BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As mortes causadas por intervenções policiais aumentaram em ao menos dez estados de 2023 a 2024, mostram dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

O estado comandado por Tarcísio de Freitas (Republicanos) registrou um aumento de pelo menos 48,61% no número de ocorrências no período -é a maior entre as unidades da federação, até o momento. Esse crescimento, no entanto, pode ser ainda maior, uma vez que os dados de dezembro de 2024 ainda não foram enviados pelo estado. Foram registrados 504 casos em 2023 e 749 de janeiro a novembro do ano passado.

O ministério do governo Lula (PT) informou que o envio das informações cabe às secretarias de Segurança Pública dos estados e do Distrito Federal. A pasta atua recebendo e validando os dados de forma eletrônica em parceria com os entes federados.

Em nota, governo Tarcísio afirmou que não compactua com desvios de conduta e que adota medidas rigorosas contra quem infringe a lei ou desobedece aos protocolos das polícias paulistas. O texto ressalta que todos os casos são investigados.

“Desde o início de 2023, mais de 300 policiais foram demitidos e expulsos, e mais de 450 agentes foram presos. Para reduzir a letalidade policial, a corporação segue investindo no aprimoramento do efetivo”, declarou.

Também registraram aumento Minas Gerais, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Distrito Federal, Pará, Alagoas, Tocantins e Piauí.

Em resposta à reportagem, o Governo do Espírito destacou que as forças policiais atuam conforme treinamento e princípios de uso progressivo da força, alinhados à necessidade de cada situação. Nos casos em que se verifica a não observância da legalidade, a apuração é conduzida com acompanhamento direto do Ministério Público, afirma a gestão Renato Casagrande (PSB).

Os governos do Ceará (Elmano Freitas, PT), Maranhão (Carlos Brandão, PSB), Distrito Federal (Ibaneis Rocha, MDB), Pará (Helder Barbalho, MDB) afirmam que todas as ocorrências de mortes em decorrência de ação policial ou qualquer outro tipo de violência relacionada são rigorosamente apuradas por meio de inquérito policial e pelas corregedorias das polícias Civil e Militar.

Os governos de Minas Gerais (Romeu Zema, Novo), Alagoas (Paulo Dantas, MDB), Tocantins (Wanderlei Barbosa, Republicanos) e Piauí (Rafael Fonteles, PT) não responderam até a publicação.

No ano passado foram registradas ao menos 6.028 mortes -em 2023 esse número foi de 6.392. Em 2024, 5.853 das vítimas eram do sexo masculino e 44 do sexo feminino. O gênero não foi informado em 131 casos.

Embora a Bahia tenha reduzido em 8,52% o número de casos de violência por parte de agentes do estado, o estado governado por Jerônimo Rodrigues (PT) ainda apresenta o maior número de ocorrências. Em 2024, foram registrados 1.557 casos, comparados a 1.702 do ano anterior.

Tendência

O balanço do Ministério da Justiça revela uma redução de 6,61% nos assassinatos no Brasil, considerando homicídios dolosos, feminicídios, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Em 2024, o Brasil registrou 38.075 casos, contra 40.768 homicídios do ano anterior.

Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, avalia que, em São Paulo, o aumento dos índices de violência policial está diretamente relacionado à política adotada pelo secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, que ele classificou como ideológica.

“A redução dos indicadores de violência tem sido uma tendência desde os anos 2000. Essa política da atual gestão não trouxe uma queda maior que a observada em outros estados. Derrite está perdendo o controle sobre a polícia; a ideologia custa caro e representa a perda de anos de investimentos na profissionalização da corporação”, afirmou.

Na sua análise, com a disponibilização completa dos dados, é provável que os números de mortes por intervenção policial no país apresentem estabilidade. No entanto, ele acredita que as políticas implementadas pelo Ministério da Justiça podem ajudar a controlar essas mortes.

Atualmente, a União debate medidas para aprimorar o trabalho das forças de segurança pública, um tema que tem gerado atritos com alguns governos estaduais.

Uma das propostas publicadas pela pasta é a portaria que regulamenta o uso da força das polícias e estabelece que o uso de algemas e o disparo de arma de fogo devem ocorrer em situações excepcionais.

“A publicação dessa norma é importante porque estamos falando de uma polícia que precisa utilizar a força de maneira mais eficaz, tanto para proteger a população quanto para garantir sua própria segurança”, afirmou Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz.

Carolina Ricardo destacou que o estado de São Paulo reduziu as mortes por intervenção policial em períodos em que adotou medidas institucionais para regular o uso da força, como a adoção do uso de câmeras corporais e a oferta de cursos para o uso de armas de choque.

Desde o início do governo Lula, a segurança pública tem sido um dos principais desafios enfrentados pela gestão. Tradicionalmente associada à agenda política da direita, propostas do Executivo enfrentam resistência tanto no Congresso Nacional quanto dentro do próprio governo.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, o Ministério da Justiça apresentou pelo menos dez propostas de mudanças legislativas em resposta a crises de segurança durante o mandato de Lula. No entanto, todas permanecem estagnadas, seja no Congresso ou internamente no Executivo.

Embora essas propostas tenham sido anunciadas em eventos de grande destaque no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Lula e promovidas como soluções para crises específicas, o próprio governo tem mostrado pouca disposição para avançar com essas pautas.

Essa postura reflete, em parte, a estratégia de evitar ruídos que possam comprometer a tramitação de prioridades na agenda econômica.