WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Na mira do presidente Donald Trump e do bilionário Elon Musk, a possibilidade de privatização do Serviço Postal dos Estados Unidos foi alvo de uma série de protestos de sindicatos nesta semana.

Com um histórico de prejuízos financeiros, a agência, que é independente desde 1970, já foi apontada por Trump como um dos órgãos a fazer parte dos seus esforços para remodelar e diminuir o governo, num plano que envolve demissões em massa.

Desde domingo, sindicalistas têm promovido manifestações para criticar o risco de mudanças no órgão. O temor aumentou depois da renúncia do diretor-geral dos Correios, Louis DeJoy, na terça-feira –ele já havia indicado no início do ano que tomaria essa decisão.

Parte do futuro da agência agora depende de quem a chefiará. Por ora, ela ficará sob o comando do número 2 de DeJoy, Doug Tulino. Segundo reportagem da Associated Press, o Conselho de Governadores do Serviço Postal dos EUA, colegiado independente, contratou uma empresa de consultoria para encontrar o 76º diretor-geral da agência, sem prazo para que isso ocorra.

Em fevereiro, Trump expressou a intenção de dissolver esse conselho e passar o órgão para o guarda-chuva do Secretário de Comércio, Howard Sputnik. O movimento foi visto por analistas que falaram a jornais americanos como um caminho para a privatização do serviço.

“Bem, queremos ter um correio que funcione bem e não perca quantias massivas de dinheiro, e estamos pensando em fazer isso, e será uma forma de fusão”, disse Trump durante a posse de Lutnick em fevereiro. Em dezembro, Trump afirmou que a privatização do Serviço é defendida por muitas pessoas que estava em análise.

No início deste mês, Musk defendeu publicamente a ideia. “Acho que deveríamos privatizar o Correio e a Amtrak [serviço de trens americano], por exemplo”, “Acho que logicamente deveríamos privatizar tudo o que pode ser razoavelmente privatizado”, disse Musk em uma conferência da Morgan Stanley.

Para ser concretizado, o plano precisaria de aval do Congresso. Em 2018, o republicano tentou levar a ideia adiante, mas acabou recuando. No lugar, propôs enxugar e modernizar o órgão.

DeJoy tornou-se diretor do órgão no primeiro mandato de Trump e conduziu a agência durante a pandemia. Em meados de março, ele afirmou em carta a parlamentares que havia feito um acordo com Musk para que o Doge (Departamento de Eficiência Governamental) auxiliasse na “identificação e alcance de mais eficiências”, conforme reportou o The New York Times.

Segundo ele, o órgão foi enxugado em 30 mil pessoas desde 2021, e haveria uma redução de mais 10 mil pessoas nos próximos 30 dias por meio de um programa de aposentadoria voluntária.

O Serviço Postal americano existe há 250 anos e passou por uma reforma em 1970, quando se tornou independente e passou a ser autofinanciado, com a venda de selos e taxas a clientes.

O orçamento anual do órgão é de US$ 78,5 bilhões e o Parlamento fornece um aporte financeiro mínimo para o órgão, que emprega 630 mil pessoas. Segundo o Serviço de Pesquisa do Congresso, apenas US$ 50 milhões foram previstos pelo Congresso à agência em 2023 para o subsídio de serviços postais gratuitos.

O Serviço Postal teve prejuízo de mais de US$ 100 bilhões (R$ 575,55 bilhões) desde 2007, incluindo US$ 9,5 bilhões (R$ 54,68 bilhões) nos 12 meses até 30 de setembro.

Neste mês, no entanto, o USPS divulgou lucro de US$ 144 milhões (R$ 828,8 milhões) no quarto trimestre. Isso foi atribuído a planos de modernização que haviam sido traçados pelo agora ex-diretor do órgão Louis Dejoy, que assumiu a agência durante a pandemia do coronavírus.

A agência foi prejudicada por um declínio de 80% no volume de correspondências desde 1997 com o arranque do email. O patamar agora é o mais baixo desde 1968, mas os defensores da agência nos termos atuais dizem que ela é fundamental para garantir a votação por correspondência, a entrega de prescrições de medicamentos e acesso a áreas remotas, entre outros.

A privatização dos Correios é um debate também no Brasil. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu essa ideia e apresentou um projeto de lei para concretizá-la, mas o presidente Lula (PT) retirou o órgão do escopo de concessões.

Como mostrou a Folha, a gestão petista discute alternativas para melhorar o caixa dos Correios depois de um prejuízo bilionário da estatal em 2024. De janeiro a setembro do ano passado, foram R$ 2,1 bilhões em prejuízo, além de déficit primário de R$ 3,2 bilhões, segundo dados do MGI (Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos). Os investimentos totalizaram R$ 830 milhões em 2024. Ainda assim, o governo Lula descarta a privatização do órgão.

Nos EUA, os sindicatos se opõem à privatização da agência sob o temor de que isso prejudique a população. O serviço postal dos Estados Unidos faz entregas desde centros urbanos a áreas rurais distantes, incluindo ilhas remotas.

De acordo com líderes sindicais disseram à Associated Press, cerca de 51 milhões de pessoas vivem em áreas rurais e poderiam ser prejudicadas caso a agência fosse privatizada.

“É uma ideia terrível para todos que servimos”, afirmou o presidente da Associação Nacional dos Carteiros, Brian L. Renfroe, na terça-feira, durante um painel sobre o tema, reportado pela Associated Press.

Países como Argentina, Portugal e Alemanha têm seus serviços postais privatizados, enquanto outros gigantes, como Rússia e Canadá mantêm os órgãos públicos.