PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Um ano após a enchente histórica que atingiu 160 mil pessoas em Porto Alegre, a capital gaúcha segue vulnerável a eventos climáticos como os de maio de 2024. Obras emergenciais de reconstrução do sistema de proteção contra cheias estão em andamento, mas soluções definitivas ainda permanecem no papel ou nas mãos da Justiça.

O sistema de proteção contra cheias —composto por 68 km de diques, 2,6 km de muros e 14 comportas— deveria suportar até seis metros de elevação do nível da água, mas todos os seus componentes apresentaram algum tipo de falha em maio de 2024, quando o nível do lago Guaíba alcançou 5,35 metros.

As obras de recomposição dos diques da Fiergs (Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul) e do Sarandi, na zona norte de Porto Alegre, são consideradas prioritárias: as duas proteções tiveram pontos de rompimento que aceleraram a inundação do bairro Sarandi e afetaram mais de 26 mil moradores.

As obras nos dois diques tiveram início em agosto de 2024 e incluem reforço e elevação da altura para uma cota de 5,8 metros. A reforma do dique da Fiergs está em fase final e deve ter os trabalhos concluídos ainda no início de maio.

Já no dique do Sarandi, um trecho de 1,1 km teve a elevação concluída em janeiro, mas a obra está parada desde então devido a um imbróglio judicial relacionado à remoção de 57 famílias que vivem em áreas ao lado ou sobre o dique. De acordo com a prefeitura, 33 já firmaram acordo com o município, enquanto a discussão segue com outras 24.

Em março, a prefeitura iniciou a remoção das famílias que já haviam fechado acordo e entrou com um pedido de reintegração de posse no Cejusc (Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania) para fazer conciliação com aquelas que ainda não o fizeram, argumentando que as construções foram realizadas irregularmente em área de risco.

No fim do mês, uma decisão do Tribunal de Justiça do RS suspendeu as obras de demolição. Uma nova decisão no dia 3 de abril negou o recurso apresentado pela prefeitura. Segundo a Justiça, o plano de remoção das famílias não assegura condições dignas de moradia após a desocupação.

A Procuradoria-Geral do Município, que ainda tenta reverter a decisão, declarou que foram oferecidos novos imóveis pelo programa federal Compra Assistida, que financia unidades residenciais de até R$ 200 mil, e o pagamento de Estadia Solidária, no valor de R$ 1.000 pelo município, enquanto os imóveis não são adquiridos. “A realocação é necessária para a primeira parte da obra do dique do Sarandi”, afirmou a procuradoria.

A prefeitura também se prepara para discutir a remoção de mais famílias para construir um dique na Vila Asa Branca, processo ainda não iniciado.

O Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgotos) afirmou que já investiu mais de R$ 240 milhões em recursos próprios em ações de reconstrução e na isenção de tarifas de água e esgoto para moradores afetados.

Além das obras de recomposição, há um estudo em andamento, desde julho de 2024, para elevar os diques a uma cota de sete metros de altura, seguindo a previsão do projeto original, datado da década de 60.

Um novo sistema, projetado do zero, está em fase de estudos e é conduzido pela Rhama Analysis, coordenada pelo professor emérito da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Carlos Henrique Tucci. A previsão é que os estudos sejam concluídos em 2026, e ainda não há uma data definida para o começo das obras.

As obras no sistema de comportas, que não foram capazes de bloquear a água do lago Guaíba, também estão em andamento. No último dia 23, a prefeitura de Porto Alegre anunciou o investimento de R$ 11 milhões em novas intervenções no sistema. Quatro comportas serão fechadas definitivamente com concreto armado, somando-se a outras três já fechadas desde maio de 2024. Outras três comportas serão reformadas com novos portões.

“O fechamento definitivo de sete passagens reduzirá de 150 para 45 metros a amplitude total das aberturas no muro. O objetivo é reduzir a possibilidade de infiltrações em caso de novas cheias”, disse o Dmae em nota.

A prefeitura também espera concluir, nas próximas semanas, a reforma da estrutura do Muro da Mauá, que separa o Centro Histórico de Porto Alegre do lago Guaíba. As obras foram feitas com base em um relatório preliminar da UFRGS, e o estudo completo ainda está em andamento.