SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Músicos, escritores, artistas e jornalistas britânicos se uniram em uma campanha chamada “Make It Fair” (Faça Ser Justo) contra uma proposta do governo do Reino Unido que pode facilitar o uso de conteúdo para treinamento de modelos de inteligência artificial sem remuneração aos autores.

Nessa terça-feira, jornais como The Guardian, Daily Mail, The Times, Daily Express e The Sun publicaram o slogan do movimento em suas capas com um fundo azul e a frase em cor preta, com as letras AI em branco, em referência à sigla para inteligência artificial em inglês.

Em todas as publicações, o slogan vem acompanhado do seguinte texto: “FAÇA SER JUSTO: O governo quer mudar as leis do Reino Unido para favorecer grandes plataformas de tecnologia para que elas possam usar o conteúdo criativo britânico para alimentar seus modelos de IA sem nossa permissão ou pagamento. Vamos proteger as indústrias criativas -é justo”.

Além dos jornais publicados nessa terça-feira (25), a campanha será veiculada nas publicações com periodicidade semanal durante toda esta semana e a próxima.

Na terça, mais de mil músicos lançaram um álbum mudo intitulado “Is This What We Want?” (É isso o que nós queremos?”) para destacar que o projeto governamental é uma ameaça à indústria musical. As gravações silenciosas foram feitas em estúdios vazios.

A campanha foi promovida no último dia de uma consulta feita pelo governo para discutir a atual lei de direitos autorais e de inteligência artificial no país. Segundo os jornais Financial Times e The Guardian, o governo propõe que os artistas, autores e empresas terão de deixar claro que não querem ter o conteúdo usado e copiado pelas big techs. Atualmente, o conteúdo é protegido pelo direito autoral e ele não pode ser utilizado sem a autorização do autor.

De acordo com o movimento “Make It Fair”, o governo visa enfraquecer a legislação e permitir que as big techs usem o conteúdo de livros, músicas, filmes, notícias, roteiros, artes e fotografias para treinar os modelos de IA sem o pagamento devido aos autores do conteúdo, já que a solicitação proposta pelo governo faz com que o criador de conteúdo seja responsável pelo policiamento do seu trabalho, o que tornaria o processo caro e demorado.

Ídolos como Paul McCartney e Elton John já se mostraram contrários à proposta do governo, ao mesmo tempo que autores de best-sellers como Mark Haddon e Michael Rosen assinaram uma carta conjunta também demonstrando sua oposição.

“Você tem jovens, rapazes e moças, surgindo, e eles escrevem uma bela canção, e eles não a possuem, e não têm nada a ver com ela. E qualquer um que quiser pode simplesmente roubá-la”, disse McCartney em entrevista à BBC no mês passado.

“A verdade é que o dinheiro está indo para algum lugar… Alguém está sendo pago, então por que não deveria ser o cara que se sentou e escreveu ‘Yesterday’?”

“As big techs não devem ter mais direitos sobre o trabalho dos outros do que qualquer outra pessoa”, afirmou o The Guardian em editorial publicado na última segunda-feira (24).

A campanha afirma que a indústria criativa movimenta mais de 120 bilhões de libras (R$ 879,45 bilhões) por ano no Reino Unido e que a mudança proposta pelo governo seria devastadora para o país.

“Já temos leis de direitos autorais padrão-ouro no Reino Unido. Elas sustentaram o crescimento e a criação de empregos na economia criativa em todo o Reino Unido. A única coisa que precisa ser afirmada é que essas leis também se aplicam à IA, e requisitos de transparência devem ser introduzidos para permitir que os criadores entendam quando seu conteúdo está sendo usado. Em vez disso, o governo propõe enfraquecer a lei e essencialmente tornar legal o roubo de conteúdo”, afirmou Owen Meredith, CEO da News Media Association.

O governo do primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, considera reformular a lei para permitir que empresas de IA usem o conteúdo dos criadores na internet para ajudar a desenvolver seus modelos. O premiê já disse anteriormente que o governo precisa “encontrar o equilíbrio certo” com direitos autorais e IA, enquanto observa que a tecnologia representa “uma grande oportunidade”.

Segundo o jornal The Guardian, o governo deve levar as respostas da consulta em consideração antes de elaborar o texto final do projeto de lei. O Departamento de Ciência, Inovação e Tecnologia (DSIT) é o responsável pelo projeto de lei, que deve ser aprovado pelo Congresso.