SÃO PAULO, SP (UOLFOLHAPRESS) – A Dinamarca anunciou um novo brasão de sua Casa Real. A mudança aconteceu depois que o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, passou a fazer declarações públicas de seu interesse em comprar ou anexar militarmente a Groenlândia, território que pertence ao país europeu.
A modificação foi anunciada no dia 1º de janeiro. O monarca -atualmente, o rei Frederik 10º, que assumiu a coroa após a abdicação de sua mãe há um ano- fez seu discurso para abrir um novo ano.
Imagem é uma reafirmação simbólica do domínio dinamarquês sobre a Groenlândia. No brasão anterior, dois escudos eram ocupados pelos três leões coroados; um deles contava com os dois leões do condado da Jutlândia do Sul, uma região histórica para o país; e o urso da Groenlândia e o carneiro que simboliza as Ilhas Faroé, outro território dinamarquês, dividiam espaço com as três coroas da União de Kalmar -o antigo reino unificado de Dinamarca, Suécia e Noruega- em outro escudo bastante apertado.
O novo brasão coloca a Groenlândia e as Ilhas Faroé em destaque. Os leões da Dinamarca e da Jutlândia continuam marcando presença em um escudo cada. Mas as coroas de Kalmar desaparecem, enquanto a Groenlândia ganhou seu próprio escudo com o urso e as Ilhas Faroé ocupam outro inteiramente com seu carneiro.
“É um sinal importante do lado dinamarquês que a Groenlândia e as Ilhas Faroé são parte do reino da Dinamarca e que isso não é discutível. É assim que você marca [este domínio]”, disse Lars Hovbakke Sorensen, especialista na Família Real da Dinamarca, em entrevista ao canal TV2.
Rei Frederik 10º assinou resolução real determinando a troca de brasão em 20 de dezembro, segundo anúncio. As mudanças foram feitas poucas semanas após os primeiros avanços de Trump sobre a Groenlândia em novos discursos. No entanto, o presidente eleito já havia manifestado interesse em comprar a ilha em 2019, ainda durante seu primeiro mandato.
Em texto publicado no site da coroa dinamarquesa, o monarca reforçou a importância da Groenlândia para o reino. “As ilhas Faroé e a Groenlândia têm cada uma o seu próprio campo [no novo brasão], o que reforça a proeminência da Commonwealth no brasão real”, diz a justificativa, em tradução livre. A Commonwealth do Reino Unido da Dinamarca (Rigsfællesskabet) é uma comunidade de estados unidos sob a mesma coroa em monarquia constitucional, semelhante à da Grã-Bretanha.
Além disso, o símbolo destaca a longa relação histórica da Groenlândia e da Dinamarca. A Casa Real reforça que o urso polar se tornou o brasão da Groenlândia durante o reinado de Frederik 3º, em 1666, antes mesmo de ser reocupada e se tornar uma colônia oficialmente em 1721.
O novo brasão será usado em documentos oficiais, selos e outros elementos cerimoniais, como já acontece desde o século 12. Em seu primeiro discurso, logo após o lançamento do novo símbolo, Frederik afirmou: “Todos nós estamos unidos e cada um comprometidos com o Reino da Dinamarca. Da minoria dinamarquesa do sul de Schleswig -que está até situada fora do reino- até a Dinamarca. Pertencemos uns aos outros”, ressaltou em fala reportada pelo jornal britânico The Guardian.
Groenlândia na mira de Trump
Trump já havia manifestado interesse na Groenlândia em seu primeiro mandato. Em dezembro de 2024, já eleito, ele voltou a chamar a anexação de “necessidade absoluta”.
Ele fala em compra do território, embora não descarte ações militares. “Não posso garantir [que não haverá coerção militar ou econômica], mas posso dizer isso: precisamos deles para segurança econômica [dos EUA]”, afirmou Trump em entrevista coletiva na terça-feira (7).
Donald Trump Jr., filho do mandatário, desembarcou na Groenlândia nesta terça. Na segunda, em uma publicação em sua rede Truth Social, Trump afirmou que o filho iria ao território “com vários representantes” para “visitar algumas das áreas mais magníficas e com as melhores vistas”.
“Tenho ouvido que o povo da Groenlândia é ‘MAGA’ [Make America Great Again, slogan de Trump]. A Groenlândia é um lugar incrível e as pessoas se beneficiarão tremendamente se, e quando, se tornar parte da nossa nação. Nos vamos protegê-la e cuidar dela, de um mundo muito perverso lá fora. Torne a Groenlândia Grande Novamente”, disse Trump na rede Truth Social.
Trump Jr. realiza uma espécie de campanha de opinião nas redes durante a visita. Ele postou imagens de um cidadão local usando um boné MAGA e pedindo ao seu pai que compre a Groenlândia para libertá-la do “domínio colonial dinamarquês”.
O que diz o governo dinamarquês?
Groenlândia não está à venda, diz a Dinamarca. Apesar de o território ser autônomo, a primeira-ministra dinamarquesa Mette Frederiksen chamou a ideia de Trump de anexar a Groenlândia de “absurda”. No entanto, seu governo tem preferido observar o xadrez geopolítico no momento, em vez de tomar posições mais firmes em relação aos EUA.
Já o primeiro-ministro da Groenlândia, Múte Egede, reforçou o desejo de independência da região. Antes da coletiva de Trump na terça, Egede postou no Facebook a seguinte mensagem: “Deixe-me repetir: a Groenlândia pertence ao povo da Groenlândia. Nosso futuro e nossa luta pela independência [da Dinamarca] é problema nosso”. Em dezembro de 2024, ele já havia garantido que a Groenlândia nunca estará à venda.
“[Dinamarca e EUA] têm direito às opiniões deles, mas não devemos deixar pressões externas nos distrair de nosso caminho [de independência]”, disse Múte Egede, primeiro-ministro da Groenlândia.
A parlamentar Aaja Chemnitz garantiu que, apesar de a população da Groenlândia poder ter algum interesse em Trump, isso não quer dizer que eles queiram ser cidadãos americanos. “A Groenlândia não é MAGA. A Groenlândia não será MAGA. Acho que a maioria na Groenlândia acha assustador, na verdade, e muito desconfortável que haja tanto foco [no território] e que os EUA de uma maneira verdadeiramente desrespeitosa estejam demonstrando que querem comprar ou controlar a Groenlândia, porque não é o que a população quer”, garantiu à rede CNN.
A Groenlândia é habitada pelo povo indígena inuit, popularmente conhecidos como esquimós, e possui cerca de 56 mil habitantes. Ela foi colonizada no século 18 pela Noruega e a Dinamarca. Após a Segunda Guerra, a Groenlândia deixou oficialmente de ser uma colônia, conquistando a autonomia em 1979, mas mulheres da ilha foram submetidas a controle obrigatório de natalidade e tiveram filhos raptados e levados para a Dinamarca. Os horrores daquele período são a base do desejo de independência da ilha.