SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O julgamento que decidirá se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se torna réu no STF (Supremo Tribunal Federal) começou nesta terça-feira (25) com a apresentação dos argumentos das defesas dele e de mais sete denunciados sob acusação de integrar uma trama golpista para impedir a posse do presidente Lula (PT).
Além de Bolsonaro, são acusados Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin e deputado federal do PL-RJ, Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência da República, Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, e Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa.
Eles são acusados de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e de golpe de Estado, além de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado e participação em uma organização criminosa. Se condenados, podem pegar penas de mais de 40 anos de prisão.
Na primeira parte da sessão, falaram o relator, o ministro Alexandre de Moraes, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e os advogados dos denunciados.
À tarde, os ministros da Primeira Turma responderam às alegações e pedidos dos advogados, que citaram pontos já levantados anteriormente em suas defesas, como o impedimento de ministros e a validade da delação de Mauro Cid.
Veja alguns dos questionamentos dos advogados e o que decidiram os ministros sobre os pedidos.
IMPEDIMENTO DE MAGISTRADOS
**Defesas**
As defesas de Anderson Torres, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira pediram o impedimento dos ministros Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin em razão da ausência de impessoalidade. Uma das alegações é a de que Moraes seria parte no processo, uma vez que a investigação da PF aponta que ele foi alvo de um plano de assassinato. No caso de Dino, as defesas levantam o fato de que ele já apresentou uma ação penal contra Bolsonaro. Sobre Zanin, citam o fato de já ter se declarado impedido antes e assinado uma notícia-crime em caso envolvendo Bolsonaro antes de entrar no Supremo.
**Ministros**
Moraes e Zanin lembraram que, em sessão recente, o STF rejeitou a suspensão ou impedimento dos ministros. A decisão foi dada por larga maioria, 9 a 1 votos, no caso de Moraes e Dino, e 10 a 0, no caso de Zanin. O voto vencido na ocasião tinha sido de André Mendonça. Dino falou em “uma tentativa de transformar tribunais em parte dessa polarização” vista na sociedade. Luiz Fux lembrou que a questão é decidida pelo presidente da corte ou pelos próprios ministros acusados de parcialidade, que não se declararam impedidos. Cármen Lúcia afirmou que não se pode tentar criar impedimentos no intento de afastar os magistrados e que muitos deles, não só do STF, foram atacados por envolvidos na trama golpista.
COMPETÊNCIA DO STF, PRIMEIRA TURMA E JUIZ DAS GARANTIAS
**Defesas**
Os advogados questionaram se seria competência do STF julgar o caso e, em última análise, se o tema não deveria ser tratado por todos os ministros da corte. Celso Vilardi, advogado de Bolsonaro, por exemplo, argumentou que a competência seria do plenário pelo fato de o denunciado ter sido presidente da República na época dos fatos narrados. Também pediu a aplicação do juiz das garantias (regra que estabelece que um mesmo juiz não deve conduzir o inquérito e o processo).
**Ministros**
Moraes argumentou que em quase 1.500 ações o STF já reafirmou sua competência para todos os crimes relacionados ao 8 de janeiro de 2023. Ele também falou que a exceção que leva o julgamento ao plenário só é acionada quando o acusado ainda exerce o cargo de presidente. Os outros ministros acompanharam o relator e recusaram o pedido das defesas, com a exceção de Luiz Fux, que foi contra julgar o caso na Primeira Turma. Todos os ministros disseram que o conceito de juiz das garantias não se aplica ao caso.
CERCEAMENTO DE DEFESA
**Defesas**
Advogados de denunciados alegaram o cerceamento de defesa por não terem acesso total às provas, o que prejudicaria seus clientes. Eles também citaram “pescaria probatória” -quando uma diligência é autorizada sem fato justificado para colher possíveis provas- e “document dumping”, prática de entregar um grande volume de documentos desorganizados para dificultar a análise. A defesa de Augusto Heleno criticou também o fatiamento da denúncia e falou em risco à ampla defesa e ao contraditório.
**Ministros**
Flávio Dino afirmou não identificar no processo nenhum motivo para nulidade. Assim como Moraes, ele disse que, se a ação penal for instaurada, as defesas terão acesso a mais provas e negou ter havido pesca probatória. Fux e Zanin disseram que o fatiamento está previsto na legislação e já foi feito em outros processos. Cármen Lúcia acompanhou o relator ressaltando que a qualidade da apresentação das defesas é um indicativo de que elas tiveram o acesso adequado às provas.
COLABORAÇÃO PREMIADA
**Defesas**
As defesas do ex-presidente Bolsonaro e do ex-ministro Braga Netto pediram a anulação do acordo de Mauro Cid com a Polícia Federal dizendo ter havido nele alguns vícios, como não anuência da Procuradoria-Geral da República e ausência de voluntariedade. Eles citaram também a falta de confiabilidade na fala do militar, que teria omitido informações em alguns de seus depoimentos.
**Ministros**
Moraes defendeu que o Supremo atuou de acordo com seu papel de “verificar a regularidade, a voluntariedade e a legalidade” da colaboração. “Em nenhum momento esse Supremo Tribunal Federal, por meio do ministro-relator, interferiu no conteúdo ou nos termos do acordo de colaboração premiada, tendo exercido somente o que a lei garante a todo juiz”, disse. A decisão de manter a colaboração foi tomada por unanimidade, mas Fux indicou ver com reservas a atuação do colaborador.