BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, decidiu deixar com a Primeira Turma da corte a análise da decisão da Câmara que tenta suspender o processo da trama golpista contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) e que abre brecha ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O ministro Alexandre de Moraes pediu a convocação de uma sessão virtual extraordinária para o julgamento do caso, e o ministro Cristiano Zanin, presidente do colegiado, decidiu marcá-la a partir desta sexta-feira (9), às 11h, com duração até o dia 13.
“[A ação penal] prosseguirá, normalmente, até a decisão da Primeira Turma”, disse Moraes, reforçando o entendimento do Supremo, do fim de 2023, de deixar com os colegiados a responsabilidade de julgar processos penais.
O regimento interno do STF prevê que caberá ao plenário analisar a suspensão de processos penais contra parlamentares quando as casas do Congresso Nacional decidirem dessa forma. Com a mudança da competência, Barroso entendeu que o caso deve ir à Turma.
“Diante do exposto, considerando que a ação penal sustada por decisão da Câmara dos Deputados encontra-se sob a jurisdição da Primeira Turma, encaminhem-se os autos à presidência da Primeira Turma deste Supremo Tribunal Federal, para deliberação”, diz Barroso no despacho.
A Câmara aprovou na quarta-feira (7) uma proposta que tenta suspender por completo a ação penal contra Ramagem, réu apontado como integrante do núcleo central do grupo acusado de tentativa de golpe de Estado em 2022.
Os deputados ainda pretendem barrar todo o processo da trama golpista com essa decisão -o que poderia beneficiar Bolsonaro, o ex-ministro Walter Braga Netto e outras cinco pessoas.
Ministros do Supremo afirmaram à Folha de S.Paulo, sob reserva, que a tentativa da Câmara é inconstitucional e deve ser derrubada.
A Constituição permite somente a suspensão do processo em relação aos crimes cometidos por Ramagem após sua diplomação como deputado federal. Possíveis delitos cometidos antes desse período, na visão dos ministros, não podem ser abarcados pela decisão da Câmara.
Em abril, Zanin informou à Câmara que a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) revela que o deputado possivelmente cometeu os crimes de dano qualificado ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado após a diplomação.
Outros três delitos -associação criminosa armada, golpe de Estado e abolição do Estado democrático de direito- pelos quais Ramagem é réu teriam sido cometidos antes da diplomação e, portanto, não estariam no guarda-chuva de análise da Câmara, já que ele não era ainda parlamentar quando praticados.
“A Turma determinou para dar ciência à Câmara dos Deputados, nos termos do voto do ministro relator, para aplicação do § 3º, do artigo 53 da Constituição Federal, tão somente em relação ao réu Alexandre Ramagem Rodrigues e, especificamente, pelos crimes praticados após a diplomação”, disse Zanin em ofício enviado à Câmara.
A comunicação de Zanin sobre a extensão do poder da Câmara sobre o processo contra Ramagem causou reação entre lideranças partidárias. Parlamentares ligados ao bolsonarismo acusaram o Supremo de avançar sobre prerrogativas do Congresso e, como resposta, decidiram extrapolar sua competência constitucional para prever a suspensão completa do processo sobre a trama golpista.
O projeto aprovado na Casa determina, de forma genérica, sem mencionar Ramagem, que o andamento da ação penal fica sustado. O texto foi redigido com o objetivo de abrir espaço para uma interpretação de que a suspensão do processo abranja Bolsonaro e os demais réus.
A proposta foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça na tarde de quarta e, à noite, teve o apoio de 315 deputados contra 143 no plenário da Câmara.
Entre deputados que disseram sim ao texto há integrantes de legendas que compõem a base de sustentação do Palácio do Planalto.
Parte do Congresso entende que a votação expressiva favorável a Ramagem pode servir como um termômetro do apoio na Câmara ao projeto que concede anistia para os réus envolvidos nos ataques às sedes dos Poderes, em 8 de janeiro de 2023.
Há ainda uma leitura feita por parlamentares de que o caso de Ramagem não serve para medir o apoio à anistia, uma vez que, nesse tipo de votação, congressistas pautam suas posições por corporativismo.
Relator da proposta de suspensão do processo contra Ramagem, o deputado Alfredo Gaspar (União-Brasil-AL) afirmou durante a votação que a decisão favorável ao colega não significa apoio à impunidade.
“O deputado Delegado Ramagem, assim como nós, só tem mais 1 ano e 6 meses de mandato. A sustação da ação penal é a paralisação do curso do processo até o fim do mandato, daqui a 1 ano e 6 meses. Além disso, o deputado não irá contar com o benefício da prescrição. A prescrição estará intacta”, disse Gaspar.