SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A aeronave que explodiu nesta quinta-feira (9) em Ubatuba, litoral de São Paulo, pode ter aterrissado posteriormente ao indicado, sofrido com tamanho da pista e até com as condições meteorológicas.

Também é possível que o piloto não tenha conseguido arremeter a aeronave, como apontam os indícios prévios do acidente.

A reportagem entrevistou dois especialistas na área. James Waterhouse, professor do Departamento de Engenharia Aeronáutica da USP de São Carlos, é familiarizado com a pista e já pousou no local diversas vezes.

Ele afirma que o local é cercado por morros e um avião menor, que tem menor velocidade, consegue fazer uma aproximação “bem apertadinha para colocar o avião na pista”.

No caso de jatinhos, como o que explodiu, um Cessna Citation 525 CJ1, são bem mais rápidos e precisam de pistas mais longas. Quando há uma boas condições meteorológicas, ou seja, excelente visibilidade, sem chuva, sem nuvem, é possível que a aeronave toque bem no início da pista, como o indicado.

Porém, o professor explica que havia nuvens baixas no local, o que pode ter prejudicado a visibilidade.

“Ele tinha visibilidade, sim, mas perto do morro não tinha boa”, diz Waterhouse, que não considera a pista perigosa, mas com obstáculos.

“Não é uma pista para pousar com mau tempo ou com nuvens baixas, porque ela tem obstáculos muito perto da pista. É uma pista curta, que tem as suas limitações na aproximação. No entanto, o aeroporto é bem gerido, a pista é bem mantida”, afirma ele, que compara o cenário com uma viagem de carro.

“É a mesma coisa que dirigir em uma estrada de pista simples a 130 km/h.”

Imagens prévias apontam que a aeronave pousou à frente do indicado, diz o professor. A teoria também é compartilhada por Marcel Moure, CEO da Rede VOA, concessionária que administra o aeroporto.

Em entrevista ao portal G1, ele afirmou que “aparentemente, pelas câmeras do nosso aeroporto, o ponto de toque da aeronave foi bem à frente daquela zebra [o ponto inicial]”.

Raul Marinho, presidente do BGAST (Grupo Brasileiro de Segurança da Aviação Geral), no entanto, analisa que ainda não é possível cravar a teoria da aterrissagem errônea. Para ele, o acidente aconteceu antes da decolagem, uma vez que a pista não tinha condições favoráveis para o pouso desse tipo de aeronave.

“O desempenho do jato é incompatível com esta pista”, diz ele.

Ainda segundo ele, Ubatuba não é a única cidade que sofre com pistas curtas. De acordo com ele, em Paraty e Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, as pistas também são estreitas e já registraram problemas no pouso. “Em Angra, é muito comum problema com jatos, que é totalmente inadequado para a pista, mas o pessoal insiste”, diz.

Como mostrou uma reportagem da Folha, nesta quinta, o espaço que a aeronave teve era menor do que o necessário para o pouso. Este modelo precisa de cerca de 840 metros para realizar o pouso, enquanto a cabeceira utilizada tem 560 metros.

O aeroporto de Ubatuba tem uma única pista, mas duas cabeceiras. Em um dos lados, no sentido morro, ela tem 940 metros, segundo a concessionária que administra o local e o site da Aeronáutica. O que atende ao manual da aeronave.

Do outro lado, porém, embora a pista tenha o mesmo tamanho, existe um recuo de 380 metros por causa da topografia da região, ou seja, no sentido do mar está disponível uma pista de apenas 560 metros. Foi nessa direção que a aeronave tentou fazer o pouso.

O professor acredita que, provavelmente, as investigações vão apontar que devido às condições meteorológicas, o piloto teve que fazer uma curva um pouco mais perto da pista. Além disso, deve ter descido em alta velocidade.

Ele destaca ainda que, em uma situação como esta, o piloto deveria ter arremetido a aeronave ou tentado pousar no outro sentido. A teoria é compartilhada por Marinho, que explica que o piloto pode ter tentado a manobra, mas não obtido sucesso, uma vez que o jato normalmente tem um delay de alguns segundos quando tenta arremeter.

Outra reportagem da Folha mostrou que a aeronave não teria chegado a tocar na pista. Uma das suspeitas, segundo fontes ouvidas, é que o comandante do jatinho teria perdido o ponto de arremetida e tentado subir novamente tardiamente, pois não há marcas de frenagem na pista, apenas no gramado posterior.

O aeroporto de Ubatuba, normalmente, é usado por aeronaves particulares e aeronaves de instrução da região. Na maioria das vezes, são monomotores e bimotores que passam por ali. Já jatinhos são raridade.

Segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), a infraestrutura do aeroporto se encontra em situação regular para realizar operações aéreas, não tendo restrição específica para operação do tipo de aeronave envolvida no acidente.

Além disso, em nota, o aeroporto afirmou que não tem controle de tráfego aéreo por causa do baixo movimento, cerca de 5.000 movimentações por ano.

O caso de Ubatuba é investigado pelo Ministério Público de São Paulo. Em nota, a promotoria afirma que vai analisar as circunstâncias que levaram à queda da aeronave.

Por isso, deve ser verificada a situação da aeronave e do aeroporto. Também foram solicitadas informações à prefeitura, à Anac e ao Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos). Segundo a Promotoria, os órgãos têm 48 horas para responder os questionamentos.

O acidente matou o piloto, Paulo Seghetto, natural de Ribeirão Preto (SP). Os quatro passageiros foram socorridos com vida e levados, inicialmente, para hospitais da região. Nesta sexta-feira (10), foram transferidos para o hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.