SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – É contrastante a calma na voz do empresário Rubens Menin, como é típico de um mineiro, com suas previsões duras para a economia do país.
“Estamos perdendo a guerra da comunicação e, na hora que isso acontece, o mercado fica estressado e um gatilho é disparado: os juros futuros sobem e o Banco Central fica em alerta. Estamos entrando em um ciclo perverso”, diz.
De seu escritório em Minas Gerais para uma conversa a distância no fim do ano passado, o fundador, sócio e presidente do conselho de administração da incorporadora MRV, Menin, criticou a alta da taxa básica de juros, a Selic. “Estamos pagando juros altíssimos, o segundo mais alto do mundo. Isso não tem sentido”, disse.
O empresário defendeu que todos os atores econômicos se unam em torno de uma agenda econômica comum e cobrou sacrifícios para impedir que os preços ao consumidor saiam do controle, e os juros subam mais ainda.
“O Banco Central tem uma missão única, que é entregar a inflação na meta de 3%. Mas a política monetária sozinha não consegue resolver o problema do Brasil”, afirmou.
À reportagem o empresário elencou os prejuízos dos juros altos para o mercado imobiliário, setor em que atua no Brasil com a MRV e a Log Commercial Properties. Segundo ele, o país tem bons mecanismos de concessão de crédito imobiliário para todas as faixas de renda, mas afirmou que os juros altos estão minando esses mecanismos.
“Aos poucos, vai sangrando, sangrando, até um momento que não tem volta”, diz.
*
PERGUNTA – O BC aumentou a taxa de juros em 1 ponto percentual, e agora o mercado já espera uma Selic de 14,75% no fim de 2025. O sr. acha que o BC pesou a mão na decisão?
RUBENS MENIN – Eu tenho que deixar bem claro que sou a favor e respeito o BC independente. Isso é indiscutível. Mas posso discordar de forma construtiva. O Banco Central tem uma missão única, que é entregar a inflação na meta de 3%. E, em função dessa meta, ele faz uso da política monetária. Mas eu acho que a política monetária sozinha não consegue resolver o problema do Brasil. Estamos pagando juros altíssimos, o segundo mais alto do mundo, e isso não tem sentido. Eu vejo que a nossa economia está melhor do que aparenta estar. Temos uma balança comercial razoável, temos reservas, o PIB [Produto Interno Bruto] está indo bem, a taxa de emprego está indo bem
P – Mas a inflação está piorando.
RM – E esse é um ponto nevrálgico. Não tinha como isso não acontecer. Quando o PIB cresce e quando sobe o dólar, automaticamente isso é repassado para os preços. Estamos fazendo uma corrida de cachorro atrás do rabo. Não podemos deixar a inflação escapar desse nível que está, que é perigoso e difícil de botar dentro da caixa de novo. O risco é muito alto. Então, acho que nós estamos, sim, vivendo um momento extremamente delicado. Os agentes de mercado estão mostrando isso. Existe um ceticismo em relação à nossa economia.
P – O que está causando esse ceticismo?
RM – Acho que nós tivemos um problema de comunicação muito inadequado. O presidente [Luiz Inácio Lula da Silva] falou que ele é uma pessoa que quer manter o controle orçamentário, que tem tradição em fazer isso, mas as mensagens às vezes saem truncadas. Estamos perdendo a guerra da comunicação e, na hora que isso acontece, o mercado fica estressado e um gatilho é disparado: os juros futuros sobem e o Banco Central fica em alerta. Estamos entrando em um ciclo perverso. Este é um momento extremamente delicado em que os atores têm que arrumar uma agenda comum.
P – De que forma a MRV está sendo afetada pelos juros altos?
