SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os descontos não autorizados em aposentadorias e pensões do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) que está sendo investigado pela PF (Polícia Federal) e pela CGU (Controladoria-Geral da União) começaram a crescer de forma desproporcional em 2019, segundo a PF.
Naquele mesmo ano, o INSS precisou devolver aos aposentados R$ 57 milhões em débitos não autorizados, que envolviam associações diferentes das que estão sendo investigadas agora.
Na investigação atual, a CGU afirma que houve aumento “vertiginoso” no volume de descontos entre 2019 e 2020, bem como na arrecadação de associações investigadas. O órgão também aponta que o INSS ignorou alertas feitos pelos órgãos de controle em 2024. Segundo a controladoria, foram enviados seis ofícios entre 8 de maio de 2024 e 12 de julho daquele ano, pedindo providências, que teriam ficado sem resposta.
Procurado, o INSS nega que alertas tenham sido ignorados. O órgão diz que respondeu a uma recomendação da CGU pedindo explicações sobre o ofício enviado, mas não obteve resposta.
Os descontos estão previstos na legislação desde 1991, mas dispararam após mudanças legais em 2022. Durante a operação, o órgão diz ter entrevistado 35 beneficiários no Maranhão em 2024 e todos eles afirmaram que não conheciam a associação que estaria aplicando descontos, não tinham autorizado os abatimentos e que não terem sido procurados para falar sobre a adesão.
Veja abaixo a cronologia da crise.
JUNHO E AGOSTO DE 2019
Em agosto de 2019, o órgão encerrou o convênio com quatro associações que aplicavam descontos irregulares, após investigação. Na época, foram bloqueados descontos em 800 mil aposentadorias e pensões e devolvidos R$ 57 milhões em descontos não autorizados. As associações não são as mesmas investigadas agora.
2019
A MP (Medida Provisória) 871 de 2019 incluiu uma regra para que o aposentado precisasse confirmar a autorização do desconto anualmente. O Congresso alterou a redação para que a revalidação passasse a ser feita a cada três anos a partir de 31 de dezembro de 2021. Como isso aconteceu em 2019, o que jogou a primeira reavaliação para 2025.
2021
Em 2021, o Congresso aumentou esse prazo em um ano e jogou a primeira revalidação para 2026.
2022
O Congresso retirou essa exigência que previa a necessidade de as associações confirmarem, após um período, se os aposentados gostariam de continuar com os descontos. No mesmo ano, o INSS publicou duas normativas regulamentando os descontos em benefícios, mas sem normas que pudessem dificultar fraudes.
JUNHO DE 2023
A então integrante do CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social) Tonia Galleti, representante do Sindnapi, uma das associações investigadas, pediu para o tema ser discutido na reunião de junho de 2023, mas não foi atendida porque, segundo o ministro Carlos Lupi, a pauta já estava elaborada e seria necessário um levantamento. Lupi pediu que o tema fosse pautado como primeiro item da reunião seguinte, o que não aconteceu.
MARÇO DE 2024
O INSS publicou a instrução normativa 162, com regras para os convênios entre o órgão e associações e sindicatos. Uma regra é que o desconto de mensalidade tem de ser formalizado por termo de adesão, com assinatura eletrônica avançada e biometria (para novos contratos), além da apresentação do documento de identificação oficial do segurado com foto e número do CPF.
ABRIL DE 2024
INSS apresentou medida cautelar informando que, a partir de maio daquele ano, fossem bloqueados novos descontos de mensalidades até que a Dataprev (empresa de tecnologia que presta serviços ao governo) encontrasse um recurso para viabilizar a assinatura eletrônica avançada e a biometria facial nas adesões.
MAIO DE 2024
Segundo a CGU, o INSS estaria avaliando uma solução transitória para retomar os descontos a partir de junho, já que a solução definitiva estaria prevista para setembro daquele ano.
JUNHO DE 2024
O então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, aceitou pedido para implementar a regra transitória para retomar os descontos a partir de junho de 2024, desde que com assinatura eletrônica avançada e biometria facial com validação em bases biométricas públicas. As autorizações valeriam para as entidades Sindnapi, Amar BR e Masterprev na competência de junho, mas, segundo a investigação, a extração da folha de pagamentos do INSS indica que houve 785.309 novas inclusões de 32 entidades diferentes.
JUNHO DE 2024
Após dispararem queixas por descontos indevidos, o TCU (Tribunal de Contas da União) deu prazo de 90 dias para o INSS adotar ações para coibir fraudes e endurecer as regras já existentes.
SETEMBRO DE 2024
Ofício da CGU de 19 de setembro de 2924 reforça o pedido para que o INSS tome providências sobre o tema. Segundo o órgão, os alertas já haviam sido feitos por meio de seis ofícios, entre os dias 8 de maio de 2024 e 12 de julho de 2024, que estavam sem respostas. O documento também pede que as associações e os sindicatos investigados enviem as informações solicitadas ou forneçam os dados que estavam faltando.
OUTUBRO DE 2024
Ofício da CGU pede reunião para que o INSS apresente como estão sendo aplicadas as recomendações. Em novembro, segundo o órgão, verificou-se que ainda não haviam sido registradas as medidas adotadas.
Polícia, Ministério Público de São Paulo e o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) passam a investigar associações, a partir de boletins de ocorrência e processos judiciais. Auditoria do INSS aponta R$ 45 milhões em descontos indevidos nas aposentadorias de janeiro de 2023 a maio de 2024.
NOVEMBRO DE 2024
Nota técnica da CGU aponta que a implementação da solução transitória evidenciou riscos significativos, “como a perpetuação de falhas nos processos de averbação e a potencial continuidade de descontos indevidos”, segundo organograma elaborado pela investigação.
ABRIL DE 2025
Operação da Polícia Federal e da CGU (Controladoria-Geral da União) aponta que o esquema envolve até fraudes em assinaturas eletrônicas. Entre 2019 e 2024, foram descontados dos benefícios do INSS R$ 6,3 bilhões, e ainda será apurado quanto desse valor é irregular.
O escândalo levou à demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, após ordem de Lula. Também foram afastados dos cargos servidores do alto escalão do INSS.