SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em março de 2025, Kilmar Abrego García foi detido por agentes do Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE, na sigla em inglês) enquanto dirigia com seu filho pequeno no estado de Maryland, nos Estados Unidos.

Três dias depois, sem aviso prévio, processo legal ou audiência, ele foi deportado para El Salvador -país de onde havia fugido ainda adolescente em decorrência da violência de gangues. A deportação ocorreu apesar de uma ordem judicial vigente que proibia sua remoção do território americano. O governo dos EUA posteriormente admitiu que o episódio foi resultado de um erro administrativo.

A Justiça então determinou o retorno imediato de García, mas o governo afirmou que não poderia obrigar El Salvador a devolvê-lo. Hoje, ele permanece preso em uma penitenciária de segurança máxima conhecida por abrigar membros de gangues -o mesmo tipo de violência da qual ele fugiu mais de uma década antes. O caso está sendo analisado pela Suprema Corte dos EUA e é acompanhado de perto por juristas e especialistas em imigração, que alertam para os riscos que o caso representa ao devido processo legal.

O episódio reacendeu críticas à condução das políticas imigratórias sob o governo Trump, especialmente no que diz respeito à deportação de estrangeiros com status legal ou com proteção judicial reconhecida. Para muitos, a história de García levanta dúvidas sobre o alcance das garantias constitucionais para imigrantes em solo americano.

QUEM É KILMAR ABREGO GARCÍA

Kilmar Abrego García nasceu em julho de 1995, em San Salvador, capital de El Salvador. Filho mais novo de uma família trabalhadora, cresceu ao lado da mãe, que mantinha um pequeno comércio de alimentos vendendo pupusas, prato típico do país. A presença de gangues violentas era constante no bairro onde moravam.

Quando o grupo Barrio 18 tentou extorquir dinheiro do comércio da família, ameaçou forçar seu irmão mais velho a se unir ao grupo. Para protegê-lo, a família o enviou aos EUA. Tempos depois, ele também passou a ser alvo de ameaças diretas e, aos 16 anos, fugiu sozinho para os EUA, atravessando a fronteira em 2011.

No estado de Maryland, passou a trabalhar com construção civil e iniciou uma nova vida. Em 2016, conheceu Jennifer Stefania Vasquez Sura, uma cidadã americana com quem se casaria três anos depois. O casal teve um filho, nascido nos EUA, e juntos também criam dois filhos de Jennifer de um relacionamento anterior, ambos com deficiência. García comparecia regularmente às exigências das autoridades migratórias.

Em 2019, ele foi detido em um estacionamento enquanto buscava trabalho como diarista. Um homem o acusou de ser membro da gangue salvadorenha MS-13, mas a acusação não foi comprovada e ele não chegou a ser indiciado por nenhum crime. Apesar disso, o governo seguiu com o processo de deportação, baseando-se em argumentos frágeis, como as informações de um policial posteriormente suspenso por má conduta. Um juiz, no entanto, reconheceu que ele corria risco de vida se retornasse a El Salvador e concedeu a ele o status de “retenção de remoção” -proteção legal que o autorizava a viver e trabalhar nos EUA, ainda que sem direito à residência permanente.

Apesar dessa proteção, a deportação de 2025 ocorreu de forma sumária e sem respaldo jurídico. A defesa de García afirma que ele nunca teve problemas com a Justiça após a concessão do status legal, mantendo apenas os contatos obrigatórios com o ICE. Desde sua remoção, Jennifer e a família têm lutado por sua repatriação, enquanto ele segue encarcerado em El Salvador, exposto ao mesmo cenário de violência do qual havia escapado ainda na adolescência.