SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Com a amazônia no centro dos debates da COP30, a conferência sobre mudanças climáticas da ONU (Organização das Nações Unidas) que será realizada em novembro em Belém, entidades indígenas exigem a copresidência do evento.
Tradicionalmente, as cúpulas do clima têm apenas uma pessoa à frente da presidência. No último dia 21, o embaixador André Corrêa do Lago foi anunciado para o cargo, por escolha do governo Lula (PT).
A proposta inédita de uma copresidência indígena, porém, surgiu como uma das pautas do G9 –grupo de coalizão formado por povos originários dos nove países da amazônia, criado durante a COP16, a conferência da ONU sobre biodiversidade, que ocorreu em Cali, na Colômbia, em outubro do ano passado.
A ideia, defende o movimento, tem objetivo de assegurar direitos ambientais e o poder de decisão das comunidades que vivem na floresta e dependem dos recursos naturais. No Brasil, a reivindicação é feita por Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) e Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
A Coiab, que é representante do Brasil no G9, defende a demarcação de mais terras indígenas como medida para frear o avanço da extração de combustíveis fósseis e do desmatamento, o que colaboraria para preservação da biodiversidade, além da diminuição da emissão de gases de efeito estufa, causadores do aquecimento global.
“Essa ideia se fortaleceu na COP16, entre os povos indígenas dos países da bacia amazônica. Nós definimos em conjunto que a demarcação dos territórios indígenas poderia ser incluída como política de clima e de biodiversidade”, diz Toya Manchineri, coordenador-geral da Coiab.
Manchineri afirma que buscará diálogo com André Corrêa do Lago e junto ao Ministério dos Povos Indígenas para dar protagonismo às vozes das comunidades tradicionais na COP30. Por enquanto, não houve resposta do governo federal quanto à proposta.
“A gente espera que a organização da COP30 considere essa nossa solicitação [da copresidência do evento]”, acrescenta. “Tendo um evento na amazônia brasileira e com a diversidade de povos, espero que considerem nossas contribuições sobre desmatamento, mitigação do impacto sobre as mudanças climáticas no nosso território e nossos conhecimentos ancestrais.”
Em nota, a Apib celebrou a nomeação de Lago para a condução da cúpula –por seu histórico na diplomacia climática, o anúncio também foi bem recebido por ambientalistas e setor empresarial–, contudo, lamentou que o governo brasileiro não tenha atendido ao pedido de copresidência indígena.
A entidade, formada por organizações de base dos seis biomas brasileiros, manifestou também insatisfação pela saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris em meio às discussões globais para diminuir as taxas de emissão de CO2.
“Lamentamos profundamente que o governo brasileiro ainda não tenha atendido a nossa demanda por uma copresidência indígena. A Apib reafirma sua reivindicação, destacando o protagonismo dos povos indígenas na proteção dos biomas, biodiversidade e do equilíbrio climático”, diz trecho da nota.
Se acatada a proposta, a Apib e suas organizações de base realizariam uma campanha interna para definir o nome que trabalharia com Lago. Segundo a ideia das organizações, o Ministério dos Povos Indígenas teria apenas o papel de articulação junto ao governo federal, sem influência na decisão do nome a ser selecionado.
Procurado, o Ministério de Relações Exteriores defendeu, em nota, que a realização da COP30 na amazônia “reafirma o papel central dos povos indígenas e das comunidades locais na preservação ambiental e no enfrentamento dos efeitos das mudanças globais do clima”.
Questionado sobre o pedido das entidades indígenas, a pasta não se manifestou.
“A escolha da região como sede da conferência não é apenas simbólica, mas estratégica, pois proporciona um espaço onde lideranças indígenas podem dialogar diretamente com governos, organizações internacionais e a sociedade civil, contribuindo para decisões mais inclusivas e representativas”, disse também o Itamaraty.
Questionado sobre as possíveis manifestações de indígenas durante a programação do evento em Belém, o ministério afirmou que governo brasileiro deve garantir o direito à livre manifestação, com segurança, promovendo diálogo aberto e transparente com os setores da sociedade.
Em Cali, durante a COP16 da biodiversidade, a ativista indígena e colunista da Folha, Txai Suruí, foi impedida por seguranças da ONU de realizar um protesto contra o marco temporal. Ela afirmou que teve suas credenciais arrancadas e que foi lesionada no braço durante a abordagem.
Pelas regras da ONU, é necessária autorização para realizar protestos durante os seus eventos e eles não podem ter como tema questões nacionais.
O projeto Excluídos do Clima é uma parceria com a Fundação Ford.