BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – O novo governo alemão, capitaneado por Friedrich Merz, promete uma política de asilos mais restritiva, controle de fronteiras e deportações frequentes para Síria e Afeganistão. O aceno aos eleitores da extrema direita, porém, ainda precisa ser melhor combinado com os parceiros de coalizão.

No dia seguinte ao anúncio do acordo com os conservadores, os sociais-democratas apresentaram uma primeira fissura interna no SPD. Uma ala do partido responsável pela formulação de políticas relacionadas à imigração questionou diversos pontos do acerto com a aliança CDU/CSU, que desde a campanha eleitoral classifica o tema como existencial para o centro político do país.

Segundo Aziz Bozkurt, que preside a comissão de migração e diversidade do SPD, o plano apresentado é um conjunto de medidas desconexas, que não compõem uma política sustentável sobre o assunto. Funcionam apenas “como catalisador de forças de direita”, declarou Bozkurt ao jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, nesta quinta-feira (10).

Ele vê uma série de inconsistências no acordo, como a lei de asilo trocar o princípio da investigação pelo da evidência, dificultando muito o processo de aprovação. “Para um social-democrata isso é difícil de aceitar.” Bozkurt, que também atua no governo de Berlim, afirmou que a coalizão, do jeito que está, mina as pretensões do já combalido SPD para as próximas eleições, previstas para 2029.

A legenda teve uma das piores votações de sua história no último pleito, em fevereiro, e se arrasta nas pesquisas de opinião, na faixa dos 15%, atrás dos colegas de coalizão e da AfD, Alternativa para Alemanha, a sigla de extrema direita do país. Segundo os últimos levantamentos, o partido populista ultrapassou numericamente a CDU, 25% a 24%, o que serve de justificativa para a preocupação e o discurso linha dura dos conservadores.

Seria apenas divergência partidária não fosse o fato de o SPD ter que votar internamente a adesão à coalizão, que, na política alemã, é um compromisso firme, de políticas negociadas, que vai muito além da distribuição de cargos. Os 358 mil filiados do partido serão convocados a votar eletronicamente nas próximas semanas.

É improvável que haja uma reversão, no entanto. A ala mais pragmática do SPD, que encabeçou as negociações, obteve ganhos razoáveis em comparação ao tamanho de sua bancada, com sete ministérios, incluindo pastas importantes como Defesa e Finanças. Emplacou ainda uma promessa de campanha, o salário mínimo de 15 euros.

Merz, que dias antes da eleição causou um alvoroço no país ao admitir contar com votos da AfD para uma moção no Parlamento, na esteira de um episódio de violência protagonizado por imigrante, ganhou nesta quinta-feira (10) um apoio inusitado na discussão.

Em uma entrevista à imprensa alemã, Angela Merkel aprovou o recrudescimento da política imigratória embutida no acordo de coalizão. “Há diferenças de dicção e tonalidade”, afirmou a ex-premiê, quando solicitada a comparar a nova política com a sua _em 2015, ganhou projeção mundial sua frase “Wir schaffen das” (vamos conseguir) ao abrir as fronteiras a centenas de milhares em um momento de grande hostilidade a refugiados na Europa.

Festejada à época, a atitude rende muitas críticas a Merkel atualmente, mas sua fala é um sinal político importante para o futuro primeiro-ministro. Colegas de CDU, os dois colecionam um passado de diferenças dentro do partido conservador. Merz chegou a se afastar da política nos anos 2000 e só voltou ao Bundestag, o Parlamento alemão, quando Merkel anunciou que não concorreria a um quinto mandato.

Também elogiou o acordo de coalizão alemão o governo da Áustria, que prometeu colaborar com o controle mais rígido. “Estamos confiantes de que as ações das autoridades alemãs nas fronteiras internas da UE se baseiam na ordem jurídica”, disse em comunicado o Ministério do Interior austríaco.

O assunto, porém, está longe do consenso. O governo suíço reagiu às pretensões alemãs de rejeitar solicitantes de asilo indesejados já nas divisas do país. “A Suíça reserva-se o direito de reagir adequadamente se, em nossa opinião, as rejeições violarem a lei aplicável”, declarou um porta-voz.