SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A participação de gestoras de investimentos em leilões de rodovias ganhou força em 2024 e deve continuar na mesma tendência neste ano, segundo especialistas. O movimento acontece em meio ao esforço do governo federal para acelerar as concessões de estradas, incluindo trechos menos atrativos por causa do alto nível de complexidade das obras requeridas no contrato.

No ano passado, as administradoras ganharam protagonismo em certames -e em alguns deles foram as únicas a oferecer propostas.

Foi o caso do leilão da BR-381, também conhecida como Rodovia da Morte, que foi arrematada pela gestora curitibana 4UM, estreante do segmento, em agosto. Na ocasião, a administradora ofereceu um desconto de 0,94% sobre a tarifa básica de pedágio e cobriu a proposta da outra concorrente, a gestora Opportunity.

A estrada não havia recebido propostas em um leilão que estava marcado para novembro de 2023 e, por isso, o certame foi adiado. Outras tentativas foram feitas em 2021 e 2022 e também fracassaram.

Em maio do ano passado, a ANTT aprovou uma nova proposta, na qual o governo assumiu obras, consideradas caras e complexas, de duplicação de um trecho da concessão que vai de Belo Horizonte a Caeté (MG). Os trabalhos envolvem, sobretudo, desapropriações e reassentamentos de famílias às margens da rodovia.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, o presidente da 4UM, Leonardo Boguszewski, diz que a gestora estudou a concessão da BR-381 durante dois anos. Segundo ele, o baixo desconto sobre a tarifa de pedágio oferecido no leilão permitirá executar o projeto com condições adequadas de retorno.

Ele afirma que, somado à disposição do atual governo de levar à frente concessões de rodovias, o setor vive também uma janela de oportunidades com o fim de contratos de alguns ativos, levando a novas licitações.

“Existem muitas coisas acontecendo em infraestrutura no Brasil hoje que não estarão disponíveis mais em dois ou três anos. Uma vez concluídos, esses leilões vão dar muito trabalho para quem ganhar, mas quem tiver interesse de entrar a partir dali vai ter que esperar bastante tempo.”

De acordo com Boguszewski, as gestoras de investimentos têm uma estrutura de captação mais interessante, com capital levantado para cada projeto.

“A 4UM fez um fundo para a BR-381. Esse mesmo fundo tem apetite para fazer mais coisas. Mas, se amanhã esse grupo de cotistas decidir não pôr mais dinheiro, a gente pode montar um segundo fundo e falar com outro grupo de cotistas. As gestoras têm essa capacidade de atrair dinheiro de bolsos muito diferentes entre si ao longo do tempo. Já as concessionárias, não”, diz.

A administradora concluiu em agosto, logo antes do certame da BR-381, a estruturação de um fundo de investimento para atuar em leilões de rodovias, o “4UM FIP-IE I”. Entre os cotistas, estão as famílias Malucelli, Salazar, Federmann e Backheuser, acionistas das empresas MLC, Aterpa, Senpar e Carioca Engenharia.

Na visão do ministro dos Transportes, Renan Filho, o setor está vivendo um excelente momento, com ampliação da competição e presença de fundos de investimento, construtoras e concessionárias tradicionais nos leilões.

“No passado, o modelo das construtoras, apenas, não deu certo porque a construtora é especializada somente na obra. Depois ela não tinha interesse em continuar num contrato de longo prazo”, disse à Folha de S.Paulo após os certames do dia 12 de dezembro.

Na ocasião, o governo federal leiloou duas concessões. No certame que pôs à venda a Rota Verde, que reúne trechos das BR-060 e 452, em Goiás, venceu o fundo de investimentos Aviva. No viva-voz, etapa em que os proponentes vão aumentando suas ofertas até chegarem ao valor final, também competiram um fundo do BTG e o Consórcio Rota Cerrado, da XP.

O outro certame leiloou um lote que reúne quase 570 km de estradas federais e estaduais no Paraná. A CCR, uma das mais tradicionais do setor, cobriu as propostas de gestoras como Pátria Investimentos e Perfin, que chegaram a competir pela concessão no viva-voz.

Para Ana Luiza Diniz, advogada especialista no tema, a participação das gestoras vem se intensificando nos últimos meses e é um movimento que veio para ficar, diz. Segundo ela, os contratos estão mais maduros e a resolução de conflitos também.

“As gestoras estão enxergando o ramo com estabilidade, com previsibilidade. Hoje a ANTT se mostra muito mais madura. Os contratos estão mais maduros, com alocação e compartilhamento de risco. Isso deu segurança para os fundos de investimento começarem a aparecer”, afirma.

O governo Lula vem adotando uma nova modelagem para os certames. Os interessados dão lances de desconto em relação à tarifa básica de pedágio, e o pagamento de aporte (caução) é necessário somente quando o corte na tarifa prometido é superior a 18%.

Depois desse patamar há a incidência de investimento de recursos para cada 1% de deságio apresentado, de forma cumulativa. Os recursos do aporte são direcionados à conta da concessão para que sejam utilizados, por exemplo, na execução de obras não previstas.