RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) – Parte da defesa do atacante Bruno Henrique no inquérito que apura a suspeita de manipulação de partidas passa por tentar tirar credibilidade do alerta das casas de apostas que gerou a investigação.
Os advogados do jogador, numa manifestação em novembro, fizeram um ataque ao material da Associação Internacional de Integridade de Apostas (Ibia, na sigla em inglês).
Houve também uma crítica direta pelo envolvimento da Betano no alerta sobre apostas de cartão amarelo a Bruno Henrique no jogo Flamengo x Santos pelo Brasileirão 2023. A empresa patrocina o Atlético-MG, rival do Flamengo na decisão da Copa do Brasil daquele ano, e a operação foi realizada dias antes da final.
Essa linha de contestação aconteceu ainda antes da divulgação do conteúdo das conversas de Whatsapp encontradas pela Polícia Federal. Foram esses materiais que embasaram o indiciamento feito nesta semana.
A TENTATIVA DA DEFESA
A Betano é uma das casas de apostas ligadas à Ibia. A empresa também é patrocinadora do Atlético-MG e está no naming rights da Copa do Brasil e do Brasileiro negócios feitos junto à CBF.
Os advogados citaram essa relação comercial com o Galo, pontuando que a final da Copa do Brasil contra o Flamengo aconteceu “na mesma semana em que a espetaculosa e truculenta operação policial foi deflagrada em seu prejuízo”. Foi uma referência aos cumprimentos de mandados de busca e apreensão contra o jogador.
Advogados de defesa de Bruno Henrique reclamam que Ministério Público “abraçou como prova suprema, absoluta e incontestável” o alerta emitido pelas casas de apostas. “Não há motivo algum para se atribuir credibilidade cega absoluta às informações da referida associação de casas de apostas”, disseram os advogados de Bruno Henrique na peça processual.
Na tentativa de invalidar o relatório, sobrou até para a CBF. “A CBF, que também possui vínculos de patrocínio com a Betano, resolveu encaminhar (o relatório) à Polícia Federal em 1º de agosto de 2024, no dia seguinte à vitória do Flamengo sobre o Palmeiras, nas oitavas de final da Copa Betano do Brasil”, escreveram os advogados.
Naquela ocasião, a defesa ainda pontuou que nem falta houve no lance que gerou cartão amarelo a Bruno Henrique.
A Justiça do Distrito Federal não atendeu ao pedido da defesa de Bruno Henrique. O inquérito seguiu. Até que veio nesta semana o relatório da Polícia Federal.
O MOVIMENTO NA BETANO
As investigações já apontavam que seis das 14 apostas suspeitas foram feitas na Betano. E elas foram travadas pela plataforma quando surgiu a suspeita de manipulação.
Isso envolveu jogos realizados nas contas de Wander Nunes Pinto Junior, o Juninho, irmão de Bruno Henrique, Ludymilla Araújo Lima, cunhada do atacante, e Poliana Nunes, prima de BH.
No segundo núcleo de apostadores, foram identificadas mais três apostas na Betano, em nome de Andryl do Nascimento dos Reis, Henrique Mosquete do Nascimento e Rafael Bassan.
Das apostas do mercado de cartões do Flamengo x Santos, 98% estavam ligadas diretamente à atuação de Bruno Henrique, segundo consta no alerta inserido no processo.
A retenção do pagamento pelas apostas gerou preocupação imediata entre os investigados.
Juninho trocou mensagens com Claudinei Mosquete Bassan, o amigo que, segundo a PF, levou a informação a respeito do cartão de Bruno Henrique ao outro número de apostadores.
“Da Betano já caiu aí?”, indagou Juninho.
“Nada, viado”, respondeu Claudinei, ainda na noite de 1º de novembro de 2023, data do Flamengo x Santos.
Ludymilla enviou um e-mail à Betano e teve resposta dois dias depois do jogo.
“Informamos que a aposta encontra-se em aberto devido a uma investigação por parte do departamento de traders. Após a conclusão desta investigação, iremos lhe informar por e-mail sobre a situação da sua aposta”, informou a empresa na época.
Segundo o UOL apurou, o mercado de traders é quem dispara os alertas para a Ibia.
Como tudo aconteceu praticamente ao mesmo tempo do jogo, a Betano entende que esse modus operandi afasta as acusações de que agiu para favorecer o Atlético-MG ou por interesse da CBF no caso.
“A integridade esportiva é um pilar fundamental para a promoção de um ambiente de apostas responsável. Os operadores regulamentados e autorizados pela Secretaria de Prêmios e Apostas associados ao IBJR, possuem sistemas de monitoramento baseados em inteligência artificial que analisam diariamente padrões de apostas. Quando uma suspeita de fraude é identificada, as operadoras reportam essas informações diretamente a organismos internacionais como a IBIA, principal voz global sobre integridade para o setor de apostas online. Se confirmadas as suspeitas, a IBIA encaminha as informações às autoridades brasileiras competentes para as devidas providências. Ou seja, é a regulamentação e os operadores de apostas regulados que garantem que mecanismos de controle operem de forma eficaz, preservando, assim, os princípios de jogo íntegro e responsável”, explicou Fernando Vieira, presidente executivo do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR).
Até agora, o rendimento das apostas dos envolvidos no caso Bruno Henrique não foi liberado pela empresa.
A defesa de Bruno Henrique não se manifestou desde o indiciamento por parte da Polícia Federal. O próximo passo no processo é ver se o Ministério Público vai oferecer denúncia e tornar os investigados em réus.
“É uma comprovação do quanto o trabalho das empresas de integridade esportiva e das próprias bets são fundamentais neste combate, pois as suspeitas foram observadas quase que simultaneamente às apostas. É um serviço que já vem desde antes da regulamentação, com autorização provisória deste processo já a partir de 2024, inclusive com as casas que conseguiram a outorga por meio da regulamentação”, disse Bernardo Freire, consultor jurídico da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL).