BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Sob pressão política e dos bancos, o Banco Central tem até 360 dias de prazo para analisar a operação do BRB (Banco de Brasília) de aquisição do Master. As etapas e prazos para a avaliação dos pleitos da reorganização societária estão definidos na resolução 108 do BC (2021).

O anúncio do acordo agitou o sistema bancário por colocar holofotes na relação de lideranças políticas com Daniel Vorcaro (dono do Master), nas suas operações arriscadas com precatórios e CDBs, e por envolver uma queda de braço entre os bancos para mudar o FGC (Fundo Garantidor de Crédito).

A operação também alimenta uma rede de intrigas envolvendo desinformação a respeito do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. A assessoria de imprensa do BC precisou negar, por exemplo, que ele tivesse se reuniudo neste sábado (29) com os CEO do BTG Pactual, Roberto Sallouti, e Milton Maluhy, do Itaú Unibanco, para discutir a compra do Master pelo BRB.

O boato do encontro entre os dois banqueiros e Galípolo alimentou a especulação ao longo do fim de semana de que o BC iria rejeitar a operação, antes mesmo de os técnicos da autarquia começarem o processo de análise do arranjo societário pelo banco.

O BC não começou ainda a se debruçar sobre a operação e informou à reportagem que não comenta sobre nenhuma instituição supervisionada individualmente.

O negócio já está sendo considerado o caso mais emblemático para a equipe do BC desde a aquisição do Panamericano pela Caixa Econômica Federal e do Votorantim pelo Banco do Brasil. Em comum nas três operações os compradores são bancos públicos.

O presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, também negou outra especulação que circulou entre participantes do mercado. Ele disse que não se reuniu com o presidente do BC para discutir a compra do Master e negou que os dois bancos envolvidos na operação tivessem negociado o acordo de aquisição com o BC antes da divulgação do fato relevante.

Após o comunicado do negócio ao mercado, na sexta-feira (28), um contrato de compra e venda foi assinado entre os dois bancos e protocolada a documentação no BC. Os documentos (mais de 30) foram entregues às 23h59, segundo informou o presidente do BRB.

O fechamento da operação está sujeito a cinco condicionantes para que o negócio seja concretizado, o que inclui a auditoria do BRB nos ativos e passivos do Master. Entre eles, os de maior risco que serão apartados do negócio, como precatórios, direitos creditórios de ações judiciais e ações de empresas.

As condicionantes são as seguintes:

1. Conclusão satisfatória ao BRB da diligência sobre os ativos e passivos do Master;

2. Conclusão da reorganização do Master;

3. Obtenção das autorizações do BC de formação do conglomerado prudencial combinado entre Banco Master e BRB liderado pelo BRB;

4. Deferimento dos processos de homologação de aumentos de capital do BRB e do Banco Master e

5. Obtenção das aprovações antitruste, incluindo o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o BC

O próprio presidente do BRB ressaltou em entrevista à Folha de S.Paulo a importância da auditoria dos ativos que ficarão de fora do negócio, como condicionante para o fechamento da operação. Cálculo preliminar aponta que os ativos somam R$ 23 bilhões. O número pode aumentar, adiantou ele.

Caso não sejam apresentados todos os elementos necessários, o BC dará um prazo para o BRB e Master enviarem os documentos adicionais para completar o processo.

O BC vai analisar a viabilidade do comprador. Por exemplo, se o negócio vai ficar mais ou menos rentável, se o BRB tem viabilidade para absorver o Master e se a compra não trará risco de liquidez para o banco do governo do Distrito Federal.

Apesar de o BRB ser um banco público, o BC analisa o caso como se fosse qualquer outro banco querendo comprar outra instituição financeira ou se fundir a ela.

Os grandes bancos privados são críticos à estratégia do Master com ativos de alto risco, como precatórios, e de venda de CDBs com alta rentabilidade para os investidores com chamariz do FGC, fundo que garante perdas até R$ 250 mil por investidor e instituição e é bancado pelos bancos, principalmente os maiores.

Calcula-se que o Master tenha um estoque de cerca R$ 50 bilhões de CDBs emitidos, quase metade da disponibilidade do FGC, que gira em torno de R$ 107 bilhões. Esse não é apontado como o principal problema do Master, mas, sim, o modelo de negócio e o risco assumido do lado do seu passivo.

O BC já tinha apertado as regras do FGC, mas os grandes bancos querem mudar o modelo do fundo. Desde janeiro de 2024, a instituição associada ao FGC deve manter montante alocado exclusivamente em títulos públicos federais quando o valor for superior a seis vezes ao patrimônio líquido ou a 80% da captação total.

Representantes dos bancos ouvidos pela reportagem, na condição de anonimato, avaliam que o tempo de análise do negócio não deve durar os 360 dias possíveis, pela importância da operação e as pressões envolvidas.

Mas apontam que o processo de análise da compra será um grande teste para Galípolo pelas implicações políticas e econômicas que abarcam o negócio.

O vazamento da operação na imprensa antes do fato relevante na sexta foi interpretado por esses representantes como uma tentativa de tratar o acordo como fato consumado. Para esses representantes de bancos, haverá pressões de todos os lados e até mesmo tentativa de integrantes de aliados do presidente Luiz Inácio Lula de imputar o problema ao ex-presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Aliado de Lula, o presidente da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), Ricardo Capelli, publicou na rede X (antigo Twiiter) que o BC teria estudos sobre problemas no Master. “Está em curso um dos maiores escândalos do país”, escreveu Capelli, que foi braço direito do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino, quando ele ainda estava no Ministério da Justiça. Capelli tem planos de se candidatar ao cargo de governador do DF nas próximas eleições.

À reportagem o governador do DF, Ibaneis Rocha, disse que não mistura política com questões técnicas do banco. Ele criticou Capelli e a oposição ao seu governo. “Quase quebraram o BRB na gestão deles. Recebemos a chave da Polícia Federal na época do Rodrigo Rollemberg [ex-govenador do DF e secretário de Economia Verde do governo Lula]. Isso o Capelli não fala.”

Procurado, Vorcaro não falou com a reportagem. Ele é próximo do senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente do PP e ex-ministro da Casa Civil de Jair Bolsonaro (PL). No ano passado, Nogueira aproveitou as discussões em torno da PEC que dá autonomia financeira ao Banco Central e apresentou uma emenda para aumentar o valor de cobertura do FGC de R$ 250 mil para R$ 1 milhão.

Já o presidente do BRB chegou ao comando do banco no segundo ano do governo Ibaneis Rocha (MDB), em janeiro de 2020, e deu início a uma gestão considerada agressiva dentro e fora do DF.

A compra do Banco Master também acendeu o alerta entre funcionários da Caixa Econômica Federal. Servidor de carreira da Caixa, Paulo Henrique Costa ocupou diversas posições no banco e foi vice-presidente de Clientes, Negócios e Transformação Digital antes do convite de Ibaneis para o BRB.

Funcionários do BRB ouvidos pela reportagem foram pegos de surpresa pelo anúncio. Segundo relatos, Paulo Henrique Costa reuniu gestores na sexta após a divulgação do fato relevante ao mercado. Uma live com os demais funcionários está prevista para esta segunda (31).