SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O advogado Otávio Rezende, 67, passava pelo Viaduto dos Imigrantes ao voltar de São Bernardo do Campo para São Paulo, quando sentiu o que parecia ser uma síndrome do pânico, com sintomas de palpitação, tremores, falta de ar e dor no peito. Precisou parar o carro na via antes de seguir viagem. No pronto-socorro, a enfermeira logo identificou um infarto.
Em 2023, recebeu no hospital o diagnóstico de aterosclerose, uma das principais responsáveis por ataque cardíaco, que é a maior causa de mortes no Brasil, segundo o Ministério da Saúde. A doença inflamatória sem cura é causada pelo acúmulo de gordura nas artérias, por onde o sangue percorre e garante o funcionamento pleno dos órgãos.
Causada por fatores como colesterol alto, hipertensão arterial, diabetes, tabagismo, sedentarismo e obesidade, a aterosclerose também pode ser resultado de um fator genético. Depois de Otávio, seus dois irmãos de 66 e 69 anos receberam o mesmo diagnóstico, e um de seus sobrinhos de 16 anos também tem predisposição genética.
Otávio, os irmãos e o sobrinho têm lipoproteína(a), ou Lp(a), elevada. Todas as pessoas têm a substância, mas os níveis no sangue variam de acordo com o comportamento do paciente ou com a predisposição genética, independente da quantidade de atividade física e da alimentação. A condição é fator de risco para aterosclerose.
“A aterosclerose é a doença que mais mata a humanidade no Brasil e no mundo. É manifestada principalmente como infarto do miocárdio. Esse depósito de gordura também pode se manifestar com um AVC [acidente vascular cerebral] e acometer outros membros, como as pernas”, diz Eduardo Lima, cardiologista do Centro de Aterosclerose do Hospital Nove de Julho.
Em 2023, o SUS (Sistema Único de Saúde) registrou 34.644 atendimentos ambulatoriais relacionados à aterosclerose, associada a infartos e AVCs, e 31.231 atendimentos hospitalares. Em 2024, até novembro, os atendimentos ambulatoriais subiram para 40.409, enquanto os hospitalares diminuíram para 27.148, segundo dados do Ministério da Saúde.
Em relação aos óbitos, foram 6.597 mortes em 2023, nas quais infarto agudo do miocárdio ou AVC foram causas principais, e a aterosclerose apareceu como causa múltipla quando uma condição secundária contribui para o desfecho final, além da causa principal. Ainda não há informações de 2024 disponíveis.
Eduardo Lima afirma que a aterosclerose é uma doença silenciosa durante a maior parte da vida, sendo mais comum surgir complicações em homens acima de 55 anos e mulheres acima de 65. Os sinais costumam aparecer quando há obstruções importantes em artérias específicas, dependendo do órgão afetado.
“Por exemplo, o comprometimento das coronárias pode causar dor no peito ou cansaço; nas carótidas, sintomas como tontura ou ataque isquêmico transitório; e nos vasos das pernas, dor ao caminhar. Em geral, a doença é diagnosticada por exames de imagem que identificam as placas de gordura.”
É possível identificar a doença por meio de exames regulares de sangue e de imagem, principalmente em pessoas com fatores de risco, como histórico familiar, colesterol elevado ou hábitos pouco saudáveis. Após o diagnóstico, especialistas recomendam realizar o rastreio familiar para verificar se há parentes próximos com fatores de risco ou que já vivem com aterosclerose sem saber.
Lima destaca que, apesar do fator genético ser importante, a maior parte dos casos de aterosclerose são decorrentes do comportamento das pessoas, como sedentarismo e obesidade. Porém, para quem tem colesterol alto herdado dos pais e hábitos ruins, o risco de desenvolver a doença e ter complicações é ainda maior.
Otávio Rezende e os irmãos, além de terem predisposição genética, estavam com sobrepeso e não faziam atividade física de forma regular. O pai deles viveu com aterosclerose e morreu aos 89 anos após sofrer seis AVCs.
Quando internado, Otávio passou por um procedimento cirúrgico para colocar três stents tubo de metal inserido em uma artéria para desobstruir a passagem do sangue.
Hoje, para evitar novos episódios e ter uma melhor qualidade de vida, ele é tratado com medicamentos que controlam o nível de colesterol, e também mantém uma rotina de exercícios físicos e alimentação equilibrada.
“Eu faço caminhada diariamente, nem que seja por 20 minutos. O meu irmão [que é médico] me ensinou que qualquer escada que eu fosse subir, não fosse por elevador, subisse pela escada e descesse pela escada. Eu faço isso”, relata.
O engenheiro Dagoberto Rezende, 66, além de aterosclerose, também vive com diabetes tipo 2 há mais de 20 anos, por isso a alimentação já era equilibrada, mas não tinha uma rotina de atividade física. Quando o irmão sofreu um infarto e foi identificada a doença hereditária, ele se apressou para tratar a condição.
“Eu tenho duas artérias entupidas e faço acompanhamento. Aumentei a carga de exercício conforme o médico solicitou, que era importante para controlar o colesterol ruim. O último exame que eu fiz mostrou um nível bom”, diz.
A prevenção da aterosclerose envolve o controle dos fatores de risco modificáveis, segundo o cardiologista Arthur Felipe Rente, do Hospital do Coração. As recomendações para quem tem colesterol alto ou predisposição genética são semelhantes: melhorar a alimentação, evitar o consumo excessivo de carboidratos e praticar atividades físicas regularmente, com pelo menos 200 minutos de exercício moderado por semana.
“A aterosclerose não tem cura, tem tratamento com medicamentos que reduzem o nível de colesterol no sangue e reduzem o tamanho das placas de colesterol. Quando essas placas crescem demais e entopem, aí a gente tem que fazer procedimentos como a inserção de stents ou até mesmo cirurgia de revascularização miocárdica”, explica.