BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Líderes de partidos de centro e de esquerda querem evitar uma nova crise com o STF (Supremo Tribunal Federal) por manobra da Câmara a favor do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) que poderia beneficiar Jair Bolsonaro (PL).

O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse em entrevista ao jornal Valor Econômico nesta sexta-feira (9) que esperava que o STF mantivesse a decisão da Câmara -o que, horas depois, não se confirmou com a maioria formada na corte para derrubá-la.

Apesar disso, lideranças dizem, reservadamente, que não veem espaço para uma resposta sem que pareça como um novo capítulo de crise entre os Poderes. Avaliam ainda que é suficiente trancar parte da ação penal resguardando apenas Ramagem.

O tom ainda é de cautela. Um líder do centrão disse que, se Motta for sensato, vai evitar a escalada da crise. Mas da forma como conduziu até aqui, dá brecha para ser amplamente cobrado pela oposição.

A aprovação do relatório foi vista como um gesto de Motta para a oposição, que amargou derrota com o engavetamento do projeto de lei que concede anistia aos presos pelos ataques golpistas de 8 de janeiro. Sobretudo pela forma como ocorreu, numa votação rápida em plenário e sem instrumentos que pudessem adiar a discussão.

Deputados bolsonaristas, por sua vez, se queixaram do entendimento da corte, ainda que estivesse precificada. O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), foi às redes sociais para cobrar uma resposta de Motta.

“Acaba de ser formada a maioria na Primeira Turma do STF para derrubar parte da sustação aprovada por 315 deputados em plenário. Um ministro está se sobrepondo à vontade de toda a Câmara. Com a palavra, o presidente Hugo Motta. Vai defender a soberania do Parlamento ou assistir calado?”, questionou no X.

Já o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), comemorou o resultado da corte. “STF forma maioria e derruba ‘trem da anistia’. Bolsonaro e seus generais terão que responder por seus crimes. A Câmara não pode trancar a totalidade da ação penal. É ilegal e inconstitucional”, disse.

Aliados de Motta dizem que é preciso aguardar os desdobramentos políticos do episódio, mas apostam que ele não terá interesse em prolongá-lo, transformando numa nova crise com o Supremo. A Câmara pode ainda recorrer com embargos de declaração, o que ainda não estava decidido.

Quando assumiu o mandato de presidente da Casa, no início do ano, uma de suas prioridades foi o distensionamento entre os Poderes, sobretudo a resolução da crise das emendas parlamentares.

Da forma como foi aprovado na Câmara, o relatório poderia trancar a ação penal beneficiando outros réus, além de Ramagem, como Braga Netto e Bolsonaro. O STF já havia dito à Casa que não havia previsão constitucional para um entendimento tão amplo.

Nesta sexta-feira (9), a Primeira Turma do STF formou maioria pela derrubada da manobra da Câmara. A posição do Supremo confronta a decisão dos deputados de sustar toda a ação penal contra Ramagem e confirma que a ação dos congressistas não tem poder de paralisar o processo contra os demais réus, como Bolsonaro.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou contra a paralisação de toda a ação penal contra o deputado e, no começo da noite, já havia sido acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux. Falta ainda o voto de Cármen Lúcia.

O julgamento ocorre no plenário virtual da Primeira Turma e tem prazo para terminar até a próxima terça-feira (13).

“Os requisitos do caráter personalíssimo e temporal, previstos no texto constitucional, são claros e expressos, no sentido da impossibilidade de aplicação dessa imunidade a corréus não parlamentares e a infrações penais praticadas antes da diplomação”, disse Moraes em seu voto.

O ministro afirma que a Constituição não prevê nenhuma outra situação em que o Poder Legislativo pode suspender a atividade jurisdicional do STF. Por isso, a atribuição da Câmara no caso Ramagem é limitada.

Aliados de Motta viram o voto de Flávio Dino como o mais duro. Ele diz que a Câmara, ao tentar suspender todo o processo, ultrapassa suas atribuições constitucionais e tenta promover “indevida ingerência em um processo judicial de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal”.

“Somente em tiranias um ramo estatal pode concentrar em suas mãos o poder de aprovar leis, elaborar o orçamento e executá-lo diretamente, efetuar julgamentos de índole criminal ou paralisa-los arbitrariamente -tudo isso supostamente sem nenhum tipo de controle jurídico”, afirma o magistrado.