BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) pediu à corte que investigue atos do presidente da INB (Indústrias Nucleares do Brasil), Adauto Seixas, ligados à sua adesão ao plano de demissão voluntária (PDV) da estatal, além de cobrança retroativa de auxílio-moradia.

A representação foi feita pelo subprocurador-geral do MP junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado, a partir de reportagem publicada pela reportagem.

“Cumpre ao TCU investigar os fatos à luz de suas atribuições constitucionais e legais, exercendo o poder-dever de zelar pelo bom uso dos recursos públicos e sancionando os responsáveis por condutas desviantes”, afirma Furtado, no documento.

Como revelou a Folha de S.Paulo, Adauto Seixas aderiu ao plano de demissão voluntária da estatal federal no fim do ano passado e, ao mesmo tempo, manteve-se no cargo de comando da empresa, o que é vedado pelo regimento da própria INB.

No ano passado, a estatal deu andamento a um PDV para seus funcionários. Por ocupar cargo comissionado, o presidente da estatal não poderia aderir ao programa de desligamento voluntário. Segundo regra do próprio regulamento, é vedada a adesão de “ocupante de cargo em comissão de livre provimento e de cargo estatutário”, como era o caso de seu presidente.

Outra condição básica para adesão ao PDV é que o empregado tenha sua matrícula de servidor público “na condição de ativo” no sistema de recursos humanos da INB, mas esse registro fica suspenso quando o funcionário assume cargo comissionado. O cadastro do presidente, no entanto, foi reativado momentaneamente, o que permitiu que ele fizesse a sua adesão ao programa, enquanto se manteve no cargo de comando da empresa, com salário mensal líquido de mais de R$ 34.500.

“Há vedação expressa à adesão a esse plano por ocupantes de cargo em comissão de livre provimento e de cargo estatutário. Sabendo-se dessa possível irregularidade ocorrida no âmbito da empresa pública federal, entendo que se mostra necessária a atuação desta Corte de Contas no sentido de declarar a nulidade do ato e proceder à recuperação de eventuais recursos públicos despendidos com a adesão irregular desse empregado ao PDV”, afirma Furtado.

Outro ato de Adauto Seixas como presidente da INB permitiu que ele recebesse, em fevereiro deste ano, um valor total de R$ 43.086,96, referente a um pagamento retroativo de auxílio moradia, relacionado a um período em que ele –que vive em Poços de Caldas (MG)– mudou-se para o Rio de Janeiro, onde a INB tem escritório.

Como mostrou a reportagem, Seixas é proprietário de um imóvel no Rio Janeiro, um apartamento localizado em Copacabana. Se o funcionário possui um imóvel na mesma cidade onde trabalha, ele é proibido de receber auxílio moradia.

A INB, que tem bases em Caldas (MG), Rio de Janeiro (RJ), Rezende (RJ) e Caetité (BA), é responsável pela produção do combustível nuclear que abastece as usinas de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro.

“Se o ato foi praticado contrariando a finalidade que justificou a outorga de competência para a prática do ato, ou seja, se foi praticado com desvio de finalidade, ele está eivado de ilegitimidade e é passível de aplicação das sanções previstas no ordenamento jurídico em face do agente responsável”, diz Lucas Furtado, pedindo que, “em se confirmando os indícios supracitados, instaurar tomada de contas especial para responsabilização dos agentes envolvidos”.

À Folha, Adauto Seixas negou irregularidades e declarou que todas as ações foram tomadas com o conhecimento e autorização da própria INB.

Por meio de nota pública, a instituição Intersindical, que congrega sindicatos que representam os trabalhadores da INB, declarou que vê com “profunda preocupação com as informações veiculadas na imprensa”, diante da “gravidade das denúncias, que envolvem possível desvio de finalidade no uso de recursos públicos e violação de regras administrativas elementares”.

“Esperamos que os órgãos de controle competentes — incluindo o Tribunal de Contas da União, a Controladoria-Geral da União, o Ministério Público Federal e o Conselho de Administração da INB — atuem com independência e celeridade para investigar e esclarecer todos os elementos do caso, com a responsabilização dos envolvidos, caso se confirmem as irregularidades”, afirmou.

Reportagem da Folha de S.Paulo também revelou que a INB está no centro de uma série de gravações ilegais e vazamento de informações institucionais da empresa, atos que envolvem diretamente o seu presidente, Adauto Seixas.

Uma série de documentos, além de mensagens de texto e áudio, revela perseguições e divulgação irregular de questões administrativas da estatal. Os fatos, ocorridos entre 2023 e 2024, foram levados à Polícia Civil, por meio de boletim de ocorrência registrado por uma servidora. Um procedimento foi aberto junto ao Ministério Público do Trabalho, além de o caso ter sido levado à ouvidoria e à Comissão de Ética da INB.

A INB declarou que “a vítima era o atual presidente da INB, tendo sido inclusive perseguido em outras oportunidades” e que “o objeto da denúncia já foi devidamente apurado internamente e encaminhado aos órgãos externos competentes”.

A INB também afirmou que não compactua com qualquer forma de assédio, ameaça ou conduta incompatível com o serviço público e que seguirá colaborando com os órgãos de controle para total esclarecimento dos fatos.