SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Professores e pesquisadores de diferentes estados brasileiros reúnem reflexões sobre enfrentamento ao racismo na educação no livro “Educação Antirracista em Diálogo”, lançado em 4 de abril pela ONG Ação Educativa.

Produzida em parceria com o Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista), a obra digital e gratuita apresenta práticas de ensino antirracista.

Entre as medidas descritas nos artigos que compõem a publicação estão inclusão da história e da cultura afro-brasileira nos currículos, preparação de professores para combater discriminação e valorização de pessoas negras no ambiente escolar.

“Buscamos construir uma obra que dialogasse não só com educadores, mas também com famílias e indivíduos interessados na qualidade do ensino brasileiro e no debate sobre direitos humanos”, diz Ednéia Gonçalves, uma das autoras, que é coordenadora executiva da Ação Educativa.

“As desigualdades criadas por processos históricos que transformaram diferenças em exclusão devem ser enfrentadas com uma educação humanizada, inovadora e que reconheça a escola como direito.”

Uma das abordagens propostas é a “pretagogia”, metodologia pedagógica que procura valorizar as contribuições culturais e históricas dos povos africanos e lembrar a resistência dos povos escravizados, extrapolando o eurocentrismo.

“Permeados por segregações pedagógicas racistas, os currículos vigentes afastam a população negra, desde a primeiríssima infância, das narrativas e existências sociais e culturais das matrizes africanas, roubando o sentido de pertencimento e comunidade”, escreve Elly Bayó, professora da rede municipal de Santo André (SP), em capítulo sobre o tema.

Outro destaque da obra é a discussão sobre racismo em creches e pré-escolas. Segundo os autores, a ideia de que crianças não podem ser racistas, influenciada pelo mito da democracia racial, dificulta a superação de desigualdades nas escolas.

A professora Mighian Nunes, formada em pedagogia pela Uneb (Universidade do Estado da Bahia), destaca que as relações entre professores, funcionários e alunos podem favorecer visões preconceituosas já nos primeiros anos de vida.

“Quando estamos com os bebês e as crianças nas instituições de educação infantil, como nos relacionamos, por exemplo, com as pessoas que preparam o alimento e as que trabalham na direção da escola?”, questiona a docente em capítulo.

“Qual tom de voz usamos para este ou aquele grupo, para crianças brancas e negras? Os bebês estão ali conosco, convivendo e aprendendo sobre esse mundo em que vivemos a partir das portas que abrimos para eles.”

Para coibir atitudes discriminatórias, defende o livro, é preciso oferecer formação especializada a professores, conforme determina lei de 2003 que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira na educação básica.

Essa preparação para lidar com temas raciais envolve processo contínuo de desconstrução de conceitos arraigados, como a ideia de mérito no ambiente acadêmico desconsiderando contextos sociais específicos dos estudantes.

Autores propõem também mudanças na EJA (Educação de Jovens e Adultos), que, embora conte com ampla participação de alunos negros, ainda carece de currículo que trate com a devida profundidade as opressões enfrentadas por eles.

Natalino Neves da Silva, professor da Faculdade de Educação da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), explica que o sujeito negro é, muitas vezes, visto como “o outro” -um personagem coadjuvante na narrativa escolar hegemônica. Como consequência, gera-se um sentimento de estar “fora do lugar”.

De acordo com ele, é necessário “reimaginar uma coalização entre o movimento negro e ativistas negros, articulada com os movimentos sociais defensores dessa modalidade de ensino [EJA]”, a fim de transformar currículos e práticas pedagógicas.