SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A decisão unânime do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central de elevar a taxa básica de juros da economia em um ponto percentual, de 13,25% para 14,25% ao ano, era esperada e evidencia a preocupação da autarquia em controlar a inflação, dizem analistas.
No comunicado desta quarta-feira (19), o comitê sinalizou que os juros vão continuar subindo na próxima reunião, em maio, e que pretende fazer uma nova alta de menor intensidade.
Como justificativa, citou a continuidade do “cenário adverso” para a convergência da inflação, a elevada incerteza e as defasagens do efeito da política de juros sobre a economia.
Embora o Copom não tenha se comprometido com a intensidade do ajuste, investidores falam em uma alta de 0,50 ponto -desde janeiro, o boletim Focus do BC estima que Selic atinja 15% neste ano.
Uma elevação, mesmo que menor, de 0,25 ponto percentual, na próxima reunião fará com que a Selic fique no nível mais alto ao menos desde julho de 2006, quando esteve em 14,75% ao ano.
“Tanto a decisão de aumentar a Selic em um ponto percentual quanto o conteúdo do comunicado não trouxeram nenhuma surpresa em relação às expectativas dos agentes, o que significa que, muito provavelmente, o mercado vai reagir positivamente”, disse José Marcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
Para o economista, o colegiado indicou que a resiliência da atividade econômica do país exige que a política monetária se torna ainda mais contracionista.
Desde janeiro, houve uma piora nas expectativas de inflação, em especial para 2026. Segundo o boletim Focus divulgado na segunda (17), os analistas esperam que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) termine o próximo ano encostado no teto da meta de 4,50% perseguida pelo BC, em 4,48%. Para 2025, a estimativa é de alta de 5,66%.
“Ao afirmar que vai fazer um ajuste de menor magnitude na próxima reunião, que deve ser de 0,5 ponto percentual, o Banco Central não terá ainda condições de sinalizar um encerramento do ciclo. O comunicado atende a visão de que há um compromisso com o alcance da meta de inflação, e acho que isso não deve ser colocado em xeque nesse momento”, disse André Muller, estrategista e economista-chefe da AZ Quest.
O alvo central da meta do BC é 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que a meta é considerada cumprida se oscilar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).
“Conquistar a confiança dos agentes de que teremos uma equipe 100% técnica, comprometida com as metas de inflação e sem influências políticas, é de extrema relevância para uma melhor condução da política monetária no país. Caso o cenário adverso persista, podemos ver a taxa Selic acima de 15% ao ano. ainda neste primeiro semestre”, disse Lucas Constantino, estrategista-chefe da GCB Investimentos.
Miguel Torres, presidente da Força Sindical, criticou a decisão em nota, chamando-a de “extorsão” e afirmando que ela frustra os trabalhadores, prejudica as campanhas salariais, dificulta a produção e compromete o desenvolvimento.
“Os juros continuam proibitivos e o Brasil perde outra chance de apostar na produção, no consumo e na geração de empregos”, disse.
A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, que costumava se manifestar criticamente às decisões do BC durante a gestão de Roberto Campos Neto, disse que não vai se manifestar porque já opinou na reunião anterior, em janeiro.
“Eu já me manifestei. Não mudou nada. Isso já estava precificado”, disse a ministra.
No caso dos investimentos, o aumento da Selic favorece ativos atrelados ao CDI, como títulos pós-fixados, que acompanham essa valorização de forma quase imediata. Para Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, a duração da alta é uma questão-chave para a tomada de decisões.
“O grande dilema é se o Banco Central vai elevar a Selic até 15% e, se isso ocorrer, por quanto tempo manterá essa taxa elevada. Esse fator será determinante para o comportamento dos ativos de renda fixa e variável nos próximos meses”, disse.
Com a elevação desta quarta, os juros se igualaram ao patamar observado em outubro de 2016, durante a crise econômica do governo Dilma Rousseff. Na época, também para combater uma inflação resistente, a taxa básica ficou estacionada em 14,25% durante um ano e três meses, a partir do fim de julho de 2015, atravessando o impeachment da petista.
No radar dos economistas agora está a preocupação com a política fiscal expansionista do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em meio à queda de popularidade do presidente, foram apresentadas medidas de estímulo à economia, como o novo consignado privado para trabalhadores do setor privado e a liberação do saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
No caso da proposta de ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 por mês, há temor pela resistência do Congresso à proposta de compensação apresentada pelo Executivo de cobrar um imposto mínimo dos ricos.
Sobre a questão fiscal, o colegiado do BC repetiu o texto usado no comunicado de janeiro, dizendo que segue acompanhando “com atenção” os impactos sobre a política monetária. “A percepção dos agentes econômicos sobre o regime fiscal e a sustentabilidade da dívida segue impactando, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes”, afirmou.
O Copom volta a se reunir nos dias 6 e 7 de maio.