BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Estigmatizado pelo impeachment que sofreu em 1992, o ex-presidente Fernando Collor submergiu nos 16 anos de mandato como senador, focou assuntos ligados à política externa e votou a favor do impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016.
Assessores e parlamentares que conviveram com Collor no Senado descrevem a passagem dele pela Casa como discreta, reservada, tímida e até mesmo inexpressiva em oposição aos anos de Presidência da República, em que aparecia correndo ou passeando de jet-ski.
Collor foi eleito para o Senado pela primeira vez em 2006 pelo PRTB e reeleito por mais oito anos em 2014. No discurso em que se despediu do mandato, o ex-presidente disse ter chegado ao Congresso otimista; saía, em 2022, preocupado.
“A solução das crises do país e a moderação dos conflitos não passam repito, não passam pela excitação do poder das togas, muito menos pelo sonho da marcha dos coturnos. A solução está e sempre estará na interlocução política no seu mais elevado patamar”, disse o senador na ocasião.
Durante seu mandato, Collor apresentou duas propostas de emenda à Constituição, mas nenhuma avançou. A primeira tornava o sistema de governo do país em parlamentarismo. A segunda aumentava o número de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) dos atuais 11 para 15 e estabelecia um mandato de 15 anos hoje, os integrantes da corte ficam no cargo até os 75 anos, independentemente do prazo de permanência.
O senador dedicou a maior parte do tempo de seus dois mandatos a assuntos internacionais e presidiu a CRE (Comissão de Relações Exteriores) onde costumava chegar com cinco minutos de antecedência e abrir a sessão pontualmente na hora prevista, segundo relatos.
“Como senador, ele foi bastante atuante em temas de natureza econômica e relações internacionais. Foi um presidente da CRE muito atuante, diligente, que valorizou a comissão. Foi à Síria, fez contatos bastante interessantes”, afirma o senador Esperidião Amin (PP-SC) sobre o colega com quem conviveu por quatro anos.
Apesar da atuação comedida, Collor protagonizou um bate-boca histórico com o ex-senador Pedro Simon (ex-PMDB-RS), em 2009. Na ocasião, Simon defendeu o afastamento do então presidente do Senado, José Sarney (ex-PMDB-AP), e citou a relação de Collor com o conterrâneo Renan Calheiros (MDB-AL).
“As palavras que o senhor acabou de pronunciar são palavras em relação a mim e às minhas relações políticas que eu não aceito. […] Quero que o senhor as engula e as digira como julgar conveniente”, disse Collor a Simon.
“Saía fogo dos olhos dele [Collor]. Me veio a imagem do pai dele no plenário do Senado. A diferença é que o pai dele errou o tiro. No meu caso, eu estava na linha direta”, disse Simon no dia seguinte, em referência ao episódio em que o pai de Collor, Arnon de Mello (AL), matou a tiros, por engano, o senador José Kairala (AC), na tentativa de acertar o adversário Silvestre Péricles (AL).
Em outro capítulo marcante, o ex-presidente da República xingou o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot enquanto se defendia da acusação de corrupção que motivou a ida dele para a prisão na sexta-feira (25).
“Afirmações caluniosas e infames. Filho da puta”, sussurrou o então senador em agosto de 2015 durante discurso na tribuna do Senado. Ele discursava sobre a apreensão de três carros de luxo na casa dele em Brasília, conhecida como Casa da Dinda, no mês anterior.
Mesmo tendo sido presidente da República, Collor não costumava chamar atenção pelos corredores do Senado e passava muito tempo no gabinete. Durante as discussões em torno da LAI (Lei de Acesso à Informação) e da criação da Comissão da Verdade, defendeu o sigilo eterno de documentos classificados como ultrassecretos.
O senador Paulo Paim (PT-RS) diz ter boas lembranças do ex-colega. Em 1991, quando Collor era presidente da República, Paim, então deputado federal, anunciou greve de fome para protestar contra o valor do salário mínimo. Segundo ele, Collor mandou avisá-lo que concederia um abono.
“Sempre enfrentei temas polêmicos em relação aos mais conservadores, de compromisso com a responsabilidade social, e ele praticamente me acompanhou em tudo. Eu dizia: presidente, para os trabalhadores, para o campo social, esse projeto não é bom. E ele dizia: tá bom, eu vou te acompanhar.”
Collor foi preso na manhã de sexta por decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes, que negou um recurso da defesa do ex-presidente na quinta-feira (24) e decidiu dar início ao cumprimento da pena de 8 anos e 10 meses de prisão. Na sexta, a maioria dos ministros da corte acompanhou o entendimento Moraes em votação virtual.