SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um vídeo da deputada Erika Hilton (PSOL-SP) publicado no último sábado (18) acumula mais de 130 milhões de visualizações nas redes sociais.
Nele, a parlamentar rebate afirmações da oposição ao governo Lula (PT) sobre a norma da Receita Federal que ampliaria a fiscalização sobre transações financeiras, inclusive o Pix, alvo de críticas e também desinformação na semana passada.
A norma atualizava o serviço de monitoramento do Fisco e passaria a monitorar transferências que somassem ao menos R$ 5.000 por mês, no caso de pessoas físicas, e R$ 15 mil, para pessoas jurídicas. Mas, dada a crise instalada por causa das ondas de desinformação, as medidas foram revogadas, e o que estava em vigor até 2024 voltou a valer.
Na prática, Erika faz uma resposta da base governista ao vídeo também viral do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), no qual ele diz “não duvidar” de uma taxa para o Pix no futuro e argumenta sobre os possíveis impactos das regras da Receita para profissionais autônomos e MEIs (microempreendedores individuais).
O vídeo de Nikolas, publicado na terça-feira (14), acumula mais de 320 milhões de visualizações e tinha imprecisões sobre o Imposto de Renda e os efeitos das medidas para os MEIs.
Sem citar nomes, a parlamentar afirma que “estão querendo que você acredite em algo que nunca existiu”. “Nunca se falou sobre taxação do Pix”, afirma.
A deputada diz que o objetivo do aumento do monitoramento da Receita era combater “criminosos e quadrilhas” que “fazem movimentações de montantes financeiros bilionários, muito acima de seus salários”
No entanto, Erika comete imprecisão factual ao comentar outros temas. Por exemplo, ao dizer que os parlamentares da oposição votaram a favor da chamada “taxa das blusinhas” -o imposto para compras internacionais de até US$ 50.
A proposta estava dentro da lei que criou o Mover, programa para incentivar a descarbonização do setor automotivo. A medida foi inserida como um “jabuti” -quando algo é colocado dentro de um projeto que não tem a ver com a sua temática original- e acaba com a isenção de imposto para tais importações.
Para dar celeridade à tramitação, é comum que parlamentares votem o texto principal e depois analisem os destaques, como trechos específicos da proposta original, emendas e jabutis.
O Mover foi aprovado com placar de 380 votos a favor e 26 contra, e a votação da taxa das blusinhas foi simbólica, isto é, não foi gerada uma lista de como cada deputado votou. Neste modelo de votação, há a possibilidade de registro eletrônico do voto, mas é facultativa e feita pelo próprio parlamentar.
Na Câmara, somente 21 deputados registraram voto contrário, sendo sete do PL. No Senado, a votação também foi simbólica, e 14 senadores se declararam contra a taxação; destes, sete também eram do PL.
A taxa das blusinhas foi defendida entre membros do governo, como Haddad e o vice-presidente Geraldo Alckmin, e, depois, foi sancionada pelo presidente Lula, apesar dele próprio ter dito que a medida é “irracional”.
“A taxa das blusinhas acabou com a isenção de compras até US$ 50, que passaram a ser tributadas com o Imposto de Importação. Esse imposto tem um caráter extra-fiscal, ou seja, ele não objetiva arrecadar, e sim regular o mercado”, diz André Felix Ricotta, professor doutor em direito tributário e presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB/Pinheiros.
“O objetivo é estimular o consumo de mercadorias semelhantes às feitas no Brasil e diminuir o interesse pela importação através de plataformas internacionais. Foi um pleito feito pelos grandes varejistas e comerciantes do país.”
A parlamentar também comete imprecisão ao comentar sobre a proposta de aumento da faixa de isenção do IR (Imposto de Renda) para quem ganha até R$ 5.000 ao mês, que enfrentaria oposições de antagonistas do governo. Hoje a isenção é para salários de até R$ 2.824.
A reforma da tabela do IR é uma promessa do presidente Lula desde a campanha eleitoral de 2022 e foi anunciada em novembro do ano passado, junto do pacote de corte de gastos do ministro Fernando Haddad (Fazenda). A compensação arrecadatória viria da chamada “taxa dos super-ricos”, na qual seria cobrada uma alíquota mínima de até 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês, o equivalente a R$ 600 mil por ano.
À época, o anúncio duplo gerou uma forte repercussão negativa no mercado financeiro e levou o dólar a cruzar a marca de R$ 6 pela primeira vez na história na base nominal. Dada a pressão no câmbio e o calendário apertado antes do recesso parlamentar, a reforma do IR ainda não foi levada a plenário.
É um dos objetivos da ala econômica em 2025, de acordo com Haddad, bem como a limitação de supersalários e o fortalecimento do arcabouço fiscal.
Ao dizer que a oposição é contrária à reforma, Erika se vale de um discurso político, não factual. Até agora, não há registro de parlamentares que se dizem contra a medida. No máximo, evitam cravar uma posição.
“[O governo] fala na taxação de quem ganha acima de R$ 50 mil. O universo dos super-ricos no Brasil não é grande o suficiente para mitigar os impactos daquilo que está concedendo para cumprir de campanha”, disse o senador Marcos Rogério (PL-RO) a jornalistas, no final de novembro.
“A oposição sempre defendeu o corte de gastos. Não é agora que vamos mudar nosso discurso. […] Mas não vamos embarcar em medidas populistas”, disse.
Quando perguntado sobre se isso também se estenderia à reforma do IR, ele disse: “Aquilo que for bom para o Brasil… a oposição sempre defendeu a agenda de corte de gastos. Mas quem tem que pagar a conta é o governo. Não vamos entrar nesse jogo de faz de conta.”
O senador Wellington Fagundes (PL-MT) também evitou se posicionar sobre a isenção para salários de até R$ 5.000 e disse que ainda estudará as propostas. “Vamos votar, mas aquilo que for bom para o Brasil”, disse.
Procurada, a deputada Erika Hilton não retornou a um pedido de comentário até o momento de publicação desta reportagem.