BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Eventos gastronômicos não estavam na modinha nos idos de 1999, o que não impedia a rádio Geraes de ter um programa dedicado à arte culinária de Belo Horizonte, apresentado por Eduardo Maya.
Foi na redação da rádio que a gerente Maria Eulália Araújo e o proprietário João Guimarães, ao lado de Maya, começaram a discutir sobre um concurso que colocasse em evidência a conhecida alma botequeira da capital mineira.
Em pouco tempo, o trio desenhou o que o evento precisava ter, seus principais fundamentos e como seria todo o funcionamento, mas faltava o nome.
Eulália e seus colegas já estavam ficando agoniados com a falta do batismo quando, em uma manhã, ao chegar na rádio para ler os jornais, ela viu a expressão “comida de boteco” em uma coluna de Josimar Melo na Folha de S.Paulo. “Me arrepio até hoje quando lembro, porque, em retrospectiva, foi um dia muito importante. Liguei para o João e disse, vai ser Comida di Buteco.”
Em abril de 2025, o evento completa 25 anos em sua cidade-mãe com 125 bares na disputa pelo prêmio de melhor boteco de Belo Horizonte, bem mais que os dez estabelecimentos que participaram da primeira edição. Aliás, são 124 competidores. O Bar do Careca, primeiro vencedor, com uma língua de boi, entra como hors-concours, honraria inédita no evento.
“A gente conseguiu contribuir para que a palavra boteco fosse ressignificada”, conta Eulália, trajando uma camiseta com a inscrição “buteco com u”. “Mas, o mais importante, contribuímos para que esse grande ator, que é o dono de boteco, ganhasse o protagonismo merecido, e temos visto isso nesses anos, o dono do boteco virar popstar”, avalia.
Muitos dos proprietários das casas participantes, senhores com cabelos brancos -ou sem cabelo-, chamam Eulália de madrinha devido ao carinho com a cofundadora e com o evento em si, que costuma impactar positivamente a vida dos participantes. “É um marco para qualquer um que participe, [o evento] te dá uma chancela de bar bom, muda o conceito para quem frequenta. Fiz uma obra recente que não faria sem o Comida”, conta Ogro, que comanda a Toca do Ogro.
Com filas na porta no primeiro dia do evento, o Já To Inno estava prestes a fechar, em 2014, quando surgiu o convite. “O concurso me devolveu a dignidade”, diz Washington, que toca a cozinha, enquanto a irmã e o filho cuidam do salão lotado da casa, tricampeã entre 2014 e 2016.
Já o Pompéu, mesmo sem nunca ter vencido a competição botequeira, comemora o movimento no amplo salão. Só no primeiro fim de semana, vendeu 1.633 porções de sua isca de frango empanada em flocos de arroz.
Ampliações, melhorias de infraestrutura, estabilidade econômica e aperfeiçoamento profissional; itens que parecem sair de uma lista de desejos para qualquer dono de bar são citados em diferentes endereços de Belo Horizonte pela simples participação no evento, que acontece normalmente no mês de abril.
“Queremos que abril seja reconhecido como o mês da cultura de boteco no Brasil, que o mundo olhe para isso e fale, tem mais uma ocasião para visitar o Brasil. Porque o boteco raiz é um lugar em que o turista vai viver a experiência de brasilidade mais genuína que ele pode ter”, diz Eulália.
O evento estendeu suas fronteiras e acontece atualmente em 27 circuitos de norte a sul do país. São Paulo é o recordista de botecos, com 147 participantes.
Para vencer, não basta ter o melhor tempero ou sabor. Público e júri dão uma nota de 1 a 10 em quatro quesitos: petisco, higiene, atendimento e temperatura da bebida. O peso da nota é igual, 50% para o júri e 50% para os consumidores. Os 20% que tiverem a pior média ficam fora no próximo ano, o que deixa todos em estado de alerta -ninguém quer sair do evento.
O preço é o mesmo para todos os pratos (R$ 35), e só pode ter 20% de bolinhos no concurso (respeitando a ordem de inscrição). “Pessoal às vezes fica bravo comigo porque uso ingredientes que cabem no orçamento”, conta Mulão, que mora em cima do Bar do Mulão. Seu prato, o Mullé, leva chã de fora recheada com calabresa no molho de cebola caramelizada. “É o nosso Natal, o movimento triplica”, completa.
COMIDA DI BUTECO
Até 11/5 em 27 circuitos, incluindo BH, SP e RJ.
Pratos a R$ 35.
Confira os participantes em https://comidadibuteco.com.br/