Da Redação
Durante o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pelo menos 323 aliados políticos foram contemplados com cargos em conselhos de empresas públicas e privadas nas quais o governo mantém participação acionária. Essas posições, que exigem apenas a presença em reuniões periódicas, oferecem remunerações adicionais que, somadas aos salários públicos, podem elevar os vencimentos mensais a mais de R$ 80 mil.
Entre os beneficiados estão ministros, secretários-executivos, chefes de gabinete, assessores do Palácio do Planalto, dirigentes do PT, ex-parlamentares e nomes indicados diretamente por lideranças do Congresso Nacional. O levantamento foi realizado pelo Estadão por meio de mais de 40 pedidos via Lei de Acesso à Informação e cruzamento de dados de ministérios e estatais.
Em resposta, o Palácio do Planalto declarou que as nomeações respeitam os critérios estabelecidos pela Lei das Estatais e passam pela análise dos comitês internos de elegibilidade das empresas, que avaliam se os processos são conformes.
A reportagem considerou conselheiros em mandato até 15 de abril, que tenham cargos de indicação política ou sejam ligados à base aliada no Congresso — incluindo apadrinhados de figuras como Davi Alcolumbre, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira.
Os conselhos, tanto fiscais quanto administrativos, desempenham funções estratégicas dentro das companhias. No setor privado, seus membros geralmente possuem sólida formação técnica e vasta experiência de mercado. Contudo, nas empresas sob influência do governo, essas cadeiras muitas vezes servem como prêmio político, ocupadas por pessoas sem o perfil técnico esperado.
Exemplos não faltam: Débora Raquel Cruz Ferreira, jornalista e chefe de gabinete da Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST), tornou-se conselheira da EMGEPROM, empresa ligada à indústria naval militar. Antes disso, sua experiência profissional estava voltada à comunicação em órgãos públicos e sindicatos.
Outro caso é o de Lucas Monteiro Costa Dias, bacharel em História e atual diretor de programa da Secretaria de Comunicação da Presidência, que ocupa uma vaga no conselho fiscal da Caixa Cartões, subsidiária da Caixa Econômica Federal, recebendo um jeton de mais de R$ 5.400 por mês.
A prática se estende aos aliados nos estados: Felipe Matos, secretário municipal em Recife e apadrinhado do Republicanos, foi nomeado para o conselho da Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), mesmo sem experiência no setor portuário. O ministério responsável justificou a escolha citando conhecimento em concessões públicas.
Especialistas ouvidos pela reportagem questionam o impacto dessas nomeações. Sandro Cabral, professor do Insper, avalia que, embora a lei permita essas indicações, nem sempre as escolhas priorizam a competência técnica necessária para decisões estratégicas. Já Luis André Azevedo, da FGV, lembra que a eficiência deveria ser um princípio a ser observado, ainda que a legislação não exija formação acadêmica específica.
A distribuição de cadeiras políticas também alcança o primeiro escalão. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, sem formação em administração ou setor industrial, passou a integrar o conselho de administração da Tupy, multinacional da qual o BNDES é acionista. A empresa pagou, em média, R$ 39 mil mensais a cada conselheiro no último ano.
Além de Anielle, também ocupam assentos em conselhos figuras como Carlos Lupi (Previdência) e Vinícius Marques de Carvalho (Controladoria-Geral da União), que, ao somar os salários ministeriais e os jetons, podem ultrapassar R$ 80 mil mensais.
O governo argumenta que a diversidade de formação nos conselhos contribui para a boa governança e reforça o papel estratégico das empresas públicas no desenvolvimento nacional. Ainda assim, as indicações políticas seguem gerando críticas sobre a real eficiência e a transparência dessas escolhas.