RM – A vantagem do setor imobiliário é que, dos dois recursos principais que fomentam o nosso negócio, um deles é o Minha Casa, Minha Vida, que possui teto de juros e não é contaminado pela alta da Selic. O outro é o SBPE [Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo], que também tem um teto de juros e ajuda a segurar um pouco. Mas tem o problema de escassez de recursos, porque na hora que os juros crescem, automaticamente há menos recurso na poupança. E também a própria taxa de juros do SBPE, que já foi de 7% algum tempo atrás, passou para 10%. Outro ponto positivo é que o Brasil tem um mecanismo super bacana, que é o SFI [que flexibiliza as condições de crédito para compra de imóveis], mas, de novo, os juros elevados estão contaminando muito esse mercado. Então, veja, nós temos mecanismos bons, nas três faixas de renda, mas os juros altos estão minando esses mecanismos. Aos poucos, vai sangrando, sangrando, até um momento que não tem volta.
P – Inclusive para vocês se financiarem como empresa.
RM – Também. Qualquer empresa que fez um financiamento em uma taxa de juros muito barata e começou a fazer algum investimento grande foi pega de surpresa com essa variação rápida da subida dos juros. Agora, todas as empresas que estão em situação de endividamento tomam medidas para diminuir investimentos e segurar os gastos para poder conseguir pagar os juros da dívida. Esses juros mais elevados estão minando a capacidade das empresas de crescimento, de investimento, de subsistência.
P – E em relação ao Banco Inter? Estão preocupados com o aumento da inadimplência?
RM – Quando se aumenta os juros, cresce a inadimplência. E o que os bancos passam a fazer, infelizmente, é ser mais restritivos [na concessão de crédito aos clientes]. E isso é muito ruim, porque justamente as pessoas que precisam mais pagam juros mais altos e, normalmente, fora do sistema financeiro tradicional. Isso é muito ruim. Os juros altos são uma armadilha para as pessoas, comprometem uma parte da renda e são nocivos tanto para os bancos como para toda a indústria. Os bancos tentam se defender sendo mais restritivos e muitas empresas não conseguem captar dinheiro, então elas estão mais fracas e mais vulneráveis. É preocupante.
P – Falando agora de outro negócio do sr., o Atlético Mineiro. As bets são importantes fontes de receita do futebol hoje em dia e agora estão passando por uma regulamentação. Como o sr. enxerga isso?
RM – Eu me preocupo muito com essas notícias de pessoas de enorme poder aquisitivo que estão se endividando com as bets ou outras que pegam benefícios sociais para gastar com apostas. Não precisamos disso para manter o funcionamento das bets. Alguma regulamentação deve ser feita, porque infelizmente tem uma parcela grande da população que está sendo muito prejudicada e sofrendo com o vício do jogo. Mas eu não sou favorável de acabar com as bets. É direito da sociedade querer jogar, mas tem que ser só as bets saudáveis. É possível fazer isso. Elas são fundamentais para o futebol.
P – O sr. introduziu no Brasil um modelo que já existe lá fora, de um empresário deter um veículo de comunicação de alcance nacional, como é a CNN. Esse é um modelo que tende a se pulverizar no Brasil?
RM – Para se ter notícias, tem que ter investimento. A notícia não sai do nada. E nós estamos vivendo um mundo extremamente importante, em que a notícia está mudando rapidamente. A boa notícia é muito importante para a sociedade. A imprensa é fundamental para a democracia. Nesses cinco anos, a CNN tem contribuído muito com a democracia. Tem feito um jornalismo de altíssima qualidade, sério, em cima dos fatos. E hoje a CNN conseguiu chegar na maturidade e está sendo reconhecida pela população. No começo foi muito difícil, porque eu não sou do ramo. Mas hoje estou tranquilo, porque a gestão da emissora é muito boa, profissional, com méritos e resultados, mas preservando seu business, a informação.
*
RAIO-X
Rubens Menin, 68
Graduado em Engenharia Civil pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), fundou o Grupo MRV em 1979, e hoje ocupa o cargo de presidente do conselho de administração da empresa. Também é fundador e presidente do conselho da Log Commercial Properties, empresa de propriedades comerciais e industriais; da AHS, empresa do ramo imobiliário localizada em Miami (EUA); e da CNN Brasil. É proprietário da Rádio Itatiaia e tem participação na SAF do Atlético-MG.