparação com a maior parte dos outros países, afirma o co-CEO da gestora.

E, mesmo com a queda da Selic, o especialista espera que o fluxo de capital internacional continue forte, com os investidores globais entrando para tirar proveito da provável recuperação da Bolsa.

Os analistas do Itaú BBA também esperam que o corte de juros contribua para a entrada do estrangeiro.

“Os investidores internacionais estão mais otimistas do que prevíamos, pela visão de que os preços no mercado brasileiro parecem atraentes em relação a outros mercados emergentes e pela expectativa de que as ações tendem a apresentar um bom desempenho quando houver uma maior visibilidade sobre os cortes de juros”, dizem os analistas do banco em relatório divulgado no dia 25.

Gestor da Neo Investimentos, Mario Schalch acrescenta que, mais do que o fortalecimento do real, o dólar deve passar por um período de enfraquecimento nos próximos meses.

Após ter se beneficiado como reserva de valor em comparação aos principais pares, seja pela guerra na Ucrânia que prejudicou o euro, ou pelo fechamento da economia chinesa que afastou o interesse pela moeda asiática, o dólar deve experimentar agora um novo reequilíbrio, com a retomada da demanda por alternativas à moeda americana, diz Schalch.

O gestor da Neo assinala ainda que, em uma análise histórica, o real segue barato frente ao dólar mesmo com a valorização recente.

No entanto, ele diz que a aposta no real deve ser vista mais como uma estratégia tática de curto prazo neste momento. Isso porque a política econômica adotada pelo governo ainda pode trazer volatilidade para os preços dos ativos domésticos, sem ser possível descartar repiques de alta do dólar. “Qualquer tipo de aposta de melhora do real precisa levar em conta que podemos viver momentos específicos de deterioração no preço do ativo.”