BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O anúncio da venda do Banco Master para o BRB (Banco de Brasília) lançou luz sobre uma disputa entre dois banqueiros que atravessam momentos opostos em suas relações com a cúpula do poder em Brasília.

De um lado, Daniel Vorcaro, 41, controlador do Master, que fez com que o banco acelerasse o crescimento nos últimos anos usando uma estratégia considerada agressiva de venda de CDBs (Certificados de Depósito Bancário) com alta remuneração aos aplicadores.

O bilionário de Belo Horizonte (MG) ganhou fama e expandiu suas conexões empresariais e políticas por meio de um estilo de vida considerado extravagante, com festas luxuosas, viagens exclusivas e financiamento de eventos, dos quais personagens influentes do país se tornaram frequentadores.

De outro lado, André Esteves, 56, chairman e sócio sênior do BTG Pactual, que se consolidou como um dos principais banqueiros do país desde o início da década de 1990 por um estilo arrojado de fazer negócios e discreto no trato pessoal.

A dupla tem disputado espaço no mundo político de Brasília nos últimos anos em busca de influência. Agora, o negócio envolvendo o Master mobiliza esses aliados, dando origem a uma disputa de narrativas sobre o eventual interesse do BTG no Master e os riscos envolvidos no negócio.

A operação também expõe o que vem sendo interpretado nos bastidores da capital federal como um realinhamento de forças, em que Vorcaro aparece como um personagem em ascensão, enquanto Esteves passou a colecionar críticas por seu estilo excessivamente agressivo de atuação.

A reportagem colheu relatos de empresários, políticos, lobistas e autoridades. As versões variam de acordo com o grau de proximidade com Vorcaro ou Esteves. Nos dois lados, há informações de que os banqueiros conversam pelo menos desde o último trimestre do ano passado a respeito da possibilidade de venda do Master ao BTG.

Procurados, Vorcaro e o BTG não se pronunciaram oficialmente sobre o assunto. Em comunicados oficiais ao mercado, o banco de Esteves tem afirmado que nunca fez proposta para aquisição de ativos ou de participação no capital social do Banco Master.

Aliados de Vorcaro acusam Esteves de manter o negócio em banho-maria sem colocar sobre a mesa uma proposta concreta para a aquisição, enquanto a situação do Master se deteriorava. Esses aliados afirmam que Esteves tentou pressionar o Master ao reduzir a distribuição dos CDBs pelo BTG, agravando a situação do banco.

A estratégia teria levado o controlador do Master a procurar o presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, para fechar um acordo. Esteves nega a interlocutores tal versão.

Seus aliados dizem que ele queria auxiliar Vorcaro, mas não faria sentido acelerar a compra diante de uma potencial desvalorização do Master a partir dos rumores de mercado de que o banco não conseguiria chegar a 2025. A avaliação foi que seria prudente esperar.

Três dias após o anúncio da negociação entre Master e BRB, Esteves reuniu-se com Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central, para tratar do tema. Segundo relatos, o banqueiro teria dito que a operação divulgada não parava em pé e que a autoridade monetária deveria fazer algo a respeito. Galípolo teria respondido que a avaliação seria técnica. Esteves nega a pessoas próximas o conteúdo do encontro e, procurada, a assessoria do BC respondeu apenas: “Sem comentários”.

Acostumado a encontrar portas abertas em Brasília, Esteves tem visto Vorcaro abrir espaço próprio nos gabinetes.

Na Câmara dos Deputados, o chairman do BTG foi muito próximo dos presidentes Eduardo Cunha (hoje no PRD-RJ), Rodrigo Maia (atual presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras) e Arthur Lira (PP-AL).

Em 2016, Cunha chegou a ser definido como “menino de recados de Esteves” em delação premiada do ex-senador Delcídio do Amaral. Em 2021, o banqueiro relatou que recebia ligações de Lira pedindo conselhos em áudio vazado de um evento fechado do BTG.

O cenário já não se repete. O atual presidente, Hugo Motta (Republicanos-PB), e seu grupo de aliados têm bom trânsito com Vorcaro, e pouco contato com Esteves. Contribui para isso a influência do senador Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP e ex-ministro da Casa Civil do governo Jair Bolsonaro (PL).

Nogueira atuou nos últimos anos como articulador político de Bolsonaro junto ao centrão e ao empresariado. Na avaliação de parlamentares, hoje ele exerce função similar para Vorcaro, estreitando seus laços com lideranças de Brasília.

Além disso, o senador apresentou no ano passado a chamada “emenda Master” para aumentar o valor de cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Crédito) de R$ 250 mil para R$ 1 milhão. Os CDBs Master ofereciam taxas que chegaram a 140% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário) e usava em sua campanha de marketing a cobertura pelo FGC.

A proposta de Nogueira foi engavetada após resistência das principais entidades ligadas ao setor bancário.

Por anos, Nogueira foi padrinho político de Paulo Henrique Costa, o PHC, presidente do BRB. Por isso, especulou-se que o senador também teria mediado os contatos entre Vorcaro e Costa. No entanto, pessoas próximas de ambos afirmam que Nogueira e o presidente do banco brigaram e não se falam mais.

No governo do Distrito Federal, Nogueira tem a vice-governadora Celina Leão (PP) como aliada. Provável candidata à sucessão de Ibaneis Rocha (MDB) em 2026 com apoio do próprio governador, ela disse ao jornal O Globo que só soube da negociação tocada pelo banco estatal do DF por meio da imprensa.

Vorcaro também é próximo de Antonio Rueda, presidente nacional do União Brasil, presença constante em eventos e festas promovidas pelo banqueiro.

Executivo dos mais próximos ao Planalto durante gestões petistas, Esteves hoje tem boa relação com Fernando Haddad, ministro da Fazenda, mas está distante do presidente Lula (PT). O mandatário incomodou-se com críticas públicas feitas pelo banqueiro ao governo mesmo após ter sido recebido três vezes no ano passado, o que fez com que a relação esfriasse. Para interlocutores, Esteves diz que essa visão é “papo de Brasília”.

Vorcaro, por sua vez, não tem relação com Haddad, que nunca o recebeu, mas tenta se aproximar de Lula, por meio do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, que é membro de conselho consultivo do Master. O órgão tem como objetivo expandir a rede de relações do banco e já teve Ricardo Lewandowski (ex-STF, atual ministro da Justiça) e Henrique Meirelles (ex-presidente do BC) nos seus quadros.

No governo Lula, o Master também tem relação com o ministro Rui Costa, da Casa Civil, e com Jaques Wagner (PT), líder do governo no Senado, ambos da Bahia. Eles são próximos de Augusto Lima, sócio de Vorcaro no banco.

Foi em 2018, durante a administração Costa na Bahia, que Lima comprou a rede estatal de supermercados Cesta do Povo, que comercializava produtos subsidiados. O governador assinou um decreto semanas depois segundo o qual os servidores públicos poderiam usar o CredCesta, um programa de crédito consignado, para comprar no Cesta do Povo, turbinando o negócio de Lima. Incorporado ao Master em 2019, o programa se tornou um dos mais rentáveis do banco.

Lima é casado com Flávia Péres, ex-Arruda, que foi deputada federal e também ministra da Secretaria de Governo de Bolsonaro.

No Supremo Tribunal Federal, Esteves e Vorcaro mantêm laços com os ministros que mais articulam politicamente. Gilmar Mendes é um dos principais interlocutores do banqueiro do BTG em Brasília, e os dois trocam avaliações informais sobre o país com frequência há anos.

Em 2024, por exemplo, Esteves participou de mesa sobre economia digital ao lado do ministro durante o Fórum Jurídico de Lisboa, evento que é organizado pelo IDP, a faculdade de Mendes. O BTG ofereceu um jantar privado a participantes do fórum.

Vorcaro tenta fazer de Alexandre de Moraes um aliado. Reportagem de O Globo mostrou que o Master contratou para representá-lo o escritório Barci de Moraes, onde trabalham a mulher, Viviane, e dois filhos do ministro. Pessoas próximas ao ministro afirmam que o banqueiro costuma se aconselhar sobre temas do direito com Viviane há algum tempo.

Ao longo dos anos, a aproximação se deu por meio de eventos patrocinados pelo banqueiro. Em 2022, ele custeou um banquete para ministros do STF no Fasano em Nova York durante um evento do Lide na cidade. Dois anos depois, bancou parte de um fórum jurídico organizado pelo grupo privado Voto, em Londres. Moraes participou dos dois encontros, assim como Mendes.

Entre os participantes dos eventos estão nomes que são disputados pelos banqueiros ou que buscam se aproximar deles.

Além de Mendes e Moraes, participaram Ciro Nogueira, Hugo Motta, o senador Davi Alcolumbre (União-AP, hoje presidente da Casa), Ricardo Lewandowski, o ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia) e o ex-ministro das Comunicações de Bolsonaro Fábio Faria

Faria presta serviços de relações institucionais para o BTG por meio de empresa que tem em sociedade com Bruno Bianco, ex-advogado-geral da União do governo Jair Bolsonaro.