SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A ONG Human Rights Watch criticou as intenções do governo Lula de ampliar os investimentos e projetos relacionados aos combustíveis fósseis no Brasil, entre eles o plano de permitir a exploração de petróleo na bacia Foz do Amazonas.
Segundo a ONG, o Brasil deve liderar a COP30 (conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas) pelo exemplo, incluindo na preparação para receber o evento, em Belém, um compromisso do presidente com a extinção gradual da energia fóssil, além da implementação de medidas para a proteção das florestas.
A COP30 acontece em novembro deste ano na capital do Pará.
Em seu 35º relatório mundial, lançado nesta quinta-feira (16), a instituição elencou os principais desafios do país no campo ambiental, como o combate ao desmatamento, ao garimpo ilegal e à criação de gado em áreas de desmatamento ilegal.
“O governo Lula avançou na redução da taxa de desmatamento na amazônia, mas ao mesmo tempo planeja enormes investimentos na exploração e produção de petróleo e gás, o que deve agravar a crise climática global”, diz César Muñoz, diretor da Human Rights Watch no Brasil em um comunicado.
Na terça-feira (14), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) vai autorizar a exploração de petróleo na bacia Foz do Amazonas. O projeto é uma das prioridades da Petrobras.
Para Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, os investimentos em combustíveis fósseis são uma grande contradição do país, que tem grande potencial em fontes de energia renováveis.
“Como as coisas estão, o Brasil não vai se tornar um líder climático como pode e deve ser. Entre as grandes economias, é o único país que tem condições para ser carbono negativo até 2040. Mas está no caminho de virar um grande produtor de petróleo”, afirmou em entrevista coletiva realizada em São Paulo nesta quinta.
O documento afirma que eventos climáticos enfrentados pelo país em 2024 foram responsáveis por graves impactos ambientais e danos à saúde da população, destacando as enchentes no Rio Grande do Sul, que deixaram mais de 180 mortos, e os mais de 27 mil hectares queimados de janeiro a outubro daquele ano.
Para Muñoz, as enchentes, secas e queimadas que atingiram o país no último ano servem de lembrete do custo ambiental e de direitos humanos impostos pelos eventos climáticos extremos, que estão se tornando mais intensos e frequentes devido às mudanças climáticas.
“O governo Lula deveria fazer a sua parte para limitar o impacto devastador das mudanças climáticas sobre pessoas e comunidades, iniciando imediatamente uma eliminação gradual e justa dos combustíveis fósseis e ampliando as proteções para as florestas e os povos que dependem delas para sobreviver”, afirma a ONG no comunicado.
Segundo a Human Rights Watch, a eleição de Donald Trump para presidência dos Estados Unidos representa um chamado ainda mais forte para que o Brasil se posicione como líder no combate às mudanças climáticas e na defesa dos direitos humanos.
Maria Laura Canineu, vice-diretora de meio ambiente da ONG, ressaltou que, com a realização da COP no país, o Brasil tem a responsabilidade de promover a livre participação da sociedade civil.
Para Canineu, a logística para acomodar os participantes do evento, que enfrenta desafios como o número de quartos de hotéis insuficiente e os altos preços que já são praticados para hospedagem durante os dias de evento, são entraves à participação pública.
“É um problema para um país que prioriza a participação pública, que tem uma sociedade civil ativa. Por ser realizada na região amazônica, é fundamental a presença de povos tradicionais que podem falar com propriedade sobre o que o país e o mundo precisam fazer para proteger as florestas e fazer a transição energética”, afirmou.
“É responsabilidade do estado que recebe o evento mobilizar os recursos para permitir participação ativa da sociedade civil”, completou.
O documento traz ainda outros pontos que marcaram o ano de 2024 relacionados ao avanço dos direitos humanos e que precisam da atenção do governo, como a violência policial, a violência de gênero e a proteção de direitos dos povos indígenas, quilombolas e defensores do meio ambiente.
No relatório, a instituição traz uma análise da situação dos direitos humanos em mais de cem países. O texto lista os conflitos e crises humanitárias que marcaram o ano de 2024 ao redor do planeta, como as guerras da Ucrânia e de Gaza.
A ONG criticou a gestão do presidente dos EUA, Joe Biden, por abastecer Israel com armas, mesmo sob violações do direito internacional em Gaza, enquanto condena a Rússia por violações que considera semelhantes na Ucrânia.
A instituição pede que governos respeitem e defendam os direitos humanos com mais empenho diante do aumento do autoritarismo e de conflitos armados.
“Quando os direitos são protegidos, a humanidade floresce. Quando são negados, o custo não é medido em princípios abstratos, mas em vidas humanas. Esse é o desafio e a oportunidade de nosso tempo”, conclui Tirana Hassan, diretora-executiva da ONG, em comunicado.