SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – À frente do plano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) para reassentar moradores da favela do Moinho, o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Marcelo Cardinale Branco, afirma que o risco de morte e a insalubridade presentes na comunidade, que fica na região central da cidade de São Paulo, são incompatíveis com a atual política urbana estadual.

Com a proximidade do início das mudanças das famílias que aceitaram sair, prevista para esta terça-feira (22), a proposta tem recebido críticas de opositores do governo e de moradores descontentes com as condições oferecidas. As principais reclamações são de que os residentes estariam sendo pressionados a aceitar imóveis em locais distantes e com valores de financiamento além da capacidade financeira deles.

Em entrevista à reportagem na sede da secretaria, Branco rejeitou tais alegações. Refutou também acusações de que a motivação do governo seja a valorização imobiliária da vizinhança do futuro centro administrativo estadual, nos Campos Elíseos, na região central da cidade.

“É preciso primeiro dizer o que é a favela do Moinho. É uma comunidade que está há décadas em local extremamente perigoso. As pessoas vivem entre duas linhas de trem, sem nenhuma proteção. É uma área que tem um só um acesso, para entrada e saída. Já houve alguns incêndios. Há inclusive crianças vivendo ali. É dever do Estado proteger essas famílias”, afirma.

“Estamos indo através do convencimento para mostrar que há soluções para que elas possam viver melhor e não naquele lugar tão insalubre e tão perigoso”, diz o secretário.

Branco sustenta sua afirmação sobre o dado de que aproximadamente 90% das cerca de 800 famílias cadastradas no local entregaram documentos para aderir ao financiamento imobiliário subsidiado pela empresa estatal de habitação CDHU. Número alcançado por meio de mais de 2.000 reuniões individuais com pessoas interessadas na proposta, segundo o governo.

Para o secretário, parte das críticas ao projeto vem de grupos que possuem ganhos financeiros com estabelecimentos comerciais dentro da comunidade e até mesmo com o tráfico de drogas.

“Quanto à resistência, temos pessoas que possuem comércio. Temos um tráfico de drogas bastante acentuado no centro, que abastece a cracolândia. É natural que tenham opiniões contrárias à retirada da favela do Moinho, que na minha opinião são muito inferiores do ponto de vista de legitimidade do que defender a vida das pessoas que querem sair.”

As afirmações do secretário têm como base relatos e registros fotográficos de agentes da CDHU que trabalharam durante cerca de oito meses realizando cadastramentos de famílias e catalogando imóveis na comunidade.

Os registros mostram algumas casas sem banheiro, com uso de sanitários coletivos e sujos, além de instalações elétricas irregulares e com fios expostos próximos a habitações com paredes de madeira.

Apontamentos dos técnicos da CDHU também mencionam relatos de tuberculose e presença de escorpiões. Não há no relatório, porém, a quantidade dessas ocorrências.

“O primeiro dever nosso é ser uma secretaria de desenvolvimento urbano e habitação. Então, acreditamos que temos que cuidar da segurança e do desenvolvimento [das moradias], e não apenas da localização. Ali [na favela do Moinho] é evidentemente um local onde não é possível fazer uma regularização [fundiária] porque isso coloca vidas em risco”, argumenta Branco.

Advogados do Escritório Modelo da PUC-SP, que há cerca de 15 anos representam os moradores, afirmam que foi a falta de uma política de regularização ao longo de quase quatro décadas que contribuiu para a precarização do local. Argumentam que, sem a segurança da posse, os moradores sempre tiveram receio de gastar dinheiro para melhorar as moradias.

Ainda precárias em muitos aspectos, as condições de infraestrutura na comunidade melhoraram devido à chegada de saneamento e abastecimento de água pela Sabesp, a partir de 2022.

Casas de madeira e materiais improvisados ainda representam quase 27% das habitações. A alvenaria com ou sem revestimento externo está presente em 73% das fachadas, segundo dados coletados pelo governo sobre as 931 moradias catalogadas.

Na comunidade, a reportagem conversou com diversos moradores que afirmaram terem comprado suas casas por valores entre R$ 10 mil e R$ 15 mil, parcelados em alguns anos. O valor de financiamento imobiliário substancialmente maior para morar fora da favela foi um dos pontos de incerteza mencionados pelos resistentes quanto à proposta de reassentamento.

Na política de crédito da estatal paulista de habitação popular, o morador paga por 30 anos parcelas mensais equivalentes a 20% da sua renda, seja ela qual for. Com essa regra, a CDHU chega a arcar com aproximadamente 70% do valor do imóvel, calcula a companhia.

Os limites para financiamento são unidades com valores de R$ 250 mil, para imóveis na região central da capital paulista, e de R$ 200 mil para unidades em outros bairros ou cidades.

O governo informou possuir cerca de 1.000 unidades na região central -pouco mais de cem estão prontas- e outras quase 500 em bairros de outras regiões para moradores do Moinho.

Nos casos em que o morador irá esperar pela unidade, há oferta de auxílio moradia de R$ 800 para custeio do aluguel. O programa também oferece R$ 2.400 para despesas com a mudança.

Dona da área onde está a favela do Moinho, a administração federal emitiu na última segunda-feira (14) uma nota na qual pede aumento dos valores de crédito e de auxílio moradia, além de gratuidade para famílias mais vulneráveis. O governo Lula (PT) condiciona o atendimento das exigências à doação do terreno ao estado, onde um parque deverá ser construído.

A nota da SPU (Secretaria de Patrimônio da União) foi criticada pelo governo estadual, que sugeriu a participação federal no complemento ao crédito oferecido pelo estado.