SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Alexandre Herchcovitch retomou a sua origem nos inferninhos da noite de São Paulo para o desfile de sua nova coleção, nesta segunda, como parte do calendário da São Paulo Fashion Week. O estilista levou 500 convidados para a balada LGBTQIA+ Blue Space, na Barra Funda, e pôs todo mundo em pé em torno da passarela, como se fosse o gargarejo de um show de rock.

E como quem sai à noite é para brilhar, Herchcovitch mandou para a passarela uma série de looks neon que reluziam na luz negra cravejados de cristais Swarovski que também brilhavam —até as alças dos vestidos e os brincos, feitos com as pedras, reagiam à iluminação de balada. Um colorido que remetia ao desbunde da noite disco.

Foram 46 looks que brincaram com as silhuetas e foram apresentados em blocos. Primeiro, uma série inspirada em camisas de rúgbi. As proporções eram ampliadas, a modelagem baseada em silhuetas geométricas dos anos 1960, mas com as mangas volumosas. Na sequência, entraram três vestidos de veludo cotelê, com recortes de tecidos vintage no busto. Por fim, os vestidos de látex amplos que fluíam com o caminhar. Teve também um bloco preto, bem gótico, com um modelo desfilando um conjunto de jaqueta e calça em couro à la Rick Owens, além de um vestido com recortes no bumbum.

Segundo o estilista nada disso é novidade. Seus primeiros desfiles foram em boates, com todo mundo de pé. Dois outros já tiveram roupas que brilhavam no escuro ou mudavam de cor.

“Estou preferindo rever o meu próprio repertório do que ficar fazendo uma coisa muito aleatória, sabe? Eu já experimentei de tudo, já fiz vários temas, agora quero refazer algumas coisas”, disse horas antes do desfile e logo após o ensaio de passarela com modelos. E, assim, revendo sua obra, Herchcovitch apresentou roupas-desejo, usáveis, que prescindiam de contação de histórias.

Mais conhecido pelo street style, Herchcovitch tem investido agora também em vestidos de festa, com o olhar voltado para a noite. Na passarela desta SPFW, o destaque ficou para peças inspiradas no século 18, com estruturas que pareciam corsets.

Segundo ele, as buscas pelos seus vestidos sob medida cresceram sobretudo após Fernanda Torres usar um modelo azul sem alças no Festival de Veneza, no início da campanha de “Ainda Estou Aqui” em premiações.

“Ela veio no meu ateliê, provou e se identificou demais. Nós fizemos alguns ajustes, porque a roupa original tinha uma abertura atrás e ela queria fechar essa abertura. Então a gente fez sob medida”, conta o estilista que foi um dos únicos brasileiros escolhidos por Fernanda enquanto divulgava o filme vencedor do Oscar. Ele, porém, não acredita que ela tinha obrigação de escolher apenas grifes nacionais.

“Eu não gosto muito das críticas que fizeram a ela. Acho que a pessoa é livre para a usar o que quiser. Muitas das pessoas que a criticaram compram na Zara. É muito controverso”, comenta.

Veterano da SPFW, Herchcovitch afirma que o evento viveu muitos altos e baixos ao longo de seus 30 anos —completos agora—, ou desde quando ainda se chamava Phytoervas Fashion.

“No começo, houve um trabalho para que as pessoas acreditassem que no Brasil poderia se formar uma semana de moda com profissionalismo. Depois, quando isso foi entendido e todo mundo começou a ver, a noticiar, foi uma fase de internacionalização do evento e de algumas marcas.”

Depois do boom dos anos 2000 e 2010, Herchcovitch observou certo esvaziamento da SPFW nos últimos dez anos, quando algumas das etiquetas com as quais partilhou a passarela pararam de desfilar ou quiseram fazer seus próprios eventos independentes. “Eu continuo porque acho importante estar em uma semana de moda organizada.”

Um dos nomes mais proeminentes desta edição da SPFW sabe que agora os tempos são outros. Olha para sua trajetória e aceita vontades variadas, com consistência e identidade, sem se prender a uma narrativa fechada.