GUAXUPÉ, MG (FOLHAPRESS) – Capitalizados devido à forte cotação do café e com receio das altas taxas de juros praticadas no mercado, produtores rurais de Minas Gerais estão encurtando os prazos de seus financiamentos agrícolas.
Com a saca de 60 quilos cotada a valores superiores a R$ 2.500, os cafeicultores estão vivendo um momento não visto nas últimas décadas, na avaliação de dirigentes de entidades do setor. Como comparação, há dois anos a saca custava R$ 1.100.
Por isso, eles têm investido fortemente na compra de máquinas, implementos e insumos agrícolas, como tem sido visto em feiras voltadas ao setor no interior de Minas Gerais.
O fenômeno de redução no prazo para pagamento já tinha sido sido registrado em fevereiro em Monte Carmelo, no Triângulo Mineiro, em que as compras, antes feitas normalmente em prazos de três ou até cinco safras, passaram a ocorrer em sua maioria em um ou dois anos. Isso significa o ganho de ao menos uma safra para o pagamento, além de mais tecnologia no campo.
Agora, o cenário se repete em Guaxupé, município do sudoeste mineiro que deverá receber até esta sexta-feira (21) 35 mil visitantes na Femagri, feira em que essa redução nos prazos de pagamento é ainda mais perceptível.
O evento está em sua 24ª edição e, historicamente, fecha 70% dos negócios com prazo de pagamento de três safras em setembro de cada ano. Outros 10% optam por cinco anos de prazo, enquanto 20% fechavam suas compras para pagar no próprio ano da aquisição.
Neste ano, porém, 60% dos negócios devem ser concluídos com prazo de um ou, no máximo, dois anos para pagamento essa modalidade não existia até o ano passado. Compras em três anos devem ser de cerca de 30%.
Iniciada na quarta-feira (19), a feira teve, só no primeiro dia, mais de 2.000 orçamentos feitos. Nos dois primeiros dias, recebeu 27,7 mil visitantes, recorde na história da Femagri.
Organizada pela Cooxupé, principal cooperativa de café do país, a feira tem como principal meio de pagamento o sistema Barter, em que o produtor paga o maquinário adquirido com sua própria produção entregue à cooperativa.
Acostumado a comprar máquinas e insumos com prazo de pagamento de três a quatro anos, o cafeicultor João Paulo Damasceno de Morais, 45, investiu cerca de R$ 400 mil nesta quarta-feira para pagar em duas safras.
“Se fosse só pela minha vontade, eu queria fazer em quatro ou cinco anos, mas sobe muito. Vi um orçamento que uma pessoa me mostrou de uma tela de um alambrado que, se fizer em cinco anos, em vez de três, aumentaria dez sacas de café a mais por ano. Com o preço de hoje, fica muito caro”, disse ele, que administra uma propriedade com área plantada de cem hectares (140 campos de futebol) em São José da Barra. A diferença anual nos juros citada por ele equivale a mais de R$ 25 mil.
Com a valorização atual do café, ele afirmou que aproveitou para investir em insumos já para a próxima safra, para pagar neste ano. A previsão é que a colheita na propriedade alcance 4.000 sacas.
“O café está em um preço espetacular. Só que esse preço espetacular é do presente e do futuro próximo, que é setembro de 2025 e 2026, ele não vem acompanhando nos anos seguintes. A tendência de mercado futuro mostra o preço mais baixo. [Se comprar em cinco anos], Lá em 2029, que seria o último vencimento, você está praticamente com a metade do valor atual. Então essa diferença é muito grande”, afirmou José Eduardo dos Santos Júnior, superintendente de desenvolvimento do cooperado da Cooxupé.
Em sua avaliação, esse cenário, aliado à taxa anual de juros para os financiamentos, entre 18% e 20%, não é vantajoso para o produtor em prazos mais longos.
“Você tem o preço do produto subindo e o do café caindo. Quando faz a troca no curto prazo, tem um valor de produto com poucos juros e o café valorizado, você gasta menos café nessa troca. Quando você leva lá para a frente o produto caro, o café é menos valorizado, você gasta muito café [mais sacas]”, disse.
Geovani Júnior da Silva, 32, produtor em Alpinópolis, comprou implementos para um trator, para auxiliar nos trabalhos na propriedade rural da família, que deve produzir 1.100 sacas.
“Quando você trava o café [na negociação], tem uma garantia a longo prazo. O preço hoje é propício, mas nem sempre foi assim, e o amanhã a gente não sabe. A pessoa vê um pacote de arroz ou um litro de leite e reclama do preço, mas não tem ideia do trabalho que é para fazer aquele pacotinho de arroz”, disse.
Presidente da Cooxupé, Carlos Augusto Rodrigues de Melo afirmou que é preciso saber “utilizar esses momentos de mercado” e que o cafeicultor precisa ter “juízo”.
“Porque o café talvez não fique nesses patamares nos anos futuros, mas eu posso dizer para vocês, com 72 anos, eu nunca vi uma oportunidade de mercado de café como estou vendo”, disse.