BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – A saída dos EUA do Acordo de Paris, anunciada pelo presidente Donald Trump antes mesmo de sua posse, provocou alguns efeitos imediatos: o diplomático, pelo enorme peso do país nas negociações, e o psicológico. “É algo para o qual a humanidade está ou deveria estar realmente unida. Afeta a todos, seria uma obrigação resolvermos juntos”, afirmou nesta terça-feira (25), em Berlim, Wopke Hoekstra, comissário europeu para o Clima.

“A maior ou mais importante potência do mundo, que abriga a maior economia e é o segundo maior emissor do planeta, basicamente diz: ‘Não vou mais entrar no jogo’. É claro que isso é um golpe significativo no processo e também sobre os envolvidos”, declarou o político holandês na entrada do Ministério das Relações Exteriores, na capital alemã.

Hoekstra e cerca de 40 representantes de países e entidades estão em Berlim para o Diálogo Petersberg, promovido anualmente pela Alemanha em conjunto com o anfitrião da próxima COP _neste ano, o Brasil, que abrigará a 30ª edição da Conferência do Clima da ONU em Belém, no mês de novembro, sob a presidência do embaixador André Aranha Corrêa do Lago.

“O Diálogo Petersberg vem servindo há duas décadas como um fórum vital para o avanço da discussão climática. Desta vez, com o peso particular de buscar o sucesso da COP30, a primeira a ocorrer após um ano completo com o planeta acima do limite de 1,5 graus”, disse o diplomata brasileiro em seu discurso de abertura, em referência à meta de aquecimento global acordada em Paris, há dez anos, que já soa implausível.

Sem citar Trump nominalmente, Corrêa do Lago também lembrou que “problemas globais pedem soluções globais”. Como havia feito em carta pública no começo do mês, explicou a origem indígena do termo “mutirão” para pedir uma ação global contra a crise climática.

Ainda que fosse difícil evitar o vácuo causado pela ausência americana, o encontro alemão propôs uma discussão financeira para sublinhar a necessidade do mutirão proposto pelo Brasil e antecipou algumas conclusões de estudo capitaneado por OCDE e ONU. A principal delas diz que “uma maior ambição climática não só é viável, como também faz sentido econômico, mesmo no curto prazo”.

A assertiva vai de encontro ao fato de que apenas 19 países, até o mês passado, haviam divulgado suas metas climáticas atualizadas. Fevereiro era o prazo para o anúncio voluntário dos valores referentes a 2035. Nem mesmo a União Europeia, vista como uma espécie de paradigma do setor, divulgou seus números. “Virá em um futuro próximo”, declarou Hoekstra, evitando responder se o tema está longe de um consenso entre os 27 países do bloco europeu, como parece estar.

Segundo a análise, que será divulgada na íntegra em maio, as chamadas NDC (contribuições nacionalmente determinadas, na sigla em inglês) já funcionam como indutoras de crescimento: 87% da economia global já é coberta com alguma meta net zero (compromisso para que a quantidade de gases de efeito estufa emitidos seja igual à quantidade removida da atmosfera); energia limpa já atrai o dobro do investimento em combustível fóssil; de 2015 a 2022, o PIB mundial cresceu 22% e as emissões apenas 7%; mais de 40 países tiveram crescimento cortando emissões.

O estudo vai além e propõe que os países cogitem NDCs ainda mais ambiciosas. O ganho poderia significar um PIB global 0,2% superior em 2040, algo equivalente a uma Suécia; outros 3% viriam com a mitigação de desastres em 2050 e 13% em 2100. Uma economia de baixo carbono já é e ficaria ainda mais eficiente com metas aprimoradas. Haveria ainda ganhos sociais e de saúde, avaliam os autores da análise: 9 em cada 10 países em desenvolvimento teriam mudança significativa em seus indicadores.

A incerteza política, por sua vez, inibe investimentos privados e poderia custar algo como 0,75% do PIB global já em 2030. Nada parece mais incerto do que a política mundial neste momento, a começar pelo vai e vem de tarifas do governo Trump.

“Não quero parecer otimista demais, mas vejo estados americanos, democratas e republicanos, que não cogitam mudar suas políticas climáticas porque estão vendo o potencial de dano à frente. Ninguém também vai parar de comprar carros elétricos. Energia renovável, mais do que nunca, agora significa dinheiro. Isso tudo vai continuar”, ponderou Hoekstra, o comissário europeu.

“Qualquer um que rejeite a ação climática nestes tempos turbulentos como sendo cara, onerosa ou supérflua não pode contar”, afirmou em comunicado Annalena Baerbock, ministra das Relações Exteriores da Alemanha, também sem citar nominalmente o presidente americano.