SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Milhares de palestinos buscavam os corpos de parentes desaparecidos ou enterrados em fossas comuns na Faixa de Gaza nesta quarta-feira (22), durante a vigência de um acordo de cessar-fogo entre Israel e o grupo terrorista Hamas.

O diretor do Serviço de Emergência Civil local, Mahmoud Basal, afirmou ter recuperado cerca de 200 cadáveres desde que a trégua teve início, no domingo (19). Ele acrescentou, no entanto, que as operações têm enfrentado dificuldades em razão da falta de maquinário pesado para remexer as ruínas e se locomover em meio a elas.

Uma avaliação de danos da ONU divulgada neste mês mostrou que os ataques de Tel Aviv à faixa produziram mais de 50 milhões de toneladas de escombros. Só a remoção deles pode levar 21 anos e custar até US$ 1,2 bilhão (R$ 7,3 bilhões).

Basal estima que o número de corpos que ainda não foram localizados e enterrados no território se aproxime dos 10 mil. Autoridades de saúde locais, ligadas ao Hamas, afirmam que cerca de 47 mil palestinos morreram ao longo dos 15 meses de enfrentamentos, iniciados após terroristas do grupo matarem cerca de 1.200 pessoas e sequestrarem outras 250 em uma incursão ao sul de Israel em outubro de 2023.

No islamismo, enterros geralmente são realizados poucas horas depois que alguém morre. A dificuldade de recuperar os corpos é agonizante para muitas das famílias enlutadas.

Mahmoud Abu Dalfa era um dos palestinos que buscavam cadáveres de parentes seus nesta quarta, relatou a agência de notícias Reuters. Os corpos de sua esposa e de seus cinco filhos estão presos sob os escombros da antiga casa deles desde dezembro de 2023.

Além da mulher e das crianças —três meninas, trigêmeas, e dois meninos, segundo ele—, outros 30 membros de sua família morreram quando o edifício em que eles viviam, no subúrbio de Shejaia, na Cidade de Gaza, foi atingido em um bombardeio.

Apenas três corpos puderam ser retirados de lá, pouco depois do ataque.

“Não quero que construam uma casa para mim ou que me deem mais nada. Tudo o que quero é erguer um túmulo para eles. Tirá-los dos escombros e fazer um túmulo para eles”, disse Abu Dalfa.

Rabah Abulias, 68, era outro que queria dar um túmulo digno a um parente —no caso, a seu filho, Ashraf, também morto em um bombardeio israelense.

“Sei onde Ashraf está enterrado, mas seu corpo está com dezenas de outros. Não há lápide com o seu nome”, disse ele da Cidade de Gaza, por mensagem, à Reuters. “Quero construir um túmulo para ele, onde eu possa visitá-lo e dizer que lamento por não ter estado lá para ele.”

Se em Gaza os palestinos tentavam se reconciliar com o seu passado recente, no campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia ocupada, seus conterrâneos se preocupavam com o seu futuro depois de uma operação militar de Israel iniciada na terça-feira (21) matar dez pessoas.

Segundo Tel Aviv, trata-se de uma “operação antiterrorismo” com “duração indeterminada” —Jenin serve de base para o Jihad Islâmico, uma facção aliada do Hamas.

Mas líderes locais afirmam que as ações das forças israelenses, que costumam destruir ruas inteiras sob o pretexto de procurar explosivos ocultos, têm como real objetivo expulsar os palestinos da região e abrir caminho para estabelecer mais assentamentos judaicos ilegais lá.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, expressou preocupação com a incerteza na Cisjordânia, pertencente aos palestinos segundo a divisão dos Acordos de Oslo, em Davos, na Suíça, nesta quarta.

Na cidade para a reunião do Fórum Econômico Mundial, ele alertou para a possibilidade da anexação da Cisjordânia por Israel. Uma medida do tipo seria “contrária ao direito internacional e significaria que nunca haverá paz no Oriente Médio”, acrescentou.

No mesmo discurso, Guterres parabenizou o recém-empossado presidente americano, Donald Trump, por seu papel na negociação do cessar-fogo entre Tel Aviv e o Hamas.

“Houve uma grande contribuição da diplomacia vigorosa de quem era então o presidente eleito dos Estados Unidos”, disse ele, elogiando ainda a administração cessante de Joe Biden e o Qatar, outros dos envolvidos na mediação do acordo. “As negociações estavam em impasse. E de repente aconteceu.”