BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Johan Eliasch, 63, é presidente da Federação Internacional de Esqui e Snowboard. Seu currículo é extenso, assim como sua fortuna pessoal, estimada em US$ 5 bilhões. Vai do comando da marca esportiva Head à ONG ambientalista Cool Earth, passando por áreas preservadas da Amazônia, que lhe renderam uma investigação no Brasil, produções de cinema e patentes de telefonia celular.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, Eliasch, que nasceu na Suécia mas também tem cidadania britânica, defende uma profissionalização ainda mais radical dos Jogos Olímpicos se for eleito presidente do COI (Comitê Olímpico Internacional). Reconhece ainda que a neutralidade dos Jogos está em risco no atual estágio de polarização do planeta.
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PERGUNTA – Qual é o maior desafio do Movimento Olímpico atualmente?
JOHAN ELIASCH – Eu diria que há três desafios centrais. Primeiro, as divisões que marcam nosso mundo. Em uma época turbulenta, haverá pressão para que o Movimento Olímpico escolha um lado ou faça comentários políticos. No entanto, é essencial que os Jogos permaneçam em um espaço neutro que transcenda as diferenças e divisões do nosso mundo. O segundo desafio é o mundo da mídia em rápida mudança em que estamos operando: digitalização, IA, conteúdo personalizado, ascensão da narrativa e serviços de streaming. Temos que estar à frente de tudo isso para reter e atrair públicos mais jovens. Por último, mas não menos importante, o desafio da mudança climática. O clima imprevisível e extremo é uma ameaça muito real aos Jogos. Temos que ser ousados, práticos e de alto nível em nossas ações sobre o clima, e esse será o foco central da minha presidência. É importante observar que, com todos esses desafios, surgem oportunidades: unir o mundo, atrair novos públicos e dar um exemplo brilhante de sustentabilidade. É por isso que olho para o futuro com grande otimismo.
P – Como a neutralidade política dos Jogos pode ser mantida diante de discussões politicamente carregadas, como a dos atletas transgêneros e o banimento de atletas de determinados países?
JE – A neutralidade política pode ser mantida se formos muito claros quanto à nossa posição, e eu sou claro em relação a essas duas questões. No debate sobre os atletas transgêneros, tenho certeza absoluta de que os esportes femininos devem ser protegidos sem “se” ou “mas”. Para garantir a justiça para todos, precisamos ser guiados não por tendências ou ideologias, mas por fatos biológicos. O COI deve dar o exemplo, estabelecendo diretrizes claras e simples para proporcionar um ambiente justo e seguro para todos os atletas, especialmente para as mulheres. Devemos nos lembrar do que está em jogo: a integridade e até mesmo a sobrevivência dos esportes femininos. A opinião pública e as tendências não devem ter precedência sobre a imparcialidade e a segurança das competições femininas.
Quanto à proibição de atletas de determinados países, ninguém pode escolher seu local de nascimento. Seria altamente discriminatório negar a um atleta a chance de competir com base em seu passaporte. O programa de Paris-2024 para atletas individuais neutros foi bem-sucedido com russos e bielorrussos; devemos nos basear nele, permitindo que mais atletas neutros participem dos Jogos. O passaporte de um atleta não deve impedi-lo de perseguir seus sonhos. No fim das contas, o esporte é um direito humano.
P – O que um fã dos Jogos Olímpicos poderia esperar do seu mandato à frente do COI nos próximos anos?
JE – Esportes mais emocionantes, apresentados de maneiras mais atraentes. Eu procuraria maneiras de estender o entretenimento olímpico e paraolímpico e a nossa marca para além do modelo de duas semanas a cada dois anos. E, como presidente, supervisionaria um grande impulso na digitalização. Em Paris-2024, 40 bilhões de horas de conteúdo foram assistidas somente no YouTube. É onde o público está. Portanto, no futuro, precisamos que muito mais do nosso conteúdo seja apresentado da maneira que as gerações mais jovens desejam: destaques, narração de histórias, streaming e assim por diante.