BELÉM, AL (FOLHAPRESS) – O MPF (Ministério Público Federal) e o MP (Ministério Público) do Pará recomendaram a imediata anulação de um contrato futuro de venda de créditos de carbono firmado pelo governo do Pará, no valor de R$ 1 bilhão.
O acordo foi feito com uma entidade chamada Coalizão Leaf e anunciado pelo governador Helder Barbalho (MDB) em setembro de 2024.
A recomendação do MPF e do MP foi assinada no último dia 14 e é direcionada ao governador do Pará.
O anúncio do contrato foi feito pelo governo local como um ato relacionado à preparação para a COP30 (conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas), que será realizada em Belém em novembro. O mecanismo de créditos de carbono foi discutido e aprimorado no âmbito dessas conferências.
Pelo acordo anunciado por Barbalho, o acordo com a Coalizão Leaf garante a venda antecipada de R$ 1 bilhão em créditos de carbono, gerados por um ente jurisdicional, em que o próprio estado assumem a dianteira na formulação e venda desses títulos. Estados amazônicos como Pará, Amazonas e Acre têm projetos nesse sentido, inclusive com intenção de venda direta dos créditos.
O acordo envolve a venda de 12 milhões de créditos de carbono a um preço de US$ 15 por tonelada. Um crédito equivale a uma tonelada de CO2 que deixa de ser emitida para a atmosfera em razão do desmatamento da floresta que é evitado.
O Pará geraria esses créditos a partir da preservação de áreas de floresta. Comunidades tradicionais, principalmente indígenas, quilombolas e de ribeirinhos, protestam contra o acordo costurado por Barbalho.
Agora, MPF e MP apontam a necessidade de anulação imediata do acordo. Segundo procuradores da República e promotores de Justiça, existe um “alto grau de especulação gerado por essa modalidade contratual”. Um procedimento de investigação foi aberto pelo MPF para apurar as condições estabelecidas no acordo.
Em nota, o governo do Pará afirmou que o contrato é um pré-acordo com condições comerciais futuras, sem transações efetivas ou obrigação de compra antes da verificação da redução de emissões. “Está dentro da legalidade. A venda só será concluída caso os créditos sejam devidamente emitidos após a verificação dos resultados”, disse.
Não há possibilidade de revenda dos créditos, e o sistema jurisdicional é elaborado com transparência, cita a nota. “Em breve serão iniciadas as consultas prévias, livres e informadas junto a comunidades indígenas, quilombolas e extrativistas sobre o sistema.”
O contrato foi assinado entre o estado do Pará por meio da Companhia de Ativos Ambientais e Participações do Pará e a Emergent Forest Finance Accelerator apontada como coordenadora administrativa da Colização Leaf, como consta na recomendação de MPF e MP.
Compõem a Leaf os governos dos Estados Unidos, Reino Unido, Noruega, República da Coreia e grandes corporações mundiais, como Amazon, Bayer, BCG, Capgemini, H&M Group e Walmart, cita a recomendação.
As empresas se comprometeram a comprar 5 milhões de créditos de carbono, e o restante seria vendido a outros empreendimentos, como forma de compensação das emissões de CO2 por essas empresas, segundo anunciado pelo governo do Pará em setembro.
O MPF e o MP citam a possibilidade de “alto grau de especulação” e afirmam na recomendação que a modalidade contratual adotada “influencia diretamente os efeitos na Bolsa de Valores, na regulação do mercado e na corrida empresarial para compra desses ativos”.
“São os países do norte global e suas megacorporações, historicamente responsáveis pela degradação ambiental e desigualdades sociais no mundo, que estão definindo o valor da tonelada de carbono de florestas paraenses, desconsiderando seu custo social do ponto de vista da gestão pública”, afirmaram procuradores e promotores.
Conforme a recomendação, essa especulação “pode gerar abordagens assediosas e considerável pressão sobre povos indígenas e comunidades tradicionais no interior do Pará”.
A venda de créditos jurisdicionais ocorreria no mercado voluntário, segundo MPF e MP. O mercado voluntário não passa pelo poder público.
“Créditos jurisdicionais não podem ser objeto de contratos futuros, pois não devem ser considerados commodities”, cita a recomendação.