SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Tecelagem de Seda Ítalo-Brasileira tem uma longa e vigorosa história na indústria brasileira. Com antigos prédios localizados no Brás, entre as ruas Joli, Doutor Manoel Vitorino e Sampson, ela representa bem a pujança fabril de São Paulo na região na primeira metade do século passado.

Suas primeiras construções são de 1907, por iniciativa dos empresários Rodolfo Crespi e Nicola Carbone, mas ela só começou a operar de fato em 1911, contando com mão de obra de espanhóis, alemães, ingleses e principalmente italianos. Posteriormente, a fábrica pertenceu à família Guinle.

Na segunda metade dos anos 1930, o complexo industrial, que ocupava várias quadras, foi adquirido pelas IRFM (Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo) e reformas e ampliações foram feitas, como a construção de um segundo pavimento. Na ocasião, a empreitada ficou a cargo do escritório de Ramos de Azevedo, Severo e Villares. A tecelagem incluía um conjunto de três prédios que ainda estão de pé.

Um deles, onde funciona desde 1989 a Dataprev, empresa que processa e gerencia os dados do INSS, começará a ser recuperado neste ano para restaurar suas feições originais. O segundo é ocupado por várias lojas de tecidos e roupas. E o terceiro, ao lado do Castelinho, que foi sede do grupo Matarazzo, ainda pertence ao espólio do conglomerado e está totalmente abandonado.

A Dataprev é mais um imóvel que passou pelas mãos da família Matarazzo que será recuperado. Outros exemplos são a Casa das Caldeiras, que fez parte do complexo Matarazzo na Água Branca, o edifício Francisco Matarazzo, atual sede da prefeitura, a Maternidade Condessa Filomena Matarazzo, que se transformou no hotel Rosewood –parte da badalada Cidade Matarazzo– e a Tecelagem Mariângela, também no Brás, que hoje abriga um espaço comercial.

Rigorosamente é um restauro, nós temos a volumetria externa preservada e vamos recuperar diversos elementos, como todos os planos de fachada”, diz Samuel Kruchin, dono do escritório. “Também vamos trabalhar no espaço interno valorizando a configuração existente da parte antiga. Na parte nova vamos fazer uma construção que se alinhe com a estrutura original.”

Um terço do prédio foi descaracterizado nos anos 1970, quando abrigou um supermercado. Posteriormente ficou em ruínas e hoje é um galpão de cerca de 3.000 metros quadrados contíguo à área da antiga fábrica, mas que nada tem a ver com ela. Um dos trabalhos da Kruchin será harmonizar as duas edificações.

A construção a ser restaurada, que ocupa uma área de 6.150 metros quadrados, produzia no passado fitas e passamanarias, arte decorativa usada para fabricar detalhes têxteis elegantes em cortinas, roupas e outros acessórios de seda. A produção do tecido no Brasil, atualmente concentrada no Paraná, é muito menor do que no passado e está em declínio. Mas se destaca pela qualidade, identificada na brancura e no comprimento dos fios. A seda brasileira já foi considerada a melhor do mundo, superando a chinesa.

O prédio da Dataprev foi tombado pelo Condephaat (conselho estadual de patrimônio) em 2018 por sua importância na industrialização da cidade e por ser uma das raras fábricas paulistas de seda. A construção está integrada à malha urbana, sendo que suas vias internas se transformaram em ruas do Brás.

Quando foi construída, o bairro era uma região periférica e pouco adensada. Ao longo do tempo, porém, centenas de fábricas se acomodaram na região e surgiram muitas residências operárias. O levantamento feito pela Kruchin mostra como o Brás cresceu e destaca a importância da Tecelagem de Seda como referência urbanística.

“A intenção da Dataprev é fazer uma coisa que seja uma referência no Brás”, diz Kruchin. “Eles têm como meta fazer com que a imagem do edifício corresponda a um bem arquitetônico contemporâneo que possa reverberar em todo o bairro.”

Segundo o arquiteto, a parte interna do prédio, onde funciona uma central de dados com inúmeros servidores, será redesenhada, ganhando, por exemplo, áreas de convivência, seguindo um conceito mais contemporâneo de espaço de trabalho. Também se pretende recuperar o pé direito original.

Quanto à fachada, que está em condições razoáveis, ele diz que o restauro envolverá a retirada de camadas de pintura e a eliminação de fissuras e outras patologias, respeitando o tombamento.

O resultado da licitação na qual a Kuchin foi vitoriosa saiu no início deste ano. O prazo para a conclusão do projeto é de dez meses. Toda a obra será executada com a Dataprev em funcionamento.