BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo de Donald Trump admite em documento judicial desta segunda-feira (31) que cometeu um “erro administrativo” ao deportar um salvadorenho para El Salvador, mas que os tribunais americanos não têm o que fazer para trazê-lo de volta, uma vez que o homem não está sob jurisdição dos Estados Unidos.
A admissão de erro é a primeira desde o início do governo Trump e de sua política agressiva contra imigrantes, que inclui deportações aceleradas e sem ordens judiciais de remoção, feitas com base em lei de guerra de 1798.
O homem deportado, Kilmar Abrego Garcia, foi um dos enviados à temida prisão Cecot (Centro de Confinamento do Terrorismo), em El Salvador, em voos de deportação realizados em março e bloqueados pela Justiça americana, que agora analisa se o governo republicano pode fundamentas as remoções nessa lei do século 18 e se desrespeitou o bloqueio dos voos.
Garcia não tem contato com a família desde que foi sequestrado por agentes do ICE, o serviço de migração e alfândega dos EUA. A defesa do governo reconhece o erro da agência: “No dia 15 de março, embora o ICE estivesse ciente de que ele tinha proteção contra deportação para El Salvador, Abrego Garcia foi removido para El Salvador devido a um erro administrativo”, afirmam os advogados no texto.
Entre vários argumentos, o governo afirma porém que a Justiça americana não possui jurisdição para ordenar o retorno de Garcia agora que ele está sob custódia de El Salvador.
A gestão diz ainda que “o grande interesse na primazia do presidente em assuntos externos supera os interesses” dos autores da ação.
“Embora se reconheçam as dificuldades financeiras e emocionais para a família de Abrego Garcia, o interesse público em não retornar um membro de uma gangue criminosa violenta aos Estados Unidos supera esses interesses individuais”, diz o texto -a família de Garcia rejeita acusações de que o homem era membro de gangue.
“Eles [os advogados do governo] afirmam que o tribunal não tem poder para ordenar a soltura. Se isso fosse verdade, as leis de imigração perdem todo sentido, todas elas, porque o governo pode deportar quem ele quiser, onde e quando quiser, e nenhum tribunal pode fazer qualquer coisa uma vez que a deportação ocorra”, disse à revista de The Atlantic o advogado de Garcia, Simon Sandoval-Moshenberg.
Garcia chegou aos EUA aos 16 anos, em 2011, fugindo justamente da ameaça de gangues em seu país. Em 2019, recebeu proteção legal sobre remoção de um juiz de imigração americano, que concluiu que Garcia seria alvo de gangues em El Salvador caso fosse deportado, segundo documentos judiciais.
De acordo com seu advogado, Garcia é casado com uma cidadã americana e tem uma criança de 5 anos com deficiência, que também é cidadã americana. Ele não possui antecedentes criminais nos EUA, ainda segundo sua defesa -a gestão republicana também não afirma que ele possui antecedentes criminais.
Seu advogado diz que o governo Trump acusa falsamente seu cliente de ser membro de gangue provavelmente com base em um incidente de 2019. Na ocasião, Garcia foi detido com mais três homens no estacionamento de um mercado em Maryland; um deles teria acusado Garcia de integrar gangue, mas não ofereceu provas, e a polícia também não o identificou como tal.
Em seguida à detenção, Garcia foi entregue ao ICE. O governo, então, ainda sob Joe Biden, afirmou que o homem era membro da gangue com base em um informante. A família de Garcia entrou com processo para evitar a deportação e recebeu a proteção legal que existia até ele ser removido neste mês de março.
O governo americano chamou Garcia de um “perigo para a comunidade” e membro ativo da MS-13, gangue de origem salvadorenha nascida nos anos 1980 em Los Angeles -que Trump declarou como organização terrorista junto de outras gangues, como a venezuelana Tren de Arágua e cartéis narcotraficantes do México.