SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Tricampeão mundial de surfe na modalidade longboard, o carioca Phil Rajzman, 42, passava o Natal de 2023 com familiares e amigos no Havaí quando percebeu que havia algo de errado com seu corpo.
Convivendo já havia algumas semanas com um incômodo na região da costela quando se deitava sobre a prancha para remar no mar em direção às ondas, o surfista pensou inicialmente que poderia se tratar de um quadro de gastrite.
Na ceia natalina, no entanto, ao comer um pouco além do habitual, sentiu-se mal, vomitou e percebeu que a situação poderia ser mais grave. Após consultas com médicos no Havaí e no Brasil, teve o diagnóstico de linfoma não Hodgkin, um tipo de câncer que afeta o sistema linfático.
Logo em seguida vieram as pesadas sessões de quimioterapia que o deixaram bastante debilitado. Em meados de junho de 2024, Phil se preparava para ser internado no hospital para um transplante de medula como parte do tratamento.
Após uma bateria de exames pré-operatórios, para surpresa dos médicos, os resultados apontaram que o paciente estava curado, sem mais a necessidade do transplante. “Eu penso que foi um milagre”, afirmou Phil, emocionado, à Folha. “Foi a maior vitória da minha vida.”
Ele acredita que seu histórico como atleta de elite por mais de duas décadas tenha sido importante na recuperação. Segundo o surfista, além do preparo físico, o aspecto mental e a resiliência para se manter focado em busca de um objetivo, mesmo em uma circunstância difícil como o combate a um câncer, foram decisivos.
“Você manter-se ativo, continuar se alimentando, dormindo o período que tem que dormir, acordando, levantando, saindo da cama, alimentando-se bem, mantendo a cabeça boa… Acho que o esporte, a cabeça de atleta, fez toda a diferença”, afirmou Phil. Ele usou canabidiol, que considerou importante para a manutenção do apetite e o necessário descanso à noite.
“O tratamento é doloroso, horrível. Mas eu tinha a opção de ficar pensando nesses problemas e a opção de focar o objetivo final. Você ter uma família, amigos, um esporte que ama, são coisas que motivam a estar vivo.”
Quando ainda enfrentava a doença, Rajzman precisou voltar ao Havaí, onde reside por seis meses ao ano, para resolver pendências burocráticas. Na ocasião, ao aterrissar na ilha, percebeu que as ondas estavam perfeitas para a prática do surfe e, mesmo longe de suas melhores condições, pegou a prancha e foi ao mar.
“Tive aquela sensação de novo de estar dentro do tubo, de pegar uma onda grande. Aquilo me fez reviver essa sensação de bem-estar. No meio do processo todo, eu voltei a me sentir pleno, feliz, encantado com a natureza e falei: ‘Cara, isso é Deus, estou conectado com Deus, é uma mensagem me dizendo que vou ficar bem, vou viver isso mais vezes na minha vida'”, recordou.
No fim de outubro, recuperado, ele já estava de volta às competições. Na praia de Itacoatiara, em Niterói, ficou com o vice-campeonato no torneio Tunel Crew Shootout 2024, perdendo a decisão para o amigo de longa data Raoni Monteiro.
Cerca de dois meses depois, de volta ao Havaí, subiu ao lugar mais alto do pódio na tradicional competição Hale´Iwa International Open, uma das poucas que ainda não havia conquistado.
Embora não tenha o mesmo preparo físico de jovens atletas que agora são seus adversários, Phil disse ter se apoiado na experiência adquirida ao longo de décadas em cima da prancha para adotar um posicionamento estratégico, à espera das melhores ondas.
“Acho que talvez tenha sido a primeira vez que a minha filha Coral, de cinco anos, tenha visto eu ganhar um evento entendendo o que está acontecendo, porque antes ela era muito novinha. E foi muito legal viver esse momento junto com ela”, sorriu
O surfista agora quer servir como um exemplo para outras pessoas que estão enfrentando o câncer.
“Meu sonho agora é voltar a ter patrocinadores que me permitam estar 100% voltado às competições e poder, de alguma forma, passar essa mensagem de que, muitas vezes, aparecem esses obstáculos na vida, mas que eles não servem para enfraquecer, muito pelo contrário, servem para fortalecer, para você sair daquilo mais forte.”