MONTEVIDÉU, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Mercosul e União Europeia (UE) anunciaram nesta sexta-feira (6) a conclusão das negociações e a consolidação do texto final do acordo de livre-comércio gestado há mais de 25 anos entre os blocos.
O anúncio foi feito durante o encontro do grupo sul-americano em Montevidéu com as presenças dos presidentes Lula (Brasil), Javier Milei (Argentina), Luis Lacalle Pou (Uruguai) e Santiago Peña (Paraguai) e a chefe da Comissão Europeia, a alemã Ursula von der Leyen.
A mensagem principal ficou por conta da líder europeia. Em um aceno contra o protecionismo, Von der Leyen disse em seu discurso que “os dois blocos concordam que cooperação é o caminho para prosperar”. “Esse acordo é a nossa resposta ao crescente isolamento e à fragmentação.”
“Este um ambiente de ganha-ganha”, seguiu a alemã. “Estamos enviando uma clara mensagem: num mundo em confrontação, nós mostramos que democracias podem vigorar. Isso é uma necessidade política, não apenas econômica.”
Em mensagem a seus pares europeus, disse que campo e cidade serão beneficiados. “Às nossas populações e economias dos dois lados do Atlântico, esse acordo significa mais trabalhos e oportunidades.”
A alemã também elogiou a agenda ambiental do governo Lula. Mas disse que “a atitude do presidente Lula de preservar a Amazônia deveria ser também uma tarefa de toda a humanidade”.
Pelo Mercosul, o uruguaio Lacalle Pou disse que um histórico de acordos frustrados vinha causando descrédito e incerteza.
“No Mercosul não temos todos a mesma ideologia”, seguiu o centro-direitista. “E todos sabemos o fácil que é destruir, mas o difícil que é construir. Nossa responsabilidade foi tirar o que nos desune e ficar no virtuoso: união e acordo.”
Negociadores brasileiros indicam que os europeus vão adotar a estratégia de separar o conteúdo comercial do político no acordo, o que permite avançar mais rapidamente com a parte econômica, sem necessidade de aprovar em todos os parlamentos nacionais e regionais.
À sombra do que ocorreu em 2019, quando estágio muito semelhante foi alcançado, mas logo freado pelas alegadas preocupações europeias com a agenda negacionista do então governo de Jair Bolsonaro (PL), o novo anúncio é visto como uma vitória, mas a cautela é maior.
Alterações importantes foram costuradas no processo de tratativas coordenado pelo Brasil. Uma delas, no campo da governança pública, o fato de que estados brasileiros terão de abrir a competitividade das compras públicas às empresas europeias. Esse mecanismo é visto como importante para aumentar competitividade e ajudar estados em dificuldade orçamentária.
Os negociadores sabem, porém, que ainda há fatores complicadores para o tratado. O documento agora deve passar por uma burocrática revisão técnica e depois ser aprovado em diferentes instâncias, a começar o Parlamento Europeu.
É no órgão que países como França, com forte lobby agrícola, Polônia e Itália poderiam se opor e tentar bloquear o seguimento do processo.
Do lado das Américas, a vitória política é celebrada em especialmente pelo governo Lula 3, que priorizou a agenda climática e a retomada das tratativas, e pelo governo de Luis Lacalle Pou no Uruguai esta é a ultima cúpula do de Lacalle, e ele a celebra com o anúncio histórico.
O anúncio vem em um momento de virada no xadrez geopolítico global com o futuro retorno de Donald Trump à Casa Branca com uma agenda protecionista que preocupa o setor econômico europeu. No Mercosul, ocorre em um momento de ampla polarização entre seus Estados-membros, tendo como ponto de foto a Argentina do ultraliberal Javier Milei, para quem “o acordo não é determinante.” Apesar disso, o chefe do Executivo argentino disse que o acordo terá apoio do país.
O tratado deve abarcar um mercado comum de 718 milhões de pessoas em economias que, somadas, chegam a US$ 22 trilhões. Os novos detalhes do que foi consensuado ao longo de extensas negociações ainda serão tornados públicos.
Em resumo, para o Mercosul, serão zeradas ou reduzidas tarifas de exportação para a UE de cerca de 70% a 90% dos produtos. Para o bloco europeu, o principal foco será sobre produtos agrícolas.
Para o Brasil, mostrou um estudo publicado pelo Ipea, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, este acordo com a UE traria um crescimento de 0,46% do PIB (produto interno bruto), equivalente a US$ 9,3 bilhões a preços constantes de 2023.
Do outro lado do Atlântico é a França o principal ponto opositor. A administração de Emmanuel Macron, em forte crise institucional após a queda do premiê Michel Barnier, disse nesta quinta-feira (6) que o projeto era “inaceitável como está”.
O breve comunicado foi feito pouco após Von der Leyen confirmar sua aterrissagem em Montevidéu, sinalizando o êxito das negociações.
Nesta sexta, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) disse que a conclusão do acordo traz como potenciais benefícios a diversificação das exportações, a ampliação da base de parceiros comerciais e o fortalecimento da competitividade do Brasil em nível global.
“Negociado com foco em princípios de equilíbrio e sustentabilidade, o acordo tem potencial de impulsionar a produtividade e ampliar a integração internacional da indústria brasileira, promovendo ganhos econômicos e sociais de longo prazo”, afirmou a entidade em nota.