SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em 2000, quando estavam perto de completar duas décadas de existência, os Paralamas do Sucesso planejaram uma pausa de seis meses, até então inédita. A amizade continuava inabalável, mas o grupo sentia a necessidade de repensar os caminhos artísticos.
“Estava no momento de reavaliar. Aí veio o acidente e teve uma reaproximação natural. Vimos o que podíamos fazer pelo Herbert”, lembra o baixista Bi Ribeiro. “Com a gente ele tinha entusiasmo, e a memória foi voltando.”
A queda de ultraleve em Mangaratiba (RJ), em fevereiro de 2001, que deixou o cantor Herbert Vianna paraplégico, marcou o amadurecimento da banda e selou a união dos músicos, juntos há mais de quatro décadas. Lucy Needham Vianna, mulher do cantor, morreu no local do acidente.
A divisão entre o antes e o depois aparece nos dois atos do espetáculo “Vital – O Musical dos Paralamas”, uma biografia da banda em cartaz no Teatro Sabesp Frei Caneca, em São Paulo, após temporada no Rio de Janeiro.
No primeiro ato, Herbert, Bi, o baterista João Barone e o empresário José Fortes, tratado como quarto paralama, são jovens, divertidos e descobrem o sucesso a partir das lendárias apresentações no Circo Voador, no verão de 1983, e na primeira edição do Rock in Rio, em 1985.
A segunda parte, mais densa, mostra que as dores, os amores e os desamores marcaram a trajetória do quarteto. A dramaturga Patrícia Andrade optou por um fluxo narrativo não cronológico, a partir da memória de Herbert, principalmente no período em que ele ficou internado no Hospital Sarah Kubitschek, em Brasília.
Bi Ribeiro chama o amigo de “jukebox ambulante”, tamanha é a bagagem musical do vocalista. Quando a memória do cantor começou a voltar, surgiram as letras e as harmonias de um repertório amplo que inclui, por exemplo, as letras do Legião Urbana.
“A peça tem essa afirmação da força do Herbert, da recuperação dele, da fé na vida”, afirma o diretor Pedro Brício. Ele temia que o espetáculo provocasse saudosismo, mas compreendeu que a força dos Paralamas é uma potência do presente o público canta, com os atores, as canções mais marcantes da banda, apresentadas em formato de show.
Os músicos são interpretados por Rodrigo Salva (Herbert Vianna), Franco Kuster (João Barone) e Gabriel Manita (Bi Ribeiro), além de Hamilton Dias como o empresário José Fortes.
O musical recria apresentações históricas, com os atores acompanhados por uma banda ao vivo. Músicas como “Óculos”, “Meu Erro”, “Alagados”, “Lanterna dos Afogados” e “Romance Ideal” contam a trajetória do grupo, homenageiam o rock brasileiro e comovem as gerações que cresceram com essa trilha sonora.
No caso dos Paralamas, é rock, mas é também reggae, ska, ritmos latinos e africanos, música nordestina, guitarras do Norte e um repertório marcado pela diversidade brasileira, algo que vai das letras sociais às canções românticas.
“Os Paralamas, mais do que qualquer outra banda, foram os que mais marcaram a minha vida”, diz o produtor Gustavo Nunes, da Turbilhão de Ideias, idealizador do espetáculo junto com Marcelo Pires, da agência Ideia da Silva. “Tenho um prazer muito grande em criar projetos brasileiros. A grande satisfação é essa”.
Bi, Barone e Fortes gostaram do que assistiram no palco Herbert ainda não viu, mas foi representado pelos filhos. “Foi muito emocionante, uma sensação diferente”, descreve Bi.
Depois da peça, o baixista foi rodeado pelos atores e músicos, em uma espécie de entrevista. Queriam saber as opiniões dele, ouvir sobre o que era preciso mudar ou acrescentar. Bi não fez reparos. “Fiquei surpreso ao me emocionar desde o início do musical, a história foi muito bem adaptada para o formato”, disse Barone.
A reação do empresário foi ainda mais emocional ele chorou muito. É de Fortes, segundo Bi, grande parte da responsabilidade pela longevidade da banda. O empresário está com os Paralamas desde o início e concentra as demandas burocráticas e financeiras.
“Ele cuida totalmente do negócio. Então, ficamos só com a arte”, diz o baixista. “Se não fosse ele, talvez a gente não estivesse aqui até agora. Ele une todo mundo. Não só os três, como toda a equipe. Sabe lidar com todos, tem uma paciência danada”.
Uma pessoa com deficiência, o ator Herberth Vital faz parte do elenco e aparece principalmente na fase de recuperação de Herbert, em um processo impulsionado pela memória musical. Por coincidência, ele tem esse nome em homenagem a Herbert e ao músico Vital Dias, primeiro baterista dos Paralamas, que inspirou a canção “Vital e sua Moto”, do disco “Cinema Mudo”.
Bi se lembra do dia em que ouviu, pela primeira vez, “Vital e Sua Moto” tocar na Fluminense FM, emissora de Niterói conhecida como “maldita” e famosa na década de 1980 por revelar diversas bandas de rock brasileiras. Naquele momento, ele sentiu que o trio havia, de fato, chegado ao mundo.
Vital Dias, que era engenheiro mecânico, saiu do grupo antes do auge, após faltar a um show. Ele morreu em 2015, aos 55 anos, vítima de um câncer no intestino.
O musical mostra os Paralamas celebrando o show no Circo Voador, em abertura de apresentação de Lulu Santos, e apavorados ao chegar ao palco imenso do Rock in Rio uma conquista que foi fruto da insistência de Fortes. Ali, ao tocar para uma plateia imensa, a banda de estudantes universitários conheceu o sucesso que já dura 40 anos.
VITAL, O MUSICAL DOS PARALAMAS
– Quando Até 31/5. Sábado, às 16h e 20h; domingo, às 15h e 19h
– Onde Teatro Sabesp Frei Caneca
– Preço De R$ 21 a R$ 220
– Autoria Patrícia Andrade
– Elenco Rodrigo Salva Gabriel Manita Franco Kuster Nando Motta (alternante Herbert Vianna) Barbara Ferr Hamilton Dias Herberth Vital Maria Vitória Rodrigues Pedro Balu
– Direção Pedro Brício