SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O clima no ambiente universitário dos EUA mudou muito desde que Donald Trump assumiu seu segundo mandato na Casa Branca. Sob seu comando, o governo federal vem cortando investimentos nas universidades e mirando estudantes imigrantes. Funcionária da USC (Universidade do Sul da Califórnia) desde 2023, a brasileira Renata (nome fictício) relata um cenário de tensão constante. Para preservá-la, a Folha omitirá seu nome verdadeiro e cargo na instituição. Naturalizada americana desde 1996, ela diz que pela primeira vez teme ser perseguida pelo governo.

Manifestantes pró-Palestina protestam em frente ao campus da Universidade do Sul da Califórnia (USC), em 7 de maio de 2024, em Los Angeles Mario Tama Getty Images via AFP A imagem mostra um grupo de pessoas participando de um protesto. No primeiro plano, uma pessoa está de costas, vestindo uma bandeira da Palestina. Ao fundo, há um orador e várias pessoas segurando cartazes com mensagens de protesto. O ambiente é urbano, com árvores e edifícios visíveis. Leia abaixo seu depoimento.

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Antes de Trump, o clima na USC era bom, normal. “College life.” Mas já tinha acontecido uma mudança grande.

Durante os protestos [de abril e maio de 2024, contra a guerra em Gaza], eles [a administração da faculdade] fecharam o campus, que era público e aberto a todos. Colocaram guardas em todas as entradas para verificar a identidade dos visitantes. Desde então, o campus nunca mais foi aberto.

Os protestos eram pacíficos, pró-Palestina. Houve alguns poucos incidentes de vandalismo, mas, que eu saiba, na maioria foram tranquilos. Os estudantes estavam acampados num gramado na área central do campus e receberam notificação para sair, ou seriam presos. Eles saíram.

As pessoas com quem eu trabalho acharam a resposta da universidade um exagero. Tinha guarda em tudo quanto é lugar, fila para entrar, ficou completamente draconiano. Foi desproporcional. A gente viu o que aconteceu na [Universidade] Columbia [policiais entraram no campus para desmantelar as manifestações].

No meu departamento, a maior parte da equipe é contra o Trump. Todo mundo ficou horrorizado quando ele ganhou a eleição.

Especialmente agora, aqui qualquer protesto pode ser visto como uma coisa nefasta pelo governo. Então está todo mundo com medo. Em geral, o medo é de perder os fundos federais, medo de perder vistos. Os alunos temem perder grants [bolsas para estudar] e dinheiro para pesquisa.

Os professores querem resistir, mas também não querem perder suas pesquisas. Então estão aceitando as mudanças, embora com muita raiva. A gente tem as reuniões, e nelas todo mundo fala em resistir, mas a resistência é quieta. Assim: deleta tudo do site, mas continua fazendo [os estudos que podem desagradar à gestão Trump].

Os professores basicamente vão continuar usando os princípios do DEI [políticas de diversidade, equidade e inclusão]. Mas não pode falar mais sobre isso, não pode usar nenhuma palavra que possa ter qualquer menção ao DEI. Sumiram. Eles apagaram tudo, está tudo muito esquisito.

A “vibe” aqui está muito ruim. Não só na universidade, no país todo. Se a universidade perder o apoio financeiro federal, vai ter que cortar gastos. Como mulher e imigrante naturalizada, tenho medo de perder o emprego.

Uma colega de 70 anos, indiana, recebeu uma carta da Seguridade Social, o sistema que lida com benefícios de aposentadoria, pedindo que ela enviasse os originais de seus documentos de naturalização.

Ela é assistente administrativa e está nos EUA desde jovem. Trabalha na USC há 45 anos, naturalizou-se há 40 e tantos anos. Foi levar pessoalmente. Ficou tudo bem, mas isso foi muito estranho, porque eles nunca pediram esse documento.