BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Lançado há pouco mais de um ano com a presença do presidente Lula (PT), o Plano Juventude Negra Viva tem sido afetado por recorrentes trocas de equipe, em alguns casos por motivação política. Entidades do movimento negro criticam os resultados do programa, uma das principais iniciativas do Ministério da Igualdade Racial, chefiado por Anielle Franco.
Ao menos três pessoas ligadas diretamente ao projeto deixaram a pasta nos últimos meses. Além delas, outras três que em algum momento atuaram na estratégia também foram substituídas.
O Plano Juventude Negra Viva surgiu com a promessa de uma atuação ampla, em parceria com mais 17 ministérios da Esplanada. O objetivo é combater o racismo estrutural e reduzir a vulnerabilidade de jovens negros.
Entre as medidas previstas estão bolsas de R$ 500 por mês para beneficiários durante cursos de capacitação, além de apoio ao projeto nacional para o uso de câmeras corporais por policiais com foco em evitar abordagens violentas contra esse grupo.
As mudanças nas equipes começaram em julho do ano passado. Secretários, diretores e outros integrantes da pasta, vinculados ao programa, foram demitidos ou pediram demissão.
O caso mais recente de baixa é o de Márcia Lima, então secretária de Ações Afirmativas, Combate e Superação do Racismo. Márcia saiu da pasta fazendo reclamações sobre falta de autonomia e críticas à comunicação do governo Lula.
Márcia Lima atuou ao lado de Yuri Silva, ex-secretário de Gestão do Sinapir (Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial), um dos principais nomes do troca-troca que afetou o Juventude Negra Viva. Ele atuou também como diretor no ministério e coordenou a elaboração e lançamento do plano.
Silva foi exonerado após voltar de férias, em outubro de 2024, um mês depois das denúncias envolvendo o ex-ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida -que teria importunado sexualmente a ministra Anielle, acusação que ele nega. Silva e Almeida haviam trabalhado juntos anteriormente.
O cargo de Yuri Silva foi ocupado pelo antropólogo Clédisson Geraldo dos Santos, que era coordenador no gabinete da deputada Dandara Tonantzin (PT-MG).
Luiz Paulo Bastos da Silva, um dos principais nomes do Juventude Negra Viva, também foi exonerado, em 12 de março de 2025. Ele era diretor de Políticas de Combate e Superação do Racismo, responsável pela interlocução com outras pastas para articular as ações interministeriais.
Luiz Paulo foi substituído no cargo pelo presidente municipal do PT no Rio de Janeiro, Tiago Santana, que foi secretário parlamentar da deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ).
Procurado para comentar a substituição, Tiago Santana afirmou que o convite para integrar o ministério se deu por sua experiência na gestão da pauta e que sua trajetória no PT não teve relevância na nomeação. Ele afirmou ainda que a direção municipal do partido está em processo de transição interna, e que seu mandato se encerra em junho. Clédisson não se manifestou.
Integrantes do ministério relataram à reportagem incômodo com a maneira como ocorreram os desligamentos, sem explicações ou consultas às equipes. Por serem cargos comissionados, as demissões e remanejamentos não precisam de justificativa oficial.
Outros nomes que, segundo integrantes do ministério, atuavam no programa e deixaram a pasta foram Ronaldo Adriano Fiúza Cardoso (chefe de gabinete da Secretaria de Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial), Izael Gomes da Silva (da divisão de Comunicação da Senapir) e Laís Helena Rodrigues de Queiroz (coordenadora do Grupo de Trabalho de aperfeiçoamento da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial).
Esses cargos já têm substitutos ou aguardam a publicação da exoneração para novas nomeações.
Da equipe da principal do programa, apenas dois integrantes continuam: a secretária-executiva do ministério, Roberta Cristina Eugênio, e o chefe de Divisão de Monitoramento do plano, Jean Tiemoko.
Procurado, o ministério afirmou que as saídas ocorreram por razões diversas, seja por “motivos pessoais” ou visando a “qualificação da política pública, como é comum na administração pública”.
O financiamento do plano também é alvo de queixas. Frei David, fundador da Educafro, afirma que a organização participou de caravanas para a formação do programa, quando havia cobranças para ampliação do orçamento.
“O programa Juventude Viva é uma excelente proposta. No entanto, nenhum bom programa funciona com dinheiro a conta-gotas. Ele não decolou ainda, como a causa merece”, diz. “O investimento do governo federal, neste programa, é muito curto”.
Leandro Vilas, coordenador da Cipó, voltada à participação social e política de jovens, conta que a organização também participou da elaboração do programa, mas diz não ver as ações implementadas.
“A gente só teve acesso ao processo de construção do plano. A gente tem percebido, inclusive, que o plano está parado”, diz.
O ministério afirmou, em nota, que nenhuma das alterações de equipe impactou a execução do Juventude Negra Viva, que é gerido em parceria com a Secretaria-Geral da Presidência da República e monitorado por um comitê gestor.
“O ministério reafirma o seu compromisso com o aprofundamento e qualificação da política, que terá anunciado em breve um plano de expansão das adesões, a atualização das prioridades e a ampliação dos investimentos globais, que já ultrapassam os R$ 600 milhões”.
Sobre as críticas feitas aos resultados, o ministério afirma que a execução total é prevista até 2027 e que, no primeiro ano, o plano teve oito das 10 ações prioritárias alcançadas -como o lançamento das novas diretrizes para câmeras corporais, a criação do Pronasci Juventude, voltado à redução do encarceramento de jovens negros e periféricos, e a ampliação de bolsas para o serviço público federal, todos voltados ao público negro ou quilombola.