BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Gabão realiza neste sábado (12) as primeiras eleições para presidente desde que o então ditador do país, Ali Bongo, foi derrubado por militares em um golpe de Estado, em agosto de 2023.

O líder do levante, o general Brice Oligui Nguema, que tem laços familiares com Bongo, assumiu o país após o golpe como presidente da transição —e hoje é o principal candidato no pleito. Líderes opositores o acusam de usar sua posição e o aparato de Estado para restringir a oposição e controlar o processo eleitoral.

Inicialmente, a junta que assumiu o país após a destituição de Bongo falou em dois anos de um governo de transição até a organização de novas eleições. Nguema, porém, antecipou o pleito em seis meses. O general agora se apresenta como candidato civil e afirmou em entrevista ter renunciado a seu posto militar, embora, segundo a agência de notícias Reuters, ele ainda não o tenha feito formalmente.

O general-presidente é apoiado pelo Partido Democrático Gabonês, legenda do líder destituído pelo próprio Nguema e maior força política de um país que por décadas viveu sob um sistema de partido único controlado por Omar Bongo e depois por seu filho, Ali, que declarou não ter ambições políticas após o golpe.

“Quando [Nguema] visita uma província, tudo para. Todos os funcionários públicos vão ao seus comícios. Nunca foi assim”, afirma o principal candidato opositor, Alain Claude Bilie-By-Nze (lê-se “bili binzê”), que diz que os militares devem “voltar para os quartéis”.

Há outros seis candidatos na disputa, com apoio público pouco relevante: Thierry Ngoma, Axel Ibinga, Alain Boungoueres, Zenaba Changing, Stéphane Iloko e Joseph Essigone.

Apesar do golpe recente e das acusações de Bilie-By-Nze contra Nguema, os dois não costumam se contradizer essencialmente em termos de propostas, e o cenário esperado é de relativa continuidade política.

O general-presidente, afinal, era chefe da guarda presidencial de Bongo, e Bilie-By-Nze, primeiro-ministro no último ano de Bongo no cargo —era prerrogativa do presidente nomear o premiê. Bongo não foi preso após o golpe, embora sua esposa e filho estejam detidos e sejam acusados de corrupção.

A plataforma de Nguema é calcada em discurso anticorrupção, e Bilie-By-Nze fala em reordenar as finanças públicas e reduzir a dependência da França, antiga colonizadora do país africano.

Diferentemente de outras ex-colônias francesas no continente que passaram por golpes militares recentes, o Gabão manteve desde o levante boa relação com a França. Nguema foi recebido pelo presidente francês, Emmanuel Macron, em maio do ano passado, em Paris.

A antiga metrópole tem visto sua influência minguar por todo o continente, em particular em suas ex-colônias no Sahel, como Burkina Fasso e Níger. Os processos de colonização e descolonização que ocorreram na África francófona no século 20 são peculiares em comparação ao de antigas colônias de outros países europeus, como Reino Unido e Portugal.

A França desenhou como condição para as independências uma série de acordos que, na prática, manteve os novos países profundamente vinculados a Paris, inclusive financeiramente, com a imposição do franco CFA como moeda única e com câmbio fixo ao franco, algo que se mantém hoje com o euro.

Além disso, parte dos acordos diz respeito a questões de segurança e ao estabelecimento de bases militares francesas nesses países, alguns dos quais permitiam inclusive intervenção armada da França em certos casos. Paris tem gradualmente retirado tropas de várias dessas nações nos últimos anos.

Membro da Opep+, Libreville também é fortemente dependente da exploração de petróleo —cerca de um terço do seu PIB vem daí, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI)— e o desemprego entre jovens chega a quase 40%, de acordo com o Banco Mundial.

Em novembro passado, o Gabão aprovou nova Constituição após referendo com mais de 50% de participação de eleitores. O texto, aprovado pela Justiça e já em vigor, determina que os próximos presidentes terão mandatos de sete anos e poderão concorrer apenas uma vez à reeleição.

Além disso, a nova Carta anistiou os participantes do golpe de 2023, aboliu a função de primeiro-ministro e proibiu a sucessão dinástica. Críticos de Nguema defendem que o texto deveria ter vetado sua participação no pleito deste sábado, em razão de sua função no governo de transição.

Em texto publicado no site The Conversation, o cientista político americano Douglas Yates, especializado em política africana e do Gabão, afirma que o pleito contará com um novo código eleitoral, aprovado em janeiro, a partir do qual se prevê um sistema biométrico de registro.

Yates afirma, porém, que a contagem e os resultados podem demorar até duas semanas para serem conhecidos. Há previsão, segundo o governo, de observadores da União Africana e da União Europeia.