SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Aos 83 anos, em plena turnê de “Bloco na Rua”, que estreou em 2019, voltou em 2024 e agora segue para a Europa, o cantor, ator, diretor e mil outras coisas veio a São Paulo, na semana passada, para apoiar o lançamento da cinebiografia “Homem com H”, de Esmir Filho, que estreia nos cinemas no próximo dia 1º.

Ao lado do ator que o interpreta no longa-metragem dos 19 aos 45 anos, Jesuíta Barbosa, Ney contou à reportagem que a fama, o sucesso, os prêmios, o dinheiro que ganhou na vida sempre foram bem-vindos, mas nunca foram sua maior ambição. A liberdade de fazer o que bem entendesse com seu corpo e com sua vida sempre foi sua verdadeira missão.

“A liberdade é maravilhosa, e vale a pena lutar por ela”, disse Ney. “As pessoas não precisam viver submetidas à caretice, a dogmas, a nada. Não há nem nunca vai haver governo, nem religião que possa comandar a vida da gente. A gente não pode viver nossa vida para agradar os outros”.

Pergunto se o preço de viver assim, e de falar tão abertamente sobre essa liberdade foi muito alto, e ele diz que não, e até parece querer entender melhor que pergunta é essa. “Que preço?”

O filme “Homem com H” tem como espinha dorsal exatamente o confronto de Ney com todas as figuras de autoridade possíveis, desde a primeira que surgiu em sua vida, seu pai. Militar e muito austero, Antônio Mattogrosso Pereira tentou, de todas as maneiras que conhecia, endireitar aquele menino que desde muito criança não era igual aos outros. Mas Ney já nasceu indomável.

“Sempre fui insolente, essa é uma palavra que me define bem”, afirmou o filho, que adotou o sobrenome do pai como seu, apesar de ter sido batizado como Ney de Souza Pereira. No processo, tirou um “t” de Matogrosso.

O cineasta Esmir Filho, diretor e roteirista de “Homem com H”, contou que o projeto apareceu para ele como um convite da produtora Paris Filmes. “Demorei um pouco para aceitar porque foi no meio da pandemia, mas comecei a ouvir a discografia completa do Ney, em ordem cronológica, a ler sobre ele e fui percebendo que a história dele toca a minha em muitas coisas, a relação afetiva, o corpo, o desejo, o palco, a expressão. Depois que eu aceitei, parecia inevitável que eu contasse essa história”.

Na hora de escolher o protagonista, Esmir conta que logo pensou em Jesuíta Barbosa, mas testou dezenas de outros possíveis intérpretes para ter certeza de que faria a melhor escolha. “Testei sósias do Ney, testei gente do Brasil inteiro, mas quando o Jesuíta chegou todo mundo percebeu que tinha alguma coisa ali que a gente não ia achar em mais ninguém”, disse o diretor. “É como se os dois exalassem o mesmo perfume”.

Jesuíta também era, desde sempre, o preferido de Ney, apesar do cantor não ter poder de veto e nem estar envolvido no projeto desde o começo. “Eu só li o roteiro quando estava pronto e visitei o set algumas vezes, quando as filmagens já estavam bem adiantadas”, afirmou.

Em longas conversas antes das filmagens, Ney, Esmir e Jesuíta, com 83, 42 e 33 anos, respectivamente, trocavam confidências e histórias pessoais que se transformaram em diálogos e falas de improviso do Ney/Jesuíta do filme.

Na principal cena de sexo, um longo plano sequência em que Ney, sua namorada da época e várias outras pessoas, entre homens e mulheres, participam de uma transa coletiva, um detalhe que deixa tudo muito mais sexy foi uma dessas histórias que Ney contou ao diretor e ao ator nos bastidores.

“A coisa mais excitante para mim nessa cena é quando alguém mete o dedo na boca e enfia na boca dele”, conta o cantor. “Naquela época era assim, não tinha homem, mulher, tinham corpos, tinha desejo, tinha atração”, afirma o cantor.

“Eu já tinha feito muita cena de sexo no cinema, não foi uma coisa nova para mim, e acho que essa tem uma evolução muito bonita, foi muito bem dirigida. Aquela ideia é muito boa, né?”, disse Jesuíta.

A ideia a que ele se refere não é da suruba em si, mas das pessoas que surgem e saem do enquadramento, enquanto o casal principal permanece sempre em cena, cada um explorando suas vontades.

Assim como na vida de Ney, nada foi proibido no filme, nem sexo, nem drogas, nem as surras de seu pai, nem a briga com seus colegas de banda, nem o fracasso que experimentou depois de sair do Secos e Molhados, até encontrar o caminho de sua carreira solo.

“Minha única exigência era que tudo que estivesse na tela fosse verdade. É um filme de ficção, não é um documentário, mas não queria situações inventadas, nem pessoas que não existissem na vida real”, disse Ney.

“A memória do Ney é incrível, mas ele lembra das situações, nem sempre de cada coisa que foi dita, então preenchi as lacunas da memória dele com frases minhas, frases que ouvi na vida, o que faz deste um filme muito pessoal para mim também”, contou o diretor.

Jesuíta Barbosa, um ator que foi revelado no cinema e acabou incorporando a televisão em sua carreira e chegou a interpretar o principal galã de uma novela das nove da TV Globo, no remake de Pantanal, em 2022, contou que hesitou com o convite para interpretar esse personagem.

“Eu tinha medo de não estar à altura do desafio. Mas o medo também me impulsiona a enfrentá-lo, e no final virou um desafio gostoso”. O ator, que tem 1,78 cm de altura, perdeu 12 quilos em três meses para chegar ao corpo esguio do cantor no começo da carreira.

Sua voz na maioria das músicas é dublada por Ney, mas ele treinou canto e cantou de verdade durante as filmagens. Aí, o dono da voz real ia para o estúdio dublar o seu intérprete. “Mas ganhei uns agudos que eu não tinha antes, às vezes estou cantando distraidamente e eles parecem surgir do nada”, diz Jesuíta.

Já as danças, que Ney conta que fazia de improviso, só tentando interpretar com o corpo o som de cada canção, Jesuíta teve que treinar com um coreógrafo contratado pela produção. “Eu suava muito nos ensaios, ficava exausto”, lembra.

“O Ney talvez seja o personagem mais importante que eu interpretei até agora na minha vida. Porque ele existe, e porque ele tem uma história fundamental no nosso país. Espero que as pessoas saiam do cinema transformadas”, diz o intérprete.

HOMEM COM H

– Quando Estreia qui. (1º)

– Onde Nos cinemas

– Classificação 16 anos

– Elenco Jesuíta Barbosa, Bruno Montaleone, Jullio Reis

– Produção Brasil, 2025

– Direção Esmir Filho