BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A divisão das comissões da Câmara e do Senado pode abrir espaço para dois filhos de Jair Bolsonaro (PL) e alçar bolsonaristas a postos estratégicos no embate com o governo Lula (PT).

O Senado já dá como certa a ida de Flávio Bolsonaro (PL) para a Comissão de Segurança Pública, uma das áreas de maior preocupação dos brasileiros. Mesmo fora do cargo, o senador já colocou como prioridade a revisão das audiências de custódia e o endurecimento da legislação.

Ex-presidente da comissão, o senador Sérgio Petecão (PSD-AP) tem dito nos bastidores que ajudou a segurar projetos controversos da oposição e que, com Flávio, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, não deve ter vida fácil.

Nos últimos meses, Flávio se aliou ao governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), para fazer frente à chamada ADPF das Favelas, ação em curso no STF (Supremo Tribunal Federal) que questiona operações policiais em comunidades do estado.

Na Câmara, a oposição fala em trabalhar para que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) ocupe posição atrelada às relações internacionais. Eduardo é o atual secretário de relações internacionais do PL e mantém relação com nomes da direita mundial, sobretudo aliados dos presidentes dos EUA, Donald Trump, e da Argentina, Javier Milei.

Integrantes do PL afirmam que a atuação do deputado à frente da Comissão de Relações Exteriores poderá causar dores de cabeça ao Executivo, com a convocação de autoridades e requerimentos de informação sobre a relação do Brasil com Cuba e Venezuela, por exemplo.

Eles enxergam que a comissão poderá concentrar nomes da oposição e atuar de forma semelhante à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) sob o comando da bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC), em 2024 —quando o colegiado conseguiu avançar com pautas ideológicas.

A possível ida de Eduardo para a presidência do colegiado acendeu o alerta entre integrantes do governo e do PT na Câmara.

Auxiliares do ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) procuraram o Planalto na semana passada para medir o impacto e pensar se há alguma maneira de impedir isso, diante da avaliação de que o deputado está se articulando com a direita trumpista no que chamam de “campanha difamatória” contra a democracia brasileira.

O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), diz que uma das prioridades da bancada será “blindar” a Comissão de Relações Exteriores. Ele afirma que, diante da realização neste ano da COP (Conferência de Mudanças Climáticas da ONU) no Brasil, seria importante um “nome mais consensual” à frente do colegiado.

“Ideal é que tivesse um nome mais consensual da Casa e a comissão não fosse utilizada para articulação da extrema direita”, diz o petista.

Foi também por causa da COP que o PT do Senado pediu a presidência da Comissão de Meio Ambiente. O partido deve indicar o senador Fabiano Contarato (ES) para o cargo.

No Senado, o PL também garantiu a presidência da Comissão de Infraestrutura, responsável pela sabatina das cobiçadas diretorias em agências reguladoras, com a indicação de Marcos Rogério (RO).

Já a ex-ministra da Mulher e da Família de Bolsonaro Damares Alves (DF) foi indicada pelo Republicanos para a Comissão de Direitos Humanos da Casa. Mesmo sendo uma voz ruidosa contra o direito ao aborto, inclusive nos casos previstos em lei, a senadora promete priorizar pautas de consenso.

Damares tem dito que pretende seguir o tom conciliador do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). A ex-ministra tem falado de forma genérica sobre a defesa dos direitos das crianças e listado aos colegas pautas relacionadas aos idosos, incluindo a revisão do Estatuto do Idoso.

Na Câmara e no Senado, via de regra as comissões são distribuídas de acordo com o tamanho das bancadas, com os maiores partidos tendo a preferência no momento de escolher os colegiados.

O ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) diz que há uma expectativa do governo de que quem assumir presidências de comissões atue como o cargo exige, sem usar o espaço para “lacração na internet”.

“Qual a expectativa que nós temos? Que quem venha a assumir presidências de comissões seja presidente de um colegiado, queira fazer esse colegiado andar, funcionar, aprovar temas e não usar ele como espaço de beligerância, de paralisação”, diz Padilha.

Segundo relatos, o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), tem afirmado em conversas reservadas que Eduardo terá um posto de destaque nas relações internacionais, independentemente de críticas da esquerda.

Outra alternativa citada é que ele comande a Secretaria de Relações Internacionais da Câmara, já que não precisaria de votos dos parlamentares para ser eleito, mas uma designação do atual presidente, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Deputados do PL também têm interesse nos colegiados de Segurança Pública e de Fiscalização Financeira e Controle, que têm o poder de convocar todos os ministros de Estado para prestar esclarecimentos e foi usado em 2023 pela oposição para desgastar o Executivo.

Para a de Segurança, é lembrado o nome de Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor-geral da Abin no governo Bolsonaro.

O PT, por sua vez, quer a comissão de Educação da Câmara, que no ano passado foi comandada pelo bolsonarista Nikolas Ferreira (PL-MG). Para a Comissão do Senado, o partido já garantiu a indicação da senadora Teresa Leitão (PE).

Na Câmara, ainda há um impasse sobre quem chefiará a CCJ, por onde tramitam todos os projetos de lei. Ainda na presidência de Arthur Lira (PP-AL) foi firmado um acordo que envolve um rodízio das maiores bancadas no posto e em cargo de relator ou presidente da CMO (Comissão Mista de Orçamento). Neste ano, União Brasil e MDB ocuparão essas cadeiras, mas ainda não há definição de qual partido ficará com qual colegiado.

No Senado, para alívio do governo, a CCJ ficará com o veterano Otto Alencar (PSD-BA), aliado de primeira hora do Palácio do Planalto. Já Renan Calheiros (MDB-AL) deve ficar com a segunda principal comissão, a de Assuntos Econômicos. A atuação dos dois é apontada por líderes inclusive como eventual contraponto a Alcolumbre.