BARRA MANSA, RJ (FOLHAPRESS) – A taxa de ocorrência de demências, como o Alzheimer, está aumentando mais rapidamente na China do que no restante do mundo, revela um novo estudo publicado na revista científica PLOS One. A principal explicação para o fenômeno está na rápida transição demográfica do país, que envelhece em ritmo acelerado, e na alta incidência de fatores de risco para a doença.
Segundo os autores do trabalho, os casos triplicaram no país asiático entre 1990 e 2021, enquanto dobraram no cenário global no mesmo período. A pesquisa analisou mais de três décadas de informações de saúde provenientes do Global Burden of Disease (GBD), base de dados criada com o apoio da OMS (Organização Mundial da Saúde) e do Banco Mundial.
Os dados levantados também revelam que os casos são predominantes entre as mulheres, que possuem uma expectativa de vida maior, enquanto a taxa de mortalidade é ligeiramente superior entre os homens.
Ao mesmo tempo em que envelhece, a China enfrenta desafios relacionados a fatores de risco que poderiam ser evitados por meio de políticas públicas em saúde. Entre eles, o açúcar elevado no sangue, principalmente em decorrência do diabetes tipo 2, lidera em número de casos no país, seguido pelo tabagismo e pelo excesso de peso, sobretudo entre homens de meia-idade e idosos, segundo a pesquisa.
Por conta disso, especialistas projetam que os casos continuarão a crescer até 2040 se não houverem medidas eficazes de prevenção, como campanhas de controle glicêmico, combate ao tabagismo e promoção da saúde física. Os autores destacam, no trabalho, que existe uma janela de prevenção aberta para o país, mas que pode desaparecer no futuro.
Segundo uma projeção da OMS, são esperados 16,5 milhões de casos de demência em todo o leste asiático até 2050, um aumento de 222%. Para a América Latina, esse número é menor, de 3,8 milhões, mas representa um aumento de 363%. Em comparação, na Europa é esperado um aumento de 90,8% dos casos, e nos Estados Unidos e Canadá, 158%.
Um estudo conduzido por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) no ano passado aponta que 54% dos casos de demência na América Latina poderiam ser evitados com o controle de alguns fatores de risco. Entre eles, perda auditiva, baixa escolaridade e tabagismo são os mais prevalentes. Esse trabalho também aponta que a incidência no Brasil, de 48,2%, é um pouco menor do que na região, mas ainda superior à média mundial, que gira em torno dos 40%.
Para Raquel da Costa, professora da UFF (Universidade Federal Fluminense), o crescente número de casos de demência em nações com menor desenvolvimento relativo se deve a dois fatores. Primeiro, com a maior conscientização sobre a doença e com a ampliação do diagnóstico, por conta da chegada de novas tecnologias e técnicas de análise, como os exames de líquor e o uso de biomarcadores, é um dos fenômenos que contribui com o aumento dos casos de demência documentados.
“Mas o que mais nos preocupa são os fatores de risco modificáveis, que continuam mal controlados nesses lugares”, afirma a pesquisadora. Países em desenvolvimento, como o Brasil, tendem a ter maior incidência de comorbidades ou fatores socioeconômicos que prejudicam ou impedem um envelhecimento saudável da sua população.
A baixa escolaridade é o principal fator de risco para perda de autonomia e surgimento de sintomas associados à demência, superando idade e sexo, aqui no Brasil, segundo dados de uma pesquisa recente publicada na The Lancet Global Health.
A professora Carla Mércia Souza Dacier Lobato, da UFPA (Universidade Federal do Pará), explica que o cérebro, quando é estimulado desde a infância, cria uma reserva cognitiva que é capaz de proteger o corpo dos sintomas da demência. E a escolaridade cumpre um papel fundamental na promoção desses estímulos.
Além disso, segundo a especialista, a escolaridade se relaciona com melhores hábitos de vida, como alimentação saudável e prática de atividades físicas, e com maior busca por acesso à saúde, de forma geral, o que pode contribuir para uma redução de outros fatores de risco modificáveis.
Atualmente, 14 fatores de risco que podem ser controlados são reconhecidos como os mais relevantes para o desenvolvimento de demências: baixa escolaridade, perda auditiva, hipertensão, obesidade, tabagismo, depressão, isolamento social, sedentarismo, diabetes, consumo excessivo de álcool, poluição do ar, lesões traumáticas cerebrais, perda de visão e colesterol LDL elevado.