MPGO e Juízo de Primeiro Grau não cumpriram trâmites básicos de citação da acusada antes da publicação em edital
Números da Base Nacional de Dados do Poder Judiciário, mantida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicam que os tribunais brasileiros somam mais de 40 milhões de processos com erros, ou seja, 20% do acervo de 195 milhões de ações analisadas pelo CNJ. Entre os erros mais comuns estão informações erradas ou falsas sobre as partes do processo, falta de informações ou assunto jurídico do processo cadastrado de maneira errada.
Foi justamente por meio de um erro da Justiça que o advogado criminalista Gabriel Fonseca, integrante do escritório Celso Cândido de Souza Advogados, conseguiu reverter uma decisão, na segunda instância, que implicaria em uma injustiça para sua cliente: uma chefe de cozinha foi condenada na primeira instância a quatro anos de prisão por uma acusação de fraude contra a fiscalização tributária.
O caso começou a ser investigado administrativamente em 2008 e, em 2018, o MPGO ofereceu denúncia e deu início à ação. A mulher fazia parte do quadro societário de uma empresa do ramo alimentício em Anápolis, mas não era administradora. Ela vivia há anos nos Estados Unidos e só ficou sabendo da existência da ação quando foi condenada.
Foi neste momento que o caso chegou a Gabriel, que percebeu que a citação dela ocorreu de maneira indevida. “O douto Juízo fez a intimação apenas por edital, pulando etapas como procurá-la na empresa, citá-la por outros meios em que poderia ser encontrada, ficando evidente a negligência do órgão para localizá-la. Ela estava residindo nos Estados Unidos com toda documentação legalizada e essas informações estavam disponíveis na Receita e Polícia Federal. Este fato era notório, o MPGO sequer fez esta pesquisa”.
Segunda instância
Em sua decisão, após o recurso da defesa, o desembargador Wilson Dias, do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) reconhece o erro judiciário. “É certo que não há uma quantidade mínima de diligências a serem cumpridas antes de se efetivar a citação por edital. Entretanto, conforme destacado anteriormente, observa-se que, no presente caso, não houve esgotamento das tentativas de localização da ré, sendo que sequer foram realizadas tentativas judiciais de busca de seu endereço, ou, como mencionada pela defesa, as chamadas ‘buscas básicas’, antes da determinação da citação por edital”.
Os outros argumentos do defensor no recurso nem chegaram a ser analisados diante desse erro básico do judiciário. “Não chegou a ser julgado o mérito nesse caso, o desembargador concordou com a alegação preliminar da defesa”, pontua Gabriel Fonseca. “Todo o processo, que durou sete anos desde a denúncia do Ministério Público, foi inviabilizado por um erro básico. O judiciário demandou tempo e dinheiro em algo errado, é uma falha da Justiça brasileira e que, infelizmente, se repete em muitos casos”, completa.
Segundo o defensor, a cliente teria muito a perder se fosse condenada injustamente. “Com a condenação, ela pegaria pena superior a quatro anos, devendo cumpri-la em regime semiaberto. Possivelmente o juiz determinaria seu recambiamento dos EUA para o Brasil, fazendo com que tudo o que conquistou na sua vida no exterior fosse perdido. Ela possui uma carreira sólida como chefe de cozinha”, destaca o advogado criminalista.