MILÃO, ITÁLIA (FOLHAPRESS) – Enquanto os mais festivos vão correr de uma exposição para outra, atrás de novidades do design e doses de drinques alaranjados, os mais preocupados passarão os dias a discutir os efeitos em seus negócios de uma possível guerra comercial mundial. São os extremos dos participantes da Semana de Design de Milão, que acontece entre 8 e 13 de abril.
Principal acontecimento, o Salão do Móvel, ou Salone, reunirá mais de 2 mil expositores, de 37 países, com expectativa de bater o número de visitantes do ano passado 370 mil pessoas, sendo 54% de fora da Itália. Desde os anos 1960, a feira se consolidou como a mais relevante do segmento.
Criado justamente para promover as exportações da indústria italiana, o Salone ocorre neste ano em meio ao nervosismo provocado pelas ameaças do presidente Donald Trump. Os Estados Unidos são o segundo mercado que mais compra do setor na Itália, cujas exportações já tinham fechado em leve queda no ano passado, em quase 20 bilhões de euros.
O temor é que as empresas italianas, que exportam mais da metade da produção, percam terreno para móveis e acessórios chineses, em caso de aumento de tarifas norte-americanas. Trump já ameaçou impor 200% sobre bebidas alcoólicas da União Europeia e anunciou 25% sobre carros fabricados fora dos EUA.
Quarto país com mais visitantes na feira, mas apenas o 54º em volume de importações, o Brasil ganha atenção dos fabricantes italianos. “Precisamos de ferramentas de internacionalização para explorar novos destinos, começando por Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, mas também Índia e Brasil”, disse Claudio Feltrin, presidente da Federlegno Arredo, que representa o setor e organiza o Salone.
Nem tudo é cifra na semana de design e essa é a graça do evento que transforma Milão. No próprio Salone continuam a crescer as iniciativas culturais, que nesta edição inclui uma instalação do cineasta Paolo Sorrentino, chamada “La Dolce Attesa”, a doce espera, sobre a ansiedade das salas de espera.
Fora dos pavilhões da feira, o Fuorisalone terá mais de 800 eventos espalhados pela cidade, de lançamentos a grandes instalações patrocinadas por gigantes como Amazon e Google. É uma semana realmente internacional, seja pelo público, seja pela presença de marcas estrangeiras, como a japonesa Muji e a finlandesa Marimekko. Quase todas as ações são gratuitas, restando ao visitante ter paciência para filas.
Com público de 90 mil no ano passado, a plataforma Alcova, que costuma revelar boas surpresas do design contemporâneo, reagiu para evitar superlotação e, pela primeira vez desde que foi criada, em 2018, decidiu que é hora de cobrar pela entrada na Villa Borsani. Como se trata de uma casa-museu dos anos 1940, o bilhete de 25 euros é explicado pela necessidade de limitar a circulação interna, onde tem até uma lareira decorada com cerâmica pelo artista Lucio Fontana (1899-1968).
O ingresso vale acesso prioritário aos outros três endereços que a Alcova vai ocupar, estruturas igualmente históricas na área metropolitana de Milão. Não satisfeita, a plataforma anunciou nos últimos dias uma quinta “experiência”, a Vocla, aberta somente a partir das 18h, no antigo matadouro em que esteve em 2023.
Além de reativar espaços esquecidos, outra prática comum do Fuorisalone é celebrar arquitetos e designers de outros tempos. Nesta edição, a italiana Cassina faz a reedição de quatro móveis desenhados por Le Corbusier, Charlotte Perriand e Pierre Jeanneret, apresentados pela primeira vez há 60 anos. Já a Flos se dedica às luminárias do arquiteto Tobia Scarpa, que completa 90 anos.
Há edifícios inteiros ocupados por delegações nacionais, com apoio de seus governos, como a exposição “Masterly”, a poucos passos do Duomo, com trabalhos de holandeses. A House of Switzerland estará novamente na Casa degli Artisti, em uma mostra conhecida por reunir pesquisa e experimentação em objetos funcionais.
O Brasil também tem lugar nobre na programação, novamente na Universidade de Milão, que no ano passado recebeu quase 140 mil pessoas. Dessa vez, com apoio da agência Apex e da Abimóvel, o curador Bruno Simões organiza “Chuva de Caju”, com peças de designers brasileiros